Segunda-feira, 29 de julho de 2024

Investimento externo dispara, puxado por operações entre empresas e filiais

Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, deste fim de semana (27 e 28/3) | Foto: Reprodução

Postado em: 26-03-2021 às 23h59
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Investimento externo dispara, puxado por operações entre empresas e filiais
Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, deste fim de semana (27 e 28/3) | Foto: Reprodução

Depois
de virtualmente derreter em 2020, num tombo de 50,6% frente a 2019, o
investimento estrangeiro no País apresentou desempenho pouco usual para um
início de ano e mais do que dobrou no primeiro bimestre deste ano, em relação
aos primeiros dois meses do ano passado. Segundo dados oficiais do Banco
Central (BC), foram investidos no País em torno de US$ 10,845 bilhões no
primeiro bimestre deste ano, saindo de US$ 5,235 bilhões em 2020, num salto de
107,2%. Praticamente todo o investimento concentrou-se em fevereiro, quando
atingiu US$ 9,007 bilhões, o mais elevado para o mês desde 2011. Ali, a conta
havia alcançado US$ 10,321 bilhões, na sequência da crise financeira global de
2008/2009. Apenas no segundo mês do ano, o investimento mais do que triplicou,
subindo 249,1% diante de US$ 2,580 bilhões em fevereiro de 2020, às vésperas do
desembarque do Sars-CoV-2 no País.

O
que há por trás desses números? Eles seriam a confirmação das previsões
tresloucadas do ministro dos mercados, segundo as quais a economia brasileira
não só decola com vigor, mas também voltou a ser atraente para investidores
externos? Concretamente, o crescimento ainda não veio e nem voltará tão cedo,
considerando-se o ritmo dramático de aumento nos casos de Covid-19 e das mortes
causadas pelo novo coronavírus e a lentidão do programa de imunização. As
estatísticas do BC sugerem outra leitura para os dados aparentemente
“exuberantes” do investimento estrangeiro.

Todo
o crescimento registrado no acumulado do primeiro bimestre deveu-se a três tipos
de operação realizadas empresas e suas filiais, o que parece sugerir alguma
forma de “ajuste” dentro de casa ou uma “troca de chumbo” entre empresas
coligadas e ainda alguma manobra para lucrar com a alta do dólar no Brasil.
Como se sabe, o real está entre as moedas que mais tem perdido valor no mercado
internacional. O BC classifica como investimento as chamadas “operações
intercompanhias”, realizadas entre multinacionais e suas filiais no Brasil e
entre empresas como sede no País e suas subsidiárias no exterior. Ainda que
alguns economistas prefiram não classificar esse tipo de operação como
investimento.

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Por trás do
salto

Como
parte dessas operações entre empresas, as filiais de empresas brasileiras no
exterior remeteram a suas matrizes aqui dentro, supostamentea título de
investimento, algo como US$ 2,160 bilhões em janeiro e fevereiro deste ano, o
que se compara com apenas US$ 64,626 milhões no mesmo período do ano passado, correspondendo
a um salto de 3.142%. Isso mesmo, nada menos do que 32,4 vezes a mais. Para se
ter uma ideia, em todo o ano de 2017, as filiais brasileiras haviam injetado em
suas matrizes US$ 2,898 bilhões. Na mesma linha, as operações entre “empresas
irmãs” (quer dizer, de um mesmo grupo) cresceram 42,7%, passando de US$ 1,529 bilhão
para US$ 2,182 bilhões. Listado como investimento em capital, o chamado
“investimento reverso” (ou seja, a repatriação de lucros auferidos no exterior
por empresas brasileiras para reinvestimento no Brasil) atingiu US$ 3,015
bilhões no primeiro bimestre deste ano. Em igual período de 2020, essa conta
havia ficado no negativo, com a saída do País de US$ 230,452 milhões.

Balanço

·  
Somadas,
aqueles três tipos de operação atingiram US$ 7,356 bilhões no bimestre,
praticamente 68,0% do investimento estrangeiro total. Nos primeiros dois meses
de 2020, a soma havia fechado em US$ 1,363 bilhão, o que significa que, neste
ano, registrou-se um avanço de quase 340%. Mais uma vez, o resultado foi
definitivo para o aumento do investimento estrangeiro total.

·  
Para
comparação, os valores investidos avançaram US$ 5,610 bilhões (de US$ 5,235
bilhões para US$ 10,845 bilhões). Analisadas em conjunto, aquelas três operações resultaram na entrada líquida de US$ 5,993 bilhões na
conta do investimento (o que significa dizer que as demais modalidades
classificadas pelo BC sofreram algum recuo).

·  
De
fato, descontadas as remessas de filiais para matrizes no Brasil, as operações
entre empresas irmãs e os lucros no exterior reinvestidos aqui, o saldo
restante encolheu 9,9%, recuando de US$ 3,872 bilhões para US$ 3,489 bilhões.

·  
Se
os investimentos parecem ter mudado de rota, pelo menos nos dados iniciais de
2021, o restante das contas externas mantém a tendência observada nos meses
anteriores, com o déficit na conta de transações correntes em queda mais uma
vez. No acumulado do bimestre, o saldo negativo encolheu 37,2% em comparação
com igual intervalo de 2020, baixando de US$ 14,967 bilhões para US$ 9,399
bilhões.

·  
O
rombo no setor de serviços, que inclui gastos com viagens, aluguel de
equipamentos importados, royalties e outras despesas, reduziu-se pela metade
(queda de 50,6%), caindo de US$ 4,631 bilhões para US$ 2,289 bilhões. Os gastos
com viagens, que ocupou as atenções da imprensa dita especializada durante os últimos
anos, foram literalmente vaporizados, limitados a US$ 67,588 milhões nos dois
primeiros meses deste ano, diante de US$ 1,167 bilhão em 2020 – um tombo de
94,2%.As despesas com o aluguel de equipamentos, já descontadas as receitas
(reduzidíssimas) do País nesta mesma área, murcharam 53,5%, de US$ 2,419
bilhões para US$ 1,126 bilhão.

·  
A
chamada conta da renda primária, que contabiliza receitas e despesas em dólares
decorrentes de investimentos estrangeiros feitos aqui dentro e de brasileiros
realizados no exterior, apresentou déficit (ou seja, entrada de dólares menor
do que a saída) de US$ 6,337 bilhões, em queda de 36,2% frente ao rombo de US$
9,925 bilhões nos mesmos dois meses de 2020.

·  
A
redução no déficit está diretamente relacionada à crise doméstica enfrentada
pelo País, que derrubou os gastos lá fora e impôs uma retração vigorosa nos
lucros das empresas. As remessas de lucros e dividendos relacionados a
investimentos diretos e a aplicações no mercado brasileiro de títulos e ações
por estrangeiros despencaram 46,1% no primeiro bimestre, saindo de US$ 3,163
bilhões para US$ 1,706 bilhão.

 

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