Projeto que anistia manifestantes não exclui atos de vandalismo no DF

Texto do deputado major Vitor Hugo está parado desde dezembro na Câmara e não deve ser aprovado

Postado em: 14-01-2023 às 09h00
Por: Francisco Costa
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Texto do deputado major Vitor Hugo está parado desde dezembro na Câmara e não deve ser aprovado. | Foto: Marcelo Camargo

O projeto do deputado federal Major Vitor Hugo (PL) para anistiar de crimes políticos manifestantes que tenham participado de atos em rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional tramita desde o dia 30 de outubro, data da derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições. A matéria, no entanto, não excluiria os atos de vandalismo de 8 de janeiro, em Brasília. 

Na parte das destruições ele até poderia gerar anistia, é o que explica Saulo Coelho, presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-GO e professor da UFG. Mas a ação foi além disso.

Como mencionado, o vandalismo não foi a única situação relacionada aos suspeitos de depredarem as sedes dos três Poderes, no Distrito Federal. Segundo o jurista, o texto não anistiaria as agressões físicas a policiais e jornalistas (lesões corporais), conforme divulgado amplamente pela imprensa. 

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Ele também aponta que, caso o texto passasse, ele poderia ser declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). E ainda seria possível uma interpretação que não incluísse a anistia à invasão às sedes dos poderes, pois o texto tinha por alvo os atos em rodovias e diante de quartéis, não atos de invasões às sedes. “De todo modo, acho improvável que seja aprovada, menos ainda que seja sancionada, ou que o veto seja superado no Legislativo.”

Saulo também cita que existe uma tese jurídica – pouco usada, mas existente – chamada “desvio de finalidade legislativa”, aplicável em atos legislativos que incidem sobre fatos específicos – como esta Lei. “Esta tese considera inválido o ato legislativo para fatos específicos quando são criados com finalidades ou interesses espúrios ou contrários aos princípios constitucionais e aos objetivos da República”, o que seria outra barreira para o projeto.

Criminalista

O advogado criminalista Paulo Castro cita que o projeto tem objetivo de garantir a não punição de manifestantes até que ela entre em vigor – se aprovada. Segundo ele, muitos abusos cometidos no domingo, seriam anistiados. 

“Condutas de dano ao patrimônio público, que causou e causará prejuízos a União de ordem jamais vista; crimes de golpe de Estado; contra as instituições democráticas, contra os Poderes da República; organizações criminosas; os financiadores dessas organizações…”, enumerou.

Ele observa, ainda, que o intuito é a não punição daqueles que têm ideologia comum a de Major Vitor Hugo. “Seria, no meu entender, uma manobra para que as pessoas envolvidas não venham a ser punidas. Um projeto que demonstra desespero dessa classe ideológica e política.”

Texto protocolado

O texto foi protocolado com pedido de urgência em novembro do ano passado e está parado na Câmara. Desde 6 de dezembro, ele está na Comissão de Constituição e Justiça da Casa e, após os atos de vandalismo no último domingo (8), em Brasília, não deve seguir. 

No dia dos atos, o parlamentar afirmou pelo Twitter que “manifestações pacíficas são garantidas pela Constituição”, mas que “ações de vandalismo e violência não são”. Ele citou o projeto e disse que o mesmo “não protege quem comete crimes contra a vida, contra a integridade corporal, de sequestro e de cárcere privado e nem os que a CF proíbe, como terrorismo, por exemplo”.

Na mesma postagem, contudo, ele fez insinuações sobre a possibilidade dos atos não terem ocorrido por parte de bolsonaristas. “Por fim, há que se investigar a possibilidade de infiltração de militantes de outras correntes políticas nas manifestações. Não são do feitio da direita ações violentas e com iniciativas de vandalismo.”

Texto da lei

Realmente, a matéria não inclui a prática de crimes contra a vida, contra a integridade corporal, de sequestro e de cárcere privado. Contudo, anula multas aplicadas pela Justiça Eleitoral ou comum. O intuito do parlamentar era que a matéria passasse ainda no governo Bolsonaro (PL), que o mesmo pudesse sancioná-la.

Ainda na proposta, o parlamentar goiano, que também foi o candidato ao governo de Goiás de Bolsonaro, inclui entre os manifestantes caminhoneiros, empresários e qualquer um que tenha participado dos atos. “A participação em manifestações de que trata o caput abrange também o financiamento, a organização e o apoio de qualquer natureza, além das falas, comentários ou publicações em redes sociais ou em qualquer plataforma na rede mundial de computadores (internet)”, diz trecho da proposta. 

Justificativa

Na justificativa do projeto, Vitor Hugo afirma que as manifestações são legítimas e conduzidas espontaneamente por cidadãos indignados pela forma como se deu o processo eleitoral nesse ano. Para ele, inclusive, não se tratam de atos golpistas.

“Não temos dúvidas de que não se trata de ações antidemocráticas ou crimes de qualquer natureza. Entretanto, infelizmente, essa convicção não é reverberada por importantes setores da sociedade e que podem impor às famílias hoje acampadas em diversas partes do País acusações de cometimento de crimes das mais diversas naturezas, o que se configuraria na maior das contradições vividas por nosso País nos últimos tempos: justamente aqueles que lutam, pacificamente, pela democracia brasileira são os acusados de atentar contra ela”, escreveu à época.

Para ele, é um erro punir e intimidar cidadãos em sua livre manifestação pacífica, em pleno exercício de seus direitos constitucionais. Além disso, chamou as decisões judiciais contra os atos de autocráticas e desrespeitosas, “com consequências inimagináveis para o futuro”. Assim, ele argumenta que a aprovação do projeto de lei constituiria um gesto de pacificação e de redenção do parlamento “em face das milhões de pessoas que estão nas ruas nesse exato momento”.

Existe, ainda, uma enquete sobre o projeto. Nele, 5% dizem concordar totalmente (10.242 pessoas). Outras 376 dizem que concordam em parte, 22 relatam que estão indecisas, 334 que discordam da maior parte e 192.519 discordam totalmente, 95%.

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