Com incerteza e riscos mais elevados, margens continuam folgadas no campo

A redução em dólares ajuda a amenizar, mas não compensa, o impacto gerado pela desvalorização do real - Foto: Divulgação

Postado em: 12-06-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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A redução em dólares ajuda a amenizar, mas não compensa, o impacto gerado pela desvalorização do real - Foto: Divulgação

Lauro Veiga

Num cenário de alto risco e muita incerteza, exacerbada pelo que já se tem como uma das piores crises na história, as principais commodities agrícolas, em especial aquelas mais diretamente relacionadas à cadeia da alimentação e às exportações, ainda deverão deixar ganhos para os produtores na safra que começa a ser plantada entre setembro e outubro. Na avaliação de Guilherme Pessini, superintendente de agronegócio do Itaú BBA, o panorama geral associado à pandemia vai exigir maior “parcimônia e prudência”, seja na tomada de decisões, seja principalmente na gestão de risco, já que todos os setores da economia estarão submetidos a níveis de estresse nada negligenciáveis.

De acordo com ele, o aumento das incertezas tem se refletido num comportamento mais volátil do que o tradicional no mercado de dólar, fazendo crescer os riscos de “descasamento cambial”, assim como na possibilidade de aumento das necessidades de capital de giro, relacionadas a “prazos mais longos para receber e mais curtos para efetuar pagamentos”. Pessini indica ainda necessidade de atenção maior em relação aos chamados “riscos de contraparte”, considerando que fornecedores de insumos e compradores de grãos estarão sujeitos a pressões ocasionadas por queda de receitas e dificuldades eventuais para honrar compromissos.

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Sob o ponto de vista nominal, quer dizer, sem atualização com base na inflação, as margens de lucratividade na safra 2020/21 tendem a oscilar ao redor das médias históricas para soja e milho, embora um pouco mais baixas para o algodão, assegurando, de qualquer forma, mais um ciclo de bons resultados, afirma Guilherme Bellotti de Melo, consultor para a área de agronegócio do banco. No lado dos custos, acrescenta ele, os valores em dólares dos fertilizantes têm se mantido em queda, refletindo possivelmente as cotações muito mais baixas para o petróleo no mercado internacional. Até recentemente, observa Bellotti, os preços internacionais do cloreto de potássio haviam sofrido “baixa histórica”, com recuos igualmente para fertilizantes fosfatados e diesel.

Queda (em dólares)

A redução em dólares ajuda a amenizar, mas não compensa, o impacto gerado pela desvalorização do real quando convertidos aqueles custos para a moeda brasileira. Por isso mesmo, o custo de produção, considerando apenas as operações agrícolas, tenderá a subir entre 9% e 10% para soja, milho e algodão entre as safras 2019/20 e 2020/21. Os produtores de soja e algodão serão favorecidos por alguma elevação nos preços, mas as produtividades tendem a ser menores. Como ponto favorável, em torno de 30% da safra de soja a ser colhida em 2021 já haviam sido negociados antecipadamente até o final de maio, o que se compara com algo em torno de 10% a 12% no mesmo período do ano passado, conforme Bellotti. A prefixação de preços ocorreu em um momento mais favorável, quando a saca da soja chegou a namorar com R$ 100. Na média, as projeções do Itaú BBA sugerem um preço médio em torno de R$ 88 por saca no ciclo 2020/21, o que significaria uma variação nominal de 3,5% frente aos R$ 85 esperados para a safra atual. 

Balanço

– Os números recordes alcançados na safra 2019/20, com a produção superando 120,4 milhões de toneladas na previsão da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) ou aproximando-se de 123,0 milhões de toneladas na projeção do Itaú BBA, combinados com aumento médio de 21,4% nos preços frente ao ciclo 2018/19, deverão corresponder a margens igualmente históricas para a soja.

– Na estimativa do banco, a margem da lavoura deverá saltar 54,8% na safra em curso, saindo de R$ 1.730 para R$ 2.678 por hectare colhido. No próximo ciclo, a ser iniciado em julho, a estimativa sugere margens mais próximas de R$ 2.363, em queda de 11,8%. Mas, considerando a receita bruta (estimada pela coluna com base nos números do Itaú BBA), a margem deverá se manter ao redor de 48,8%, pouco acima dos 44,0% observados em 2018/19 (embora menores do que o resultado de 54,3% registrado em 2019/20).

2 O banco trabalha com a perspectiva de manutenção da produtividade média nas lavouras de milho ao redor de 104 sacas por hectare (6.240 quilos), mesma alcançada em 2019/20 (que havia sido 8,8% mais baixa, nas séries de dados da instituição). O Itaú BBA antecipa a perspectiva de preços próximos a R$ 28 por saca, o que corresponderia a uma redução de 9,7% frente à média de R$ 31 esperada para o ciclo 2019/20.

– Nessa combinação, as margens seriam reduzidas de R$ 1.438 por hectare para R$ 951, num tombo de 33,9%, lembrando que na safra que vai caminhando para o final havia sido registrada elevação de 7,2% (saindo de R$ 1.341 em 2018/19). Ainda seria um resultado muito satisfatório, com a margem em relação à receita bruta variando ao redor de 32,6%.

– Considerando as operações agrícolas e de beneficiamento, o Itaú BBA projeta elevação de 9,2% para os custos do algodão, que deverão se aproximar de R$ 8.070 por hectare, diante de R$ 7.393 na safra 2019/20. Ao contrário da estabilidade esperada para o mercado do caroço de algodão, os preços da pluma deverão subir 4,3%. Mas a produtividade tende a recuar 2,7% (mantendo-se novamente inalterada no caso do caroço, na faixa de 2,13 toneladas por hectare).

– Isso corresponderá a margens na lavoura 14,1% menores, baixando de R$ 3.776 para R$ 3.245 por hectare entre os ciclos 2019/20 e 2020/21. Ao contrário da soja e do milho, os produtores de algodão deverão experimentar o segundo ano de retração nas margens agrícolas, lembrando que o banco projeta redução de 8,6% na comparação entre 2019/20 e 2018/19.

 

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