“Previdência goiana é extremamente preocupante”

Economista compreende que cenário no Estado é crítico. Mudança deve ser proposta no próximo semestre.

Postado em: 20-07-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Economista compreende que cenário no Estado é crítico. Mudança deve ser proposta no próximo semestre.

Raphael Bezerra

Prestando consultoria à Secretaria de Estado da Economia desde março, o economista e doutor em Ciências Políticas, Paulo Tafner, falou com exclusividade ao O Hoje sobre a situação do modelo previdenciário de Goiás. Tafner, que é um dos maiores especialistas no assunto, prestou consultorias para o Governo Federal na elaboração de pesquisas e textos-bases para a reforma da Previdência.

Um texto sobre a previdência de Goiás pode ser apresentado já no próximo semestre, o especialista deve apresentar um balanço do modelo após o recesso parlamentar. O presidente da Assembleia Legislativa, Lissauer Vieira (PSB) sinaliza que o momento é oportuno para debater uma reforma. 

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 O senhor vem trabalhando junto à Secretaria de Estado da Economia do Estado de Goiás desde o começo do ano. Como foi essa aproximação com a secretária Cristiane Schmidt?

Efetivamente, estou mais diretamente envolvido na questão da previdência de Goiás desde março. A aproximação foi natural, de pessoas técnicas que tem preocupação com a questão fiscal do Brasil, dos estados e aí proeminência da previdência é muito grande e é nisso que estamos ainda estudando para ver as características da Previdência goiana.

Temos um sistema previdenciário com um déficit mensal que ultrapassa os R$ 200 milhões mensais. Diante do trabalho já levantado, qual avaliação você faz do regime próprio de Goiás? Na sua avaliação, o modelo é delicado?

O déficit previdenciário do regime próprio de Goiás está num patamar muito elevado. Ele está, representa uma suficiência financeira de aproximadamente de R$ 2,5 bilhões por ano, que dá R$ 200 milhões por mês e a tendência é crescer, uma vez que já vem crescendo ao longo dos anos, de modo que vai ele vai acabar consumindo toda receita líquida do estado, fazendo com que não haja disponibilidade de recurso para outras áreas, como educação, saúde e segurança. Então, a situação é delicada e merece cuidado e atenção.

A situação do Regime Próprio de Goiás já é preocupante ou ainda há fôlego fiscal para continuar sem uma reforma?

Obviamente que a saúde do sistema previdenciário goiano é extremamente delicada e preocupante. Não há espaço para qualquer demora, atraso e delonga para tomar providências. Então, é urgente e necessário que medidas sejam adotadas para conter essa trajetória do déficit. 

Onde o senhor considera o ponto mais delicado do Regime em Goiás?

Olha, não há um ponto específico de fragilidade no sistema. O que nós temos são várias inconsistências, vários defeitos, que somados resultam nesse déficit gigantesco de mais de R$ 200 milhões por mês. Obviamente pelas dimensões da força de trabalho, os maiores problemas estão concentrados na área de Segurança Pública e Educação, porque os quantitativos são muito grandes, então seriam as áreas mais preocupantes. Mas, todo o sistema está em desiquilíbrio.

A reforma da Previdência é necessária para se combater privilégios, o texto aprovado no Congresso, de fato, combate privilégios? Quais privilégios precisam ainda ser combatidos?

O texto da reforma da Previdência aprovado em primeiro turno na Câmara Federal semana passada é muito focado no combate a privilégios. E ele trata de forma bastante abrangente a questão de privilégios no âmbito do setor público. Mas, certamente não acaba com todos. O processo de terminar todos os privilégios é um processo longo, progressivo. Então, avançamos muito com essa reforma, mas há privilégios dentro do sistema previdenciário. 

A oposição criticou alguns pontos da reforma, principalmente para algumas categorias com a de professores, policiais militares e federais. Qual sua avaliação do texto aprovado para algumas dessas categorias?
Na verdade, a oposição não criticou esses pontos que você mencionou, pelo contrário, eles votaram a favor. Eles criticaram outros aspectos, que inclusive saíram do texto aprovado pela Câmara Federal. Porque é estranho que a oposição e os grupos mais corporativos lutaram juntos para manter privilégios de policiais e professores. Essa é a realidade.

O vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) afirmou, recentemente, que a reforma votada no Congresso é boa, mas poderia ser ótima. Na avaliação do senhor, qual versão de texto seria ótima?

Não acho adequado o uso de “ótimo” e “bom” para questões dessa natureza. Parece-me que a reforma foi boa. Ela ataca privilégios, ela corrige vários defeitos do sistema e aquilo que foi possível aprovar politicamente. De modo que no meu entender ela foi uma boa reforma. Poderia ser um pouco melhor? Sim, poderia. Mas, para tanto, talvez fossem necessárias outras condições políticas diferentes daquelas presentes atualmente no País. Então, em meu ponto de vista foi uma boa reforma. 

Nosso modelo de previdência é solidário. Isso, de alguma forma, desestimula o ingresso em regimes privados de previdência? 

Nosso sistema de fato é um sistema de repartição. Muitas vezes chamado de sistema de solidariedade geracional. Ele por si só não incide na não participação num sistema privado. No caso do modelo previdenciário brasileiro, ele de fato desestimula essa participação por outras razões porque ele tem regras tão generosas, que não estimulam uma boa parte da população para fazer poupança complementar. Então, que ele já tem uma alta reposição no seu valor de salário. Não é pelo fato de ser de repartição que abaixa o estímulo da previdência privada, mas é o fato de ter regras totalmente disfuncionais e particularmente generosas. 

Nossa cultura econômica também interfere na possibilidade de um regime de capitalização? E também no investimento em fundos previdenciários, como investimentos em bolsas de valores?

De fato, esse é um bom ponto, quer dizer, nós temos uma cultura de que cabe ao governo prover renda para todos quantos participam de sistema de previdência e para todos aqueles que quaisquer razões não contribuíram. Isso de fato desestimula a ideia de capitalização que está intrinsecamente ligada a poupança individual, um esforço de cada um de poupança. Mas lentamente isso está mudando e acho que vai mudar, de modo que nós vamos ter que revisitar o tema da capitalização no Brasil. 

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