Hanseníase retrai em Goiás

O Estado está em uma das regiões com mais ocorrência do país. Médicos não conseguem explicar o fato

Postado em: 19-07-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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O Estado está em uma das regiões com mais ocorrência do país. Médicos não conseguem explicar o fato

Igor Caldas

Especial para O Hoje

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A hanseníase é uma das doenças mais antigas do planeta. Mesmo acometendo a humanidade há muito tempo, ela ainda não foi erradicada. De acordo com os últimos dados do Ministério da Saúde, o Centro-Oeste é a segunda região onde há mais casos da doença, ficando atrás apenas da região Nordeste. Este ano foi registrado 2.713 casos no Centro-Oeste.

Apesar dos índices serem altos, quando comparado com outros estados, em Goiás, os números de casos tem caído nos últimos anos. De 2015 até 2018, houve diminuição de 71% dos casos. De acordo com dados do Ministério da Saúde, foram registrados 557 casos de hanseníase no Estado no último ano.     

A Diretora Técnica do Hospital Estadual de Dermatologia Sanitária e Reabilitação, Mônica Ribeiro Costa, explica que antigamente a gravidade da doença era maior porque o tratamento era escasso. Hoje, tanto o diagnóstico como o tratamento são muito simples e por isso tudo é feito pelo Atendimento Básico do Sistema Único de Saúde (SUS) por meio do atendimento em Postos de Saúde.

Cláudio Bueno foi diagnosticado com a doença na década de 1980, quando o tratamento ainda era mais difícil. Ele não tem mais a doença, mas ficou com sequelas. A médica explica que apesar de ser uma doença de pele, a hanseníase pode atingir regiões neurais, principalmente nas extremidades. Isso pode causar perda da mobilidade, dores nos pés e fraqueza nas articulações. Cláudio só consegue andar com ajuda de muletas.

“Esse tipo de sequela é mais comum em pacientes que foram diagnosticados nos tempos em que a doença era mais difícil de ser tratada”, explica a médica. Ela ainda afirma que se não for tratada, a hanseníase pode causar feridas, problemas nas pálpebras e danos neurais nos dedos, pernas e pés.  Dos casos registrados em 2018, 199 pacientes ficaram com cinco ou menos nervos afetados.  Em 11 casos ocorreram danos em mais de cinco nervos do paciente.

De acordo com o site do Ministério da Saúde, a cura por meio do tratamento é gratuita, e feito por via oral, com uma associação de três antibióticos. Os medicamentos são seguros e eficazes e o paciente deve tomar a primeira dose mensal supervisionada pelo profissional de saúde. As demais, são autoadministradas. Ainda no início do tratamento, a doença deixa de ser transmitida.

Diagnóstico precoce

“Hoje o diagnóstico precoce da doença é feito de forma fácil e a doença é tratada com medicamentos ingeridos por via oral. A cartela de remédios é fornecida ao paciente logo após o diagnóstico no Posto de Saúde”. A médica ainda afirma que não há estudos aprofundados sobre o porquê de haver mais casos nessas regiões do Brasil, mas acredita que uma parte desse problema pode estar associado a falta de atenção básica na saúde.

“Falta uma infraestrutura mais focada na atenção básica de saúde que pense no diagnóstico e que acompanhe o tratamento. Como são tratamentos longos, muitas vezes o paciente para de tomar o remédio quando percebe uma melhora. Embora a transmissão não seja tão fácil quanto se pense, para as pessoas que convivem junto há um risco maior”. Ela afirma que além do diagnóstico do paciente tem que haver o acompanhamento das pessoas que convivem com ele. 

Falta de infraestrutura compromete antiga Colônia 

Ao lado do Hospital Estadual de Dermatologia Sanitária e Reabilitação (antigo Hospital Santa Marta), próximo a rodovia GO-403, fica o residencial de mesmo nome anterior da Unidade de Saúde. O local era conhecido por ser a antiga colônia que abrigava pessoas diagnosticadas com hanseníase e tinham tratamento especializado na unidade de saúde. Hoje, o bairro ainda abriga as vítimas e gerações de família que foram impactados pela doença.

O aposentado Cláudio Bueno veio para a antiga Colônia quando ainda era um lugar estigmatizado pelo preconceito. Mesmo com a diminuição desse estigma, Claudio afirma que o preconceito ainda existe. “O povo fala que não existe mais preconceito por causa do avanço no tratamento, mas existe sim. Dá para sentir principalmente pelo abandono dos serviços básicos para esse bairro”. Ele ainda afirma que a composição dos moradores do setor mudou muito nos últimos anos com o crescimento do bairro.

Mesmo quando o lugar era alvo de preconceito, Cláudio sente saudades da assistência de saúde que a condição de Colônia proporcionava. “Acabou qualquer ajuda que nós tínhamos aqui. Antes a gente tinha uma médica que vinha dar atenção para a gente, hoje ela foi embora. O setor ficou desassistido, não tem policiamento e está cada vez mais inseguro”, lamenta o aposentado. As sequelas de Cláudio fizeram com que ele perdesse parte da mobilidade dos pés.

O vizinho e amigo de Cláudio, Edimilson de José das Neves, também é um ex-integrante da Colônia Santa Marta, hoje morador do bairro. Ele relata que mesmo depois que o bairro deixou de ser Colônia e outros moradores começaram a entrar, uma médica dava assistência gratuita para a comunidade. “Vinha uma médica aqui muito boa que ajudava a gente, mas ela foi embora porque a insegurança estava grande demais. Ela ficou com medo de vir depois que arrombaram o carro dela para roubar as coisas”.

Edimilson relata os problemas que a maior parte dos bairros afastados das zonas centrais possuem. “Aqui não tem nada. Ônibus é difícil demais, posto de saúde não tem, polícia está em falta. A gente acaba tendo que se virar para fazer as coisas. Muita gente que vai tentar se consultar no Hospital precisa passar por processos que antes não eram necessários”.

Apesar de morarem ao lado de um Hospital Dermatológico com várias modalidades de profissionais da Saúde, a doença não pode ser tratada na Unidade de Saúde. Como a diretora-técnica do HDS explicou, a doença só tem tratamento nas unidades básicas de saúde do SUS. No entanto, ela afirma que ainda trata as sequelas da hanseníase deixadas nos moradores do Residencial Santa Marta. Segundo a médica, há 18 pacientes cadastrados no HDS nessas condições.

 

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