Segunda-feira, 22 de julho de 2024

Crédito mais curto e caro derruba a demanda econômica em janeiro

Encolhimento do crédito combinado com a contração nas emissões de moeda em janeiro, deverá desestimular a demanda total na economia | Foto: Reprodução

Postado em: 26-02-2021 às 08h15
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Crédito mais curto e caro derruba a demanda econômica em janeiro
Encolhimento do crédito combinado com a contração nas emissões de moeda em janeiro, deverá desestimular a demanda total na economia | Foto: Reprodução

Lauro Veiga 

O
sistema financeiro executou um movimento em duplo sentido ao longo do primeiro
mês do ano, enxugando a oferta de crédito numa ponta e reforçando, na outra,
suas “margens de rentabilidade” sobre empréstimos e financiamentos concedidos a
empresas e às famílias. O efeito desse encolhimento do crédito, ao ser
combinado com a contração nas emissões de moeda em janeiro, deverá desestimular
a demanda total na economia, que já vem sofrendo negativamente os efeitos do
fim do auxílio emergencial. Para comparação, em janeiro deste ano, o Tesouro
liberou um valor residual de R$ 279,138 milhões, uma mixaria perto dos R$
45,875 bilhões pagos em julho do ano passado. Mesmo comparado a dezembro,
quando o valor do auxílio já havia sido reduzido para R$ 17,329 bilhões, a queda
em janeiro atingiu 98,4%.

Mas
o crédito não ficou apenas mais curto para os tomadores. Seu custo subiu
novamente, ainda que não a taxa básica tenha sido mantida em apenas 2,0% ao
ano. Considerando todas as operações do sistema financeiro nacional, quer
dizer, incluindo o crédito “livremente” contratado aos bancos e o chamado
“crédito direcionado” (que inclui os financiamentos para habitação e
empréstimos para investimentos providos pelo BNDES), os juros subiram de 18,4%
em dezembro para 20,0% em janeiro, voltando aproximadamente aos níveis de maio
do ano passado (20,7%). Os juros cobrados das pessoas jurídicas avançaram de
11,2% para 13,4% de dezembro para janeiro, saindo de 23,2% para 24,3% no caso
das pessoas físicas.

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Ao
mesmo tempo, os “novos empréstimos” tomados por empresas e famílias desabaram
35,5% e 20,4% na passagem de dezembro para janeiro. Pela ordem, encolheram de
R$ 191,5 bilhões para R$ 123,5 bilhões e de R$ 208,2 bilhões para R$ 165,6
bilhões. No geral, considerando todos os setores da economia, as concessões de
novos empréstimos baixaram de R$ 399,7 bilhões para R$ 289,1 bilhões entre os
mesmos dois meses, num tombo de 27,7%.

Menos crédito,
mais ganho

Com
a elevação dos juros e a redução no volume de novos empréstimos, os bancos
buscaram ganhar mais sobre menos. O spread médio (ou seja, a diferença entre o
custo pago pelo setor financeiro para tomar recursos no mercado e os juros que
cobram ao repassar esse dinheiro aos tomadores de empréstimos) elevou-se de
14,4% em dezembro para 15,7% no primeiro mês deste ano, muito próximo aos
níveis observados em agosto do ano passado (15,8%). Detalhe relevante: a
inadimplência média, que havia rondado a faixa de 3,0% em janeiro de 2019,
manteve-se em 2,1% em igual mês deste ano, mesma taxa verificada em dezembro de
2019. Teoricamente, o spread poderia ser mais baixo diante de taxas de
inadimplência bem comportadas e muito inferiores aos níveis alcançados em
abril, por exemplo, quando chegaram a 3,3%.Como mostram os dados oficiais do
Banco Central (BC), não foi exatamente isso o que ocorreu na saída de dezembro
para janeiro.

Balanço

As
estatísticas do “mercado livre”, onde, em tese, imperaria bancos e tomadores de
empréstimos negociariam com ampla liberdade as condições de prazo e custos do
crédito, indicam um agravante no comportamento do setor financeiro. Claro, naquele
segmento do mercado de crédito, a tal “livre negociação” vale para grandes
grupos e conglomerados econômicos, com poder de fogo para de fato negociar com
os bancos – condição que, evidentemente, não se aplica às famílias e às micro,
pequenas e médias empresas.

Nesta
área, as concessões de novos empréstimos e financiamentos caíram 24,5% na
comparação entre janeiro deste ano e o mês final de 2020, encolhendo de R$
349,99 bilhões para R$ 264,11 bilhões. Os juros, no entanto, subiram de 25,5%
para 28,4%, mesmo que a taxa média de inadimplência tenha sido mantida em torno
de 3,0% pelo terceiro mês consecutivo (abaixo dos 3,8% registrados em janeiro
de 2020 e mais distante ainda dos 4,1% anotados em maio).

O
spread, como consequência, avançou de 20,9% em dezembro passado para 23,4% no
mês seguinte. Mas o custo de captação (ou seja, os juros que os bancos pagam
àqueles que deixam seu dinheiro aplicado ali) continuava baixo, em torno de
5,2% ao ano, diante de 5,1% em dezembro e de 6,3% em janeiro.

A
redução das concessões de novos empréstimos, avalia o Instituto de Estudos para
o Desenvolvimento Industrial (Iedi), pode estar relacionada “ao encerramento
dos programas emergenciais de crédito adotados no ano passado para amortecer a
crise econômica da Covid-19”. Entre março de 2020 e janeiro deste ano, as
concessões baixaram 28,6%, com tombo de 45,5% nos novos créditos contratados
pelas empresas.

O
comprometimento da renda das famílias com o pagamento de juros e amortizações
de empréstimos voltou a subir em novembro de 2020 (dado mais recente do BC).
Depois de ter recuado de 30,5% para 28,7% entre abril e julho, avançou para
30,9% sobre a massa salarial ampliada disponível, acumulada pelas famílias na
média trimestral. Parêntese: a massa ampliada soma salários e transferências de
renda do governo (aposentadorias, pensões, Bolsa Família e o Benefício de
Prestação Continuada), descontados o Imposto de Renda recolhido na fonte e
contribuições pagas à Previdência.

A
redução dos juros médios entre novembro de 2019 e o mesmo mês do ano passado,
de 29,7% para 23,7%, fez com que os gastos com juros e amortizações ficassem em
torno de 3,2% menores. Seria um alívio de a massa de renda disponível não
tivesse encolhido 8,7% naquela mesma comparação. Segundo as estatísticas do BC,
a massa salarial trimestral encolheu de R$ 294,11 bilhões para R$ 268,62
bilhões, em valores nominais (o que significa um tombo ainda maior se for
descontada a inflação acumulada no mesmo período).

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