Segunda-feira, 01 de julho de 2024

“Sem reforma, municípios podem ir à falência”

Entrevista com prefeito de Campos Verdes e presidente da Federação Goiana dos Municípios (FGM), Haroldo Naves (MDB).

Postado em: 24-07-2019 às 06h59
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: “Sem reforma, municípios podem ir à falência”
Entrevista com prefeito de Campos Verdes e presidente da Federação Goiana dos Municípios (FGM), Haroldo Naves (MDB).

Raphael Bezerra
e Rubens Salomão

Especial para O
Hoje

O prefeito de
Campos Verdes e presidente da Federação Goiana dos Municípios (FGM), Haroldo
Naves (MDB), expõe as dificuldades das prefeituras em atender serviços de
obrigação da União e dos governos estaduais que recaem sobre os prefeitos.
“Muitas vezes, o serviço que não é de responsabilidade da prefeitura, é feito pelo
prefeito pois o estado e a União são omissos e o cidadão está lá na porta da
casa do prefeito cobrando”, afirma.

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Naves explica
ainda que a reforma da Previdência pode economizar R$ 4 bilhões em 10 anos
somente nos municípios goianos, caso o projeto mantenha os estados e municípios
no texto. Ele alega que a exclusão dos entes federativos é um equívoco pois,
não há, nos municípios, disposição política e, principalmente, técnica para a
elaboração, apresentação e aprovação de uma reforma dessa magnitude.

Ao O Hoje, o
presidente falou da articulação que vem realizando em sua gestão para envolver
os prefeitos de Goiás, como o evento ‘Expo-municípios’, que promoverá
oportunidades de negócios para os gestores municipais.

Qual é, na realidade dos municípios
goianos, a importância de um evento como a expo-municípios?

Hoje a geração
de emprego e de renda é importante para todos os municípios do Estado de Goiás.
A expo-municípios conta com vários seminários e workshop além de 12 embaixadas
já confirmadas para que o prefeito, o secretário e o empreendedor de cada
município possa levar o seu produto para diversos países. Entendemos que em um
mundo globalizado precisamos encurtar distâncias e o nosso evento tem essa
missão além de poder qualificar sua equipe com as diversas palestras que serão
realizadas e a troca de experiências com outros gestores. Terão mais de 200
prefeitos e mais de 2,5 mil secretários participando da feira, além da
participação internacional e de empreendedores.

É uma oportunidade até mesmo de mercado?

A Federação tem
gasto e receita com a feira. É um evento para ajudar os municípios, pois nós
sabemos das dificuldades financeiras que os municípios têm vivido, colocamos
ingressos mais baratos. Isso é importante para levar o produto e apresentar a
Câmara Exterior de Comércio. Nós queremos levar esses produtos para fora do
Brasil, bem como eu estou fazendo no meu município. A exportação de pedras
preciosas em Campos Verdes estava paralisada e nesses dois anos e meio nós conseguimos
uma boa geração de empregos. Para que o prefeito e os empreendedores consigam
apresentar esses produtos e serviços em outros países há um custo muito grande
envolvido, então a feira é uma oportunidade para novos negócios.

Um estudo de 2017 do Conselho Nacional de
Comércio (CNC) mostrou que mais de 30 municípios goianos têm mais aposentados
do que servidores na ativa. De um modo geral, como está a previdência nos
municípios goianos?

Em Goiás, temos
170 municípios com o Regime Próprio de Previdência Social (RPRS). A retirada
dos estados e municípios da reforma da Previdência é um desastre total para os
entes federativos. Logicamente, há um componente político que precisamos
entender. Esse viés político que temos vivido nos últimos tempos e a
polarização não tem ninguém ganhador. Os governadores do Nordeste defendem a
reforma da Previdência em Brasília, mas quando chegam nos seus estados eles
atacam a reforma e os deputados ligados a esses governadores não apoiaram a reforma.
Por entender que haveria um desgaste, mas a população já entende que a reforma
é necessária e não é por viés ideológico, mas sim algo necessário.

Estamos
articulando no Senado Federal, conversando com os três senadores goianos e com
as diversas lideranças no Congresso e eles têm se comprometido em recolocar os
estados e municípios em dois parágrafos separados, pois entendemos que há um
sentimento no Congresso de que os municípios serão os mais prejudicados sem
essa reforma.

Para os próximos
10 anos, a reforma da Previdência pode gerar para os 170 municípios que contam
com o Regime Próprio de Previdência Social mais de R$ 4 bilhões [de economia].
Tirar os municípios do Brasil é levar a falência para a maioria desses
municípios.

Se sair no Congresso um entendimento de que
os estados e municípios precisem se adequar com legislação própria após da
aprovação do texto, qual a realidade política para isso acontecer, tendo em
vista as eleições de 2020?

