Goiás se despede de Batista Custódio, fundador do jornal Diário da Manhã 

Jornalista morreu na manhã da última sexta-feira após luta contra o câncer de pulmão

Postado em: 25-11-2023 às 09h30
Por: Yago Sales
Imagem Ilustrando a Notícia: Goiás se despede de Batista Custódio, fundador do jornal Diário da Manhã 
Batista Custódio dos Santos tinha 88 anos e não sobreviveu às consequências de um câncer no pulmão | Foto: Foto: Reprodução / Facebook

No princípio era o adjetivo, e o adjetivo estava com Batista Custódio, e o adjetivo era Batista Custódio. Destemido, intrépido, intimidador, ousado, resoluto, desassombrado, denodo, bravio, agastado, atrabiliário, atilado, furtivo.

Jornalista e empresário, Batista Custódio dos Santos morreu, aos 88 anos, na última sexta-feira (24), em um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital São Francisco, em Goiânia, onde ele perdeu a batalha contra o seu último inimigo: o câncer de pulmão, piorado por uma pneumonia. 

Fundador de dois dos mais conhecidos jornais de Goiás, Cinco de Março e Diário da Manhã, o DM, o fim do jornalista repercutiu tão logo o anúncio foi feito durante a manhã. Nas redes sociais, repórteres, editores, diagramadores, fotógrafos e tantos outros ex-funcionários se manifestaram ao mesmo tempo em que políticos demonstraram pesar.

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O governador Ronaldo Caiado e o prefeito de Goiânia Rogério Cruz decretaram luto oficial de três dias. A medida demonstra uma fatia mínima do que representava a figura oponente de Custódia que tinha trânsito livre nos poderes goianos há mais de 60 anos. 

“Goiás perdeu hoje um dos seus maiores comunicadores”, disse, pela rede social X, o governador. “Foi um dos grandes de nosso estado e seu nome ficará gravado na história. Um dos homens mais cultos que conheci e que foi referência no jornalismo brasileiro”, escreveu ele sobre a importância do trabalho chefiado por Custódia nos dois jornais em que esteve à frente durante décadas. 

O jornal Diário da Manhã, que teve como sede boa parte da sua história num prédio atualmente abandonado na Avenida Anhanguera, no Setor Universitário, viveu o auge da opulência da prática do jornalismo. Foi quando recebeu o renomadíssimo Prêmio Esso de Jornalismo. 

Por causa de uma prática inovadora, de abrir o jornal para publicação de artigos de seja lá quem for, com caderno que depois se chamaria Opinião Pública, ganhou, da Academia Brasileira de Letras (ABL), o título de terceiro lugar de Melhor Veículo de Comunicação do Brasil. Isto foi lá em 1984, quando o Brasil corria em busca de retorno à democracia. 

Por meio de nota, o prefeito de Goiânia, Rogério Cruz, que teve encontros com o jornalista em sua residência, onde costumava receber personalidades políticas e admiradores, também emitiu nota. 

“É com imenso pesar que eu e minha família recebemos a notícia do falecimento do jornalista Batista Custódio”, para o qual Cruz classifica como “um baluarte da liberdade de expressão e da imprensa livre, um defensor da democracia que marcou seu nome profundamente na história de Goiás e do Brasil”.

A solidariedade também foi compartilhada pelo empresário e presidente do Grupo O Hoje, José Allaesse. “Sem dúvidas, Batista Custódio contribuiu para o fortalecimento da imprensa goiana, dando coragem para que outros veículos surgissem e ajudassem a sociedade a ter voz”, comentou o presidente.

Perfil

A história de Batista Custódio se confunde com a história de Goiânia, da política e imprensa brasileiras. Ele é filho de uma família bem-sucedida de produtores rurais de Caiapônia. Quando veio para Goiânia, ainda jovem, tinha na veia a literatura. Ligou as coisas e pensou: poderia viver escrevendo. 

