Líder do MST diz que CPI tentará criminalizar luta por reforma agrária

"É a tentativa de mais uma vez enquadrar a militância do movimento", argumenta Patrícia Cristiane.

Postado em: 17-05-2023 às 08h20
Por: Francisco Costa
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"É a tentativa de mais uma vez enquadrar a militância do movimento", argumenta Patrícia Cristiane.. | Foto: José Cruz/ABR

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) pode começar os trabalhos nesta quarta-feira (17), conforme acredita o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), cotado para ser o relator. Patrícia Cristiane, da direção nacional do MST e do movimento em Goiás, diz que a CPI tem como intuito apenas criminalizar a luta por reforma agrária no País.

“Para nós do MST, essa CPI tem a finalidade de criminalizar a luta pela reforma agrária no Brasil. É a tentativa de mais uma vez enquadrar a militância do Movimento”, argumenta. Segundo ela, a bancada ruralista quer tentar tirar o foco de seus crimes ambientais e “o modelo nefasto de produção do agro”.

Segundo ela, são poucos os parlamentares que apoiam a luta pela terra. No Estado, ela cita os deputados Rubens Otoni e a Delegada Adriana Accorsi, ambos do PT. “São exemplos bons de deputados federais apoiadores dos movimentos sociais.”

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CPI

Ainda sobre a CPI, ela teve requerimento pelo deputado Coronel Zucco (Republicanos-RS). Junto com Salles, ele é referendado pela Frente Parlamentar de Agricultura (FPA).

O requerimento de abertura da CPI, vale citar, teve a leitura em 26 de abril. Ela é vista como forma de pressionar e desgastar o governo Lula (PT) e tem como objeto a investigação de ocupações de terras em áreas do sul da Bahia e Goiás, além de outros locais.

Ocupação em Hidrolândia

No último dia 25 de março, cerca de 600 famílias do MST ocuparam a fazenda São Lukas, em Hidrolândia, em ação que fez parte da Jornada Nacional de Lutas das Mulheres Sem Terra – a operação foi realizada por mulheres. A Polícia Militar (PM), contudo, desocupou o local no dia seguinte. Gilvan Rodrigues, coordenador do MST em Goiás, disse que a área, contudo, já estava sendo repassada ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para se tornar um assentamento de reforma agrária.

A fazenda faz parte do patrimônio da União desde 2016, pertencendo antes disso, conforme o MST, a um grupo condenado em 2009 por exploração sexual e tráfico internacional de pessoas. Por nota, o MST disse que “a ação do Governo de Goiás, por meio da Polícia Militar, de proteger latifúndio usado para exploração sexual e tráfico humano, foi arbitrária e ilegal”.

À época, a PM informou que houve um diálogo “amistoso com os líderes do movimento e seus advogados”. A operação, segundo a corporação, ocorreu pois, conforme advogado do município, Hidrolândia conseguiu o direito do uso da terra em setembro de 2022 e que a mesma exerce “função social” era preparada para “criação de lavouras e hortas comunitárias”.

O Jornal O Hoje entrou em contato com o Incra que confirmou, por nota, que “a área será transformada em assentamento da reforma agrária. Está em elaboração no Incra Goiás projeto de utilização do imóvel. O documento sendo finalizado, segue para o Incra Sede cadastrar em sistema específico da Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Após este cadastro, a SPU pode legalmente transferir o imóvel para a responsabilidade do Incra. Esperamos novidade neste trâmite de transmissão do imóvel da responsabilidade da SPU para o Incra Goiás nos próximos meses”.

O que a CPI vai descobrir?

No fim de semana, em visita à 4ª Feira da Reforma Agrária em São Paulo, promovida pelo MST, o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta, disse que a CPI mostrará que o Movimento é um dos maiores produtores de alimentos do País.

Pimenta afirmou que não tem a preocupação de a oposição utilizar a CPI para atacar o governo. “Eu não tenho essa preocupação, pelo contrário. Eu acho que muita gente não conhece o MST como maior produtor de arroz orgânico da América Latina, o MST como grande produtor de comida, de alimento”, disse em entrevista, no Parque da Água Branca, onde foi realizada a feira.

“A CPI vai ser uma grande oportunidade de o Brasil conhecer o MST. O MST vai sair dessa CPI mais respeitado, maior, tendo mais visibilidade e sendo mais admirado”, acrescentou o ministro.

Ainda sobre a feira, a líder do MST, Patrícia Cristiane, enalteceu a participação de Goiás, mesmo com toda dificuldade. “Levamos um caminhão de produtos de diversas regiões como Formosa, Piranhas, Catalão, Itaberaí e uma banca de comida típica de Goiás com arroz com pequi, frango caipira ao molho e guariroba.”

Segundo ela, o evento teve, ao todo, participação de 320 mil pessoas, 151 cooperativas, 1,7 mil feirantes, além de 560 toneladas de produtos. Os números ainda incluem 38 toneladas de doações, 1.730 tipos de produtos, 20 mil mudas de árvores e 880 kg de sementes. 

Crise do governo com o agro

A feira, sucesso na visão do MST, criou um grande ruído entre o governo e a bancada ruralista. pegou mal a ida de integrantes do alto escalão desse terceiro mandato de Lula a uma feira do MST. Além do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), foi ao evento o ministro de Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira. 

Na ocasião, o vice de Lula foi aclamado e chamado de “guerreiro do povo brasileiro”. Embora não tenha ido à feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se tornou um garoto-propaganda de um fubá produzido pelos produtores ligados ao MST. 

Parlamentares ligados ao agro não gostaram nenhum um pouco da cortesia ao MST, tendo em vista que há uma tensão entre produtores rurais e o movimento devido a diversas ocupações de fazendas desde que Lula assumiu a Presidência e, por enquanto, não repreendeu, pelo menos publicamente, as lideranças. 

O vice-presidente da FPA na Câmara, o deputado federal Evair de Melo, do PP de Ciro Nogueira, respondeu à visita com uma frase intrigante: “o governo arrancou a ponte com o agro”. E, taxativo, interpretou: “não tem mais diálogo”. 

Além do último episódio, ocorreu que o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, disse que foi desconvidado pela Feira Agroshow, uma das mais importantes do setor do agro da América Latina, quando anunciou que Jair Bolsonaro iria ao evento. 

Em resposta, Lula disse que o Banco do Brasil, que patrocina o evento, não daria um real. Tudo em represália, o que causou ainda mais ira nos representantes do agro. Com “sangue nos olhos”, a FPA deve tentar inflamar ainda mais CPI do MST para desgastar o governo Lula. Ao presidente e seus auxiliares, cabe a busca pela conciliação.

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