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quinta-feira, 26 de dezembro de 2024
Sétima arte

“Eu uso o cinema como arma”

JÚNIOR BUENO O expresso Princesa do Agreste também era conhecido como “tristeza do Agreste”, quando Ângelo Lima fugiu de casa, sem lenço e sem documento, como na canção de Caetano. “Em vários pontos da estrada, militares paravam os carros e ônibus, à procura de subversivos,” ele se lembra. Ângelo tinha 16 anos e foi parar […]

Postado em 3 de abril de 2016 por Sheyla Sousa
“Eu uso o cinema como arma”

JÚNIOR BUENO

O expresso Princesa do Agreste também era conhecido como “tristeza do Agreste”, quando Ângelo Lima fugiu de casa, sem lenço e sem documento, como na canção de Caetano. “Em vários pontos da estrada, militares paravam os carros e ônibus, à procura de subversivos,” ele se lembra. Ângelo tinha 16 anos e foi parar em Campina Grande, na Paraíba, em 1969, no auge da ditadura militar. Ele já havia sido preso pelo regime. Foi também aos 16 que o pernambucano que vivia em Goiânia realizou o primeiro curta-metragem.

Desde então, ele trabalhou em circo e teatro, e em 1999 ele voltou a dirigir curtas-metragens. E não parou mais. Já são quatro longas-metragens e 28 curtas, numa carreira que soma 40 prêmios em participações em mais de 280 festivais em todo o mundo. Sua obra se destaca pela produção de documentários.  E hoje à noite ele lança seu primeiro curta de ficção, Nódoas, baseado em um conto de Valdivino Brás, que trata da solidão de um torturador do período militar. O filme foi gravado em Pirenópolis e tem os atores Alex Amaral e Itamar Gonçalves no elenco.

O fato de um filme sobre a ditadura militar ser produzido em plenos caos político bra­sileiro, quando um golpe pode obstruir os caminhos democráticos, para Ângelo é, de certa forma, simbólico. “Nós estamos à beira de um golpe branco,” diz o diretor. “A caça às bruxas está aí,” ele opina, “é temeroso até torcer pelo Vila Nova, sair de vermelho na rua.” 

Mas ele acredita que os tempos atuais são diferentes dos de 1964, quando foi instaurado o golpe militar no Brasil: “Hoje em dia é a briga pelo poder e pelo dinheiro.” Mas o cineasta presume que os tempos atuais podem apontar para um futuro sombrio. “O fascismo é fascinante, mas é perigosíssimo. A qualquer momento podemos regredir 100 anos,” diz. Ângelo diz que sua obra é uma forma de posicionamento político em relação ao mundo. “Eu uso o cinema como arma, dando voz e espaço a quem não tem, falando sobre o que ninguém quer falar.”

Entre seus documentários, existem dois trabalhos sobre o acidente com o Césio 137 em Goiânia em 1987; outro fala sobre pessoas que sofreram exílio e perseguição política em Goiás nos anos 60 e 70. Um de seus documentários mais recentes, A Próxima Mordida, é sobre os ataques de tubarões em Recife, Pernambuco. E há alguns que falam sobre festas populares no interior do País.

Dois deles terão exibição hoje à noite, junto com o lançamento de Nódoas. Hoje a Mangueira Entra, é sobre o bloco de Carnaval homônimo, em Olinda. “No Carnaval, os homens saíam e só voltavam quatro dias depois e as mulheres ficavam em casa. Até que elas resolveram montar um bloco em resposta, onde pudessem sair e aprontar também