Produção recua depois de nove meses de alta e recuperação produz um “ratinho”

Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, desta Sexta-feira (2/4) | Foto: Reprodução/Portal Brasil

Postado em: 02-04-2021 às 08h00
Por: Sheyla Sousa
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Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, desta Sexta-feira (2/4) | Foto: Reprodução/Portal Brasil

Lauro Veiga

Depois
de nove meses de alta, quando acumulou variação (aparentemente) explosiva de
41,9%, de acordo com a pesquisa mensal da produção industrial do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a tal recuperação acelerada,
preconizada pelo Ministério da Economia, pariu um ratinho. Na verdade, aquele
salto só ganha expressão pela comparação com o período de queda vigorosa
observado em março e abril do ano passado. Todo o avanço acumulado até fevereiro
deste ano resultou numa variação de 2,4% desde o segundo mês do ano passado.

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Se
comparada diretamente com os níveis da produção realizada há um ano, a
indústria operou um avanço de apenas 0,4% em fevereiro de 2021. Na comparação
com igual mês do ano anterior, a produção havia saltado 8,3% em dezembro, para
em seguida variar 2,3% antes de quase estacionar em fevereiro deste ano. A
tendência é nitidamente de desaquecimento, com perspectiva de números mais
negativos adiante, num agravamento proporcional ao ritmo descontrolado da
pandemia em todo o País. A comparação com o mês imediatamente anterior reforça
esse tipo de conclusão: a produção havia avançado 1,0% em outubro e mais 1,0%
em novembro; desacelerou para 0,8% em dezembro e para 0,4% em janeiro deste ano
para recuar 0,7% em fevereiro.

Para
o economista José Francisco de Lima Gonçalves, economista chefe do Banco Fator,
o processo de ajuste de estoques, que levou a produção a experimentar
crescimento nos meses anteriores, parece se esgotar agora, sugerindo uma virada
nesse ciclo, necessariamente temporário. No relatório distribuído diariamente a
seus clientes, o economista observa que a “indústria continua com seu ajuste rumo
aos níveis pré-pandemia”, num tipicamente relacionado à reposição de estoques,
o que levou a indústria a produzir acima dos níveis observados antes da
interrupção das atividades por conta da pandemia. Isso explicaria, na sua
visão, inclusive os empregos abertos pelo setor mais recentemente, acompanhadas
até mesmo da contratação de horas extras.

No ritmo dos
estoques

Os
estoques na indústria, conforme dados da Confederação Nacional da Indústria
(CNI) compilados pelo economista Ailton Braga, mestre em economia pela UnB,
analista do Banco Central de 1998 a 2005 e atual consultor legislativo do
Senado, já vinham sofrendo alguma redução desde meados de 2019, antes mesmo da
pandemia, que causou a paralisação de vários setores da indústria e reduziu a
produção drasticamente em outros. Os desequilíbrios instaurados ao longo da
cadeia de suprimentos e a normalização das operações na indústria, com a
suspensão gradual das primeiras medidas mais duras de isolamento social,
criaram novas pressões sobre o setor industrial. Por volta de agosto ou
setembro de 2020, a curva dos estoques inicia uma inversão e volta a crescer,
chegando a janeiro deste ano próxima dos níveis de maio (mas ainda distante de
2019 e 2018).

Balanço

Gonçalves
ressalta que a reposição de estoques tende a trazer reflexos não duradouros
para o nível da atividade na indústria, já que “a produção tende a se conformar
à demanda corrente e esperada, não a variações de estoques, seja do lado do
próprio setor, seja do lado de seus demandantes”.

Segundo
ele, “a queda (da produção) na margem (ou seja, na comparação com o mês
imediatamente anterior) e a piora generalizada na variação interanual (frente
ao mesmo mês do ano anterior) mostram que o ajuste está acabando”. Como
indicativo dessa virada de tendência na indústria, Gonçalves lembra que, na
variação acumulada em 12 meses, “o setor de insumos típicos da construção civil
foi o único que melhorou”.

Embora
possa haver alguma divergência em relação a esse processo de ajuste sazonal,
prossegue o economista, “a desaceleração interanual sustenta a avaliação de
piora da economia e expectativas mais frágeis do lado do varejo, inclusive pelo
fim do auxílio emergencial”.

A
aprovação e o início do pagamento da versão mitigada do auxílio emergencial,
resumido agora a magérrimos R$ 250 mensais por família, não deverão aliviar em
muito as perspectivas imediatas para a economia, para a renda das famílias e
para o desemprego. Para lembrar, o valor médio do auxílio compraria menos da
metade da cesta básica em Goiânia.

Segundo
estimativa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos (Dieese), a cesta básica dos goianienses sairia por R$ 560,67
na pesquisa mais recente, referente a fevereiro deste ano. Portanto, o valor do
auxílio corresponderia a apenas 44,6% do custo da cesta de produtos essenciais
para a sobrevivência de uma família.

De
volta à “vaca fria”, conforme analisa o Instituto de Estudos para o
Desenvolvimento Industrial (Iedi), “a trajetória de desaceleração que vinha se
desenhando para a indústria nos últimos meses, na esteira da piora do quadro
sanitário, da redução e posterior extinção dos programas emergenciais e do
elevado desemprego, se converteu em nova queda da produção” já em fevereiro. Ainda
conforme o instituto, “desde o momento mais agudo do choque da Covid-19, em
abril do ano passado, que a produção industrial não registrava variação
negativa na série com ajuste sazonal” (quer dizer, na comparação mês a mês,
excluídos fatores que ocorrem em períodos determinados do ano e que podem
distorcer a comparação mensal).

“Ao
que parece”, prossegue o Iedi, “a perda de dinamismo recente da indústria vem
sendo condicionada pelos ramos cujos mercados dependem do consumo das famílias,
que tem sido freado não apenas pelo medo e isolamento decorrente diretamente da
Covid-19, mas também pelo desemprego e pelo fim do auxílio pago às famílias”.

Como
o cenário apenas agravou-se desde lá, a possibilidade de perdas para o setor
parece muito mais concreto do que a perspectiva de a produção voltar a
experimentar taxas positivas daqui em diante.

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