Uber pode ser obrigada a reconhecer direitos trabalhistas dos motoristas

Em Goiás, Associação dos Motoristas de Aplicativos (Amago) comemora a decisão e prevê julgamentos análogos no estado

Postado em: 23-10-2021 às 11h21
Por: Ícaro Gonçalves
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Em Goiás, Associação dos Motoristas de Aplicativos (Amago) comemora a decisão e prevê julgamentos análogos no estado | Foto: Reprodução

Uma decisão da Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro pode ser a primeira etapa do reconhecimento de direitos trabalhistas para motoristas de aplicativos no Brasil. Isso porque, em decisão divulgada no início deste mês de outubro, a 7° turma do TRT da 1° Região reconheceu a existência de vínculo empregatício entre uma motorista de aplicativo e a empresa Uber, em julgamento de recurso ordinário apresentado à Corte.

Por considerar a existência de requisitos para a configuração do vínculo empregatício, entre eles a subordinação do empregado para com a empresa, a desembargadora Carina Rodrigues Bicalho condenou a Uber a conceder à motorista os direitos trabalhistas previstos na CLT, como assinar sua carteira de trabalho (CTPS), recolher encargos como INSS, FGTS e férias remuneradas, pagar horas-extras, além de multar a empresa em R$ 5 mil por danos morais.

Entenda

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O caso começou quando a motorista Viviane Pacheco começou a trabalhar com transporte de passageiros por meio do aplicativo Uber, em dezembro de 2018. Segundo a motorista, ela trabalhava todos os dias da semana, em jornadas que iam das 8h às 22h, sem descanso. Ela conseguia receber em média R$ 1.200 semanais, trabalhando exclusivamente com o aplicativo. Entretanto, ela afirma ter sido bloqueada pela Uber no final de maio de 2019, sem nenhum motivo ou aviso prévio.

Após o bloqueio, Viviane entrou com uma ação trabalhista contra a empresa, na qual alegava ter prestado serviços de motorista para a Uber com todos os requisitos dos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre os quais: relação de subordinação, pessoalidade, onerosidade e não eventualidade do trabalho. Ela requereu, portanto, reconhecimento do vínculo trabalhista.

Por sua vez, a Uber alegou ser uma empresa que “explora plataforma tecnológica que permite a usuários de aplicativos solicitar, junto a motoristas independentes, transporte individual privado”, não havendo hierarquia entre a empresa e a motorista. Ainda afirmou que tanto usuários como motoristas aceitam as condições previstas nos Termos de Uso ao se cadastrarem no aplicativo.

Os pedidos de Viviane haviam sido negados pelo juízo de primeiro grau. Mas, no segundo grau, a desembargadora Carina Rodrigues Bicalho votou por seu deferimento e foi acompanhada com unanimidade pelos demais desembargadores que compõem a 7ª Turma do Tribunal, dando ganho de causa à motorista.

Assim, o TRT condenou a Uber a pagar à Viviane: aviso prévio (30 dias), 13º salário proporcional ao período de trabalho, férias proporcionais mais 1/3 constitucional, FGTS com multa, indenização substitutiva de seguro desemprego e multa, adicional de 50% relativo às hora-extras em dias de semana, e de 100% para o trabalho aos domingos e feriados, além de indenização por dano moral no valor de R$ 5 mil.

Em Goiás

A decisão foi recebida com comemoração por motoristas de aplicativos do estado de Goiás, que enfrentam sucessivos conflitos relativos a bloqueios por parte da empresa. Para Rodrigo Vaz, vice-presidente da Associação de Motoristas de Aplicativos de Goiás (Amago), os condutores enfrentam condições abusivas de trabalho, sem o reconhecimento de direitos e garantias fundamentais.

“Muitos (motoristas) são bloqueados do aplicativo de uma forma muito injusta, deixando de ganhar seu pão de cada dia. Além disso, as plataformas descontam um valor muito alto, e os motoristas se submetem as essas condições por não haver outras opções”, afirma o vice-presidente da Amago.

Ainda de acordo com Rodrigo, que também é estudante de Direito, a decisão da Justiça Trabalhista foi correta, por reconhecer a subordinação e a dependência financeira dos motoristas para com a empresa. “Essa é uma nova jurisprudência que pode alcançar outros estados brasileiros. Em breve poderemos ver decisões parecidas também em Goiás. Nós lutamos nos meios judiciais para isso, para fazer com que os motoristas sejam mais respeitados”.

Com a palavra, a Uber

A assessoria da Uber foi procurada pela reportagem de O Hoje. Em nota a empresa afirmou estar recorrendo da decisão proferida pela desembargadora, a qual considera ser “um entendimento isolado e contrário ao de outros casos já julgados pelo próprio Tribunal Regional e pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST)”. “Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, e não existe chefe para supervisionar o serviço”, finalizou a nota.

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