Machismo no esporte: os desafios enfrentados por atletas mulheres dentro e fora das Olimpíadas

Exclusão, desvalorização da categoria, discrepância salarial e sexualização dos corpos são alguns dos problemas ligados à questão de gênero na prática esportiva

Postado em: 01-08-2021 às 08h45
Por: Giovana Andrade
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Exclusão, desvalorização da categoria, discrepância salarial e sexualização dos corpos são alguns dos problemas ligados à questão de gênero na prática esportiva | Foto: Reprodução

Os Jogos Olímpicos de Tóquio, adiados em decorrência da pandemia de Covid-19 e finalmente realizados, trouxeram à tona debates pertinentes, que não deveriam adormecer. Um deles diz respeito às questões de gênero, um ponto sensível não apenas no contexto dos esportes, mas em diversos aspectos da vida social.

Na edição deste ano, ganhou destaque a discussão acerca dos uniformes das atletas mulheres. Na ginástica artística, o time feminino da Alemanha virou assunto após substituir os collants por macacões até o tornozelo, com o objetivo de combater a sexualização do corpo das mulheres.

Além disso, dois dias antes da abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio, atletas da seleção feminina de handebol de praia da Noruega informaram ter sido multadas pela federação europeia da modalidade pelo uso de “roupas inapropriadas”. Elas jogaram com shorts em vez de biquínis durante a Euro de Handebol Feminino 2021 e, por esse motivo, cada jogadora foi punida com o pagamento de US$ 177 (cerca de R$ 920).

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A polêmica, no entanto, não é algo isolado, e se relaciona com outros desafios enfrentados por mulheres no mundo dos esportes. Enraizados no machismo, ou seja, no tratamento desigual entre homens e mulheres, estão problemas como a sexualização do corpo feminino, a desvalorização de atletas mulheres, que leva à discrepância nos salários de atletas homens e mulheres e à falta de investimento nas categorias femininas de diversas modalidades.

Um argumento comum entre aqueles que defendem a permanência dessas desigualdades é que elas existem porque há menos procura dos espectadores pelas categorias femininas. Foi o que afirmaram muitos quando a revista France Football, em 2019, revelou que a atacante Marta ganhava apenas 0,3% do rendimento anual de Neymar, ou seja, menos de 1%.

Mas o que explica, então, a desigualdade salarial de maneira geral? Afinal, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgado em março 2021, as mulheres receberam 77,7% do salário dos homens no Brasil em 2019.

É o que destaca Patrícia Menezes, gestora do Departamento Feminino do Goiás Esporte Clube e presidente do Aliança Futebol Clube, time feminino do estado de Goiás. Em entrevista ao O Hoje, ela diz que o principal desafio enfrentado pelas mulheres na prática do esporte, especialmente do futebol, é o preconceito, que se faz presente em todas as instâncias em que a mulher atua.

“Não precisa ser só no futebol, em outras áreas a mulher desempenha o mesmo papel e recebe muito menos, independente da profissão, ela exerce a mesma função que um homem e a remuneração dela sempre é menor”, justifica.

No mesmo sentido, vale lembrar que as mulheres tiveram que lutar até mesmo pelo direito de praticar esportes e participar das competições. No Brasil, por exemplo, um decreto que vigorou de 1941 a 1979 proibia mulheres de praticarem esportes “inadequados a sua natureza”, e a ditadura militar chegou a listar as modalidades proibidas, que incluíam de futebol e rúgbi a artes marciais.

Nas Olimpíadas, por sua vez, a participação feminina só começou em 1900, no tênis e no golfe. Em 1904, elas participaram em apenas um esporte: tiro com arco. No futebol e no boxe, por exemplo, as mulheres só passaram a competir nos Jogos Olímpicos a partir de 1996 e 2012, respectivamente.

A inclusão da categoria feminina do futebol nas Olimpíadas representa o avanço das mulheres em campo. Patrícia, que acompanha o futebol feminino há 40 anos, tendo atuado também como jogadora e preparadora física, afirma que o cenário já melhorou muito. “Hoje em dia já temos muitas equipes, as meninas estão se impondo, querendo jogar”, diz. “As equipes valorizam as suas atletas, então elas são contratadas profissionalmente, o que mostra que já avançamos muito”, completa.

Entretanto, ainda há espaço para melhorar. Segundo Patrícia, é importante aumentar as competições, especialmente nas categorias de base, e incentivar desde cedo as meninas a praticarem esportes, como acontece com os meninos. Além disso, ela conta que precisa lutar por subsídios para os times femininos, que não recebem a mesma atenção que os masculinos.

Com mais patrocínio, as competições de categorias femininas poderiam ganhar mais visibilidade, e mudar o rumo do círculo vicioso que se estabelece graças a um sistema opressor e que se manifesta nas mais diversas formas, desde a exclusão em competições até a baixa remuneração e a sexualização dos corpos femininos. Nessa batalha, as atletas mulheres travam uma luta digna de primeiro lugar no pódio olímpico.

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