Para os
municípios, devido a aproximação do processo eleitoral, os prefeitos terão mais
dificuldades para encaminhar um projeto dessa magnitude para as Câmaras, seja o
prefeito que visa buscar uma reeleição ou aquele que está em final de mandato.
Os governadores, como estão em início de mandato, talvez tenham mais
facilidade. Todas as reformas estruturantes se fazem no começo do mandato, quando
se tem o capital político das eleições. Imagina mandar 5.568 projetos de lei
para as Câmaras Municipais tendo em vista cada realidade, interesses de
oposição que visam ganhar as eleições e se utilizam de mentiras para travar o
debate sério.

Não é uma contradição da parte do senhor
quando fala da reforma no Congresso, pois os deputados não estão querendo
assumir o desgaste, mas ao mesmo tempo você diz que a população entende que é
uma mudança necessária?

Na verdade, o
Brasil tinha, há um ano, 70% da população contra a reforma da Previdência. Hoje
nós temos mais de 50% da população que entende a necessidade. No meu município,
se houver a necessidade, não tenho dúvidas que será aprovado. Mas estamos
falando de inúmeros prefeitos que podem não querer assumir esse desgaste no fim
do seu mandato. O governo teve uma competência melhor de mostrar a realidade da
Previdência. Sem a reforma da Previdência o Brasil não vai voltar a crescer,
estamos prevendo um crescimento aí de 0,82% que é um desastre para o Brasil.

Parte dessa dificuldade em aprovar uma
reforma nos municípios vem também da questão técnica ou é apenas da política?

Quando eu falei
que teriam que ser apresentados 5.608 projetos para reformas do RPPS nas
Câmaras Municipais pelo Brasil, nós temos dificuldades, principalmente, com os
pequenos municípios com a questão técnica. No meu município, por exemplo, o salário
de secretário é de R$ 2,5 mil e é uma realidade da maioria dos pequenos
municípios. Você contratar uma equipe de consultoria, os números e dados
técnicos, não somente de assessoria jurídica, mas também financeira, é algo
muito custoso e trabalhoso. O Governo Federal dispõe de uma estrutura e de um
projeto que vem de vários governos, pois ela vem sendo discutida desde o
governo de Fernando Henrique Cardoso. O município terá que fazer a sua própria
lei e não poderá copiar uma lei federal ou do estado. Em Goiânia, o secretário
conseguiu montar uma equipe técnica qualificada. Um município de 5 mil
habitantes vai conseguir? Ele vai ter uma dificuldade de elaborar e apresentar
o projeto e o mais importante, aprovar o projeto. E ainda pode ter
questionamento jurídico dos servidores que terão seus interesses mexidos.

Uma das pautas de Jair Bolsonaro (PSL) é justamente
o pacto federativo. Porque essa pauta é importante para os municípios?

No Brasil com a
Constituição de 88, que era para ser uma constituição municipalista, ela trouxe
uma série de obrigações para os municípios, mas não o necessário para a
contrapartida. Para se ter uma ideia, em 2001 o Governo Federal criou o
Programa dos Postos de Saúde da Família (PSF). Para municípios com até 10 mil
habitantes, o governo colocava R$ 10 mil, municípios com 20 mil habitantes, era
depositado R$ 7 mil e a contrapartida nossa para contratar uma enfermeira, um
médico e um auxiliar era de R$ 7 mil. Passados 7 anos, o Governo Federal
deposita a mesma quantidade enquanto as prefeituras dão em contrapartida R$ 40
mil reais. Ou seja, estamos bancando um programa quase na integralidade.

A contrapartida
do Estado, da gestão anterior, está com 13 parcelas atrasadas, isso somente na
saúde. Na educação, com o transporte escolar nós temos outras quatro parcelas
atrasadas que estão sendo negociadas.

O pacto federativo era uma expectativa no
começo do ano, depois de algum tempo passou a ser uma conversa, mas agora
parece ser uma frustração. Ainda há esperança quanto ao pacto?

Nós ainda temos
esperanças que o pacto federativo vai sair, mas, não nos iludimos achando que
isso vai acontecer nos próximos seis meses nem em um ano. Até porque, no
Brasil, para se fazer uma reforma Tributária e de receita, você tem que mudar
alguns sistemas. A conta do Governo Federal não está fechando, tivemos um
contingenciamento de R$ 1,4 bilhão, mais a verba retirada do fundo soberano
para o Governo fechar as contas om R$ 139 bilhões de déficit.

Se houver um
cronograma para se fazer essa mudança paulatinamente, de forma escalonada, vai
ser uma conquista que você começa agora como a cessão onerosa do pré-sal. 

A nossa luta é na Câmara Federal, no Senado, nas
Assembleias Legislativas, nas Câmaras Municipais e no Supremo Tribunal Federal
para brigar, todos os dias, para evitar pautas que prejudiquem os municípios.
Muitas vezes, o serviço que não é de responsabilidade da prefeitura, é feito
pelo prefeito pois o estado e a união são omissos e o cidadão está lá na porta
da casa do prefeito cobrando. 

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