Segunda-feira, 22 de julho de 2024

Com dívida em alta e renda em queda, inadimplência pode voltar a crescer

Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, desta Quinta-feira (22/4) | Foto: Reprodução

Postado em: 22-04-2021 às 07h30
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Com dívida em alta e renda em queda, inadimplência pode voltar a crescer
Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, desta Quinta-feira (22/4) | Foto: Reprodução

Lauro Veiga 

O
fantasma de uma retomada da inadimplência, com efeitos mais danosos sobre as
famílias de renda mais baixa, volta a rondar a economia, resultado do
agravamento dramático da pandemia a partir de março, do desemprego ainda em
níveis historicamente altos e da perda de renda causada duplamente pela alta da
inflação entre o final e os primeiros meses deste ano e pela perda de empregos
– sobretudo no setor de serviços, mais atingido pelas medidas de restrição à
circulação adotadas pelos Estados.

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O
risco de uma tendência de retomada dos atrasos no pagamento de prestações do
crediário pelo consumidor pode ser antevisto nas estatísticas do Banco Central
(BC) e também nas sondagens sobre a saúde financeira do consumidor realizadas
pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). Uma
eventual elevação da inadimplência, daqui em diante, poderia obrigar o setor
financeiro à nova rodada de suspensão de cobranças e de adiamento de
pagamentos, conforme sugere a Associação Nacional dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade (Anefac) em reportagem publicada pela edição
deste mês da revista Conjuntura Econômica, assinada por Claudio Conceição e
Solange Monteiro.

Até
fevereiro último, ao menos no mercado de crédito, os indicadores de
inadimplência das pessoas físicas vinham se mantendo relativamente bem
comportados, com a taxa de pagamentos em atraso a mais de 90 dias atingindo em
torno de 4,1% dos empréstimos totais, praticamente em estabilidade desde o
final do ano passado. Na primeira onda da pandemia, a inadimplência no segmento
do crédito “livre” (onde supostamente o consumidor estaria livre para negociar taxas
e condições de pagamento com os bancos) havia atingido 5,6% em maio de 2020.

Ao
longo dos 12 meses encerrados em janeiro deste ano, houve nítido descompasso
entre a variação da dívida ampliada das famílias (majoritariamente constituída
por empréstimos e financiamentos tomados a bancos e financeiras) e a renda
disponível. Nos dados do BC, aquela dívida acumulou um salto de 10,6% entre
janeiro de 2020 e o mesmo mês deste ano, saindo de R$ 2,232 trilhões para R$
2,468 trilhões. Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), a dívida saiu de
30,0% para 33,1%.

Descasamento

Se
o crescimento da dívida descolou-se do desempenho da economia, houve um
descasamento total frente à massa salarial ampliada disponível. No conceito do
BC, a massa de renda sofreu baixa nominal de 4,96% entre janeiro do ano passado
e o primeiro mês deste ano, recuando de R$ 3,443 trilhões para R$ 3,272
trilhões, em valores nominais. A massa disponível soma todos os rendimentos do
trabalho, pensões aposentadorias e benefícios sociais (como Bolsa Família e
Benefícios de Prestação Continuada), embora não contemple o auxílio emergencial
pago entre abril e dezembro do ano passado, e desconta o pagamento do Imposto
de Renda (IR) e de contribuições à Previdência. A relação entre dívida e massa de
rendimentos saltou de 64,8% para 75,4%.

Balanço

A
reportagem da Conjuntura Econômica aponta um aumento na demanda por crédito
entre os consumidores, com destaque para aqueles com renda mais baixa, ao mesmo
tempo em que as sondagens do Ibre/FGV identificam uma piora nos indicadores de
atraso no pagamento de dívidas.

Essa
combinação parece sugerir que as famílias estariam buscando a contratação de
novos empréstimos para pagar despesas e fazer frente a compromissos já
realizados, apontam Conceição e Monteiro.

Na
média, segundo indicador da Serasa Experian, que acompanha dados de
inadimplência do consumidor no País, a procura de consumidores por crédito
cresceu 20,1% em março deste ano, comparado ao mesmo mês do ano passado. Mas
saltou 26,9% entre consumidores com renda de até R$ 500 e 21,4% para aqueles
com rendimentos entre R$ 500 e R$ 1,0 mil, na mesma comparação.

Ao
mesmo tempo, 79,0% das pessoas com renda de até R$ 2,1 mil mensais apontaram,
na sondagem do Ibre/FGV, que pelo menos um morador de sua residência tornou-se
inadimplente ou ampliou o atraso no pagamento de dívidas nos últimos seis
meses. Na faixa de renda entre mais de R$ 2,1 mil e R$ 4,8 mil, o percentual
atingiu 61,0%.

O
principal motivo apontado pelas pessoas de renda mais baixa foi a perda do
emprego por algum membro da família, com 49,6% das respostas. Para a faixa de
consumidores com ganhos acima de R$ 2,1 mil e até R$ 4,8 mil, o desemprego foi
citado por 26,5% dos entrevistados e a redução de salário por 24,3%.

Não
é coincidência, portanto, que 45,9% dos entrevistados naquela última faixa
registrem atrasos de um a três meses no pagamento de dívidas, maior percentual
entre os pesquisados. Na mesma condição encontravam-se 37,6% dos entrevistados
com renda de até R$ 500.

Para
agravar, o custo do crédito para o consumidor, consideram a média anual das
taxas de juros cobradas nas linhas à disposição das famílias, subiu de 90,34%
em novembro do ano passado para 95,38% em março deste ano, de acordo com a
Anefac.

Conforme
Viviane Seda Bitencourt, coordenadora das sondagens do Ibre/FGV, ouvida pela
reportagem, o indicador de estresse financeiro dos consumidores, que soma o
percentual daqueles que usaram a poupança para pagar despesas correntes e
aqueles que tiveram que se endividar, saiu de 23,2% em fevereiro deste ano
(mesma taxa registrada em dezembro passado) para 25,7%. Para aqueles com renda
de ate R$ 2,1 mil, no entanto, o indicador avançou de 27,2% para 30,4% entre
fevereiro e março. “No caso das famílias de mais baixa renda, o percentual dos
que se dizem endividados é maior do que no ano passado. Em realidade, é o nível
mais alto desde junho de 2016, durante a recessão”, afirmou Viviane.

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