Batista Custódio, no entanto, precisou de um empurrãozinho de um dos grandes jornalistas do eixo Rio-São Paulo, Alfredo Nasser que, inclusive, foi tio da esposa e mãe de seus primeiros filhos, Consuelo Nasser. Lá por volta de 1958, também com a ajuda de Telmo Faria, lançou o combativo Cinco de Março, considerado, à época, um jornal popular e libertário. O primeiro, consta nos livros da história da imprensa brasileira, como o primeiro com este perfil, do Centro-Oeste. 

Combativo, usava as palavras como arma para apontar a opinião pública contra políticos. Por isso, foi preso algumas vezes. Antes e depois do golpe militar. Angariou ao longo da vida, amigos e inimigos. 

Há quem o admirava pelo modo que construía, à sua maneira, a história da imprensa goiana. Embora tivesse ganhado uma fortuna com auxílio do setor público e privado, vivia devendo o salário dos funcionários que, mesmo nesta sexta-feira, pareciam nem um pouco afeitos à pessoa do jornalista. Milhares de processos de pedidos de indenização, ou mesmo apenas o cumprimento da lei trabalhista, correm na justiça. 

De qualquer maneira, muitos que passaram pelas suas redações, em consenso, reconhecem o valor cultural de ter tido Batista Custódio como o patrão. Embora tenham tido de suportar o jeito duro, rude, e, por que não, indelicado, reconhecem o fator experiência. Afinal, Batista era visto como um dos últimos grandes jornalistas. 

Batista Custódio fez o que muita gente não poderia fazer mais: imprimia às páginas dos jornais que editou, coordenou, pautou o cotidiano da vida como ela era. Às vezes, de maneira fantasiosa. Mandava repórteres e fotógrafos atrás de ovnis, fantasmas, espíritos. Ele, inclusive, publicava cartas de quem já havia morrido, como do próprio filho, que cometera suicídio no auge da carreira como jornalista. Batista chegou a ser preso por crime de opinião nas décadas de 1960 e 1970, os anos de chumbo da ditadura militar no Brasil. 

Escultura de repórter, com caneta e bloco, fazendo anotações no jardim do antigo prédio do jornal Diário da Manhã

Batista Custódio, a entidade que formou jornalistas

Atualmente, uma multidão de jornalistas, dentro (ainda) e fora das redações, trabalhando em assessoria ou bem longe do jornalismo, entenderam, no cotidiano do trabalho com Batista Custódio, como era o ofício. 

Na memória, o jeito turrão, mas didático, de quem conviveu com algumas das estrelas do jornalismo brasileiro, que iam, de Washington Novaes, Aluísio Biondi Paulo Henrique Amorim. Sob a influência opinativa dos contemporâneos, decidiu colocar cores em todo o jornal, saindo na frente dos grandes. 

Mais tarde, diante da evolução tecnológica, online, decidiu colocar todo o seu conteúdo gratuito no endereço virtual do jornal. Sob o comando do seu filho, Júlio Nasser, promoveu a estruturação de um canal de TV via internet, onde transmitia jogos. 

Como diversos jornalistas ressaltaram, Batista não comandava apenas o Diário da Manhã na capital goiana, com tiragens que percorriam vários estados, mas mantinha o Diário da Manhã de Cuiabá e a Folha de Goiás, em Goiânia.

No auge do sucesso do conglomerado de imprensa, o grupo de Custódio também tinha emissoras de rádio e TV. Com tudo isso, atingiu o recorde de 5° maior tiragem do País. 

A Associação Goiana de Imprensa (AGI), entidade que Batista Custódio presidiu, pelas redes sociais, externou solidariedade à família. “Por seus conselheiros, associados e diretores, manifesta o seu profundo pesar diante do falecimento do jornalista que fez história na imprensa goiana e brasileira. Foi, sobretudo, um defensor da democracia e da liberdade”. 

O corpo do jornalista foi velado na sexta-feira no cemitério Jardim das Palmeiras e sepultado no sábado no Cemitério Santana.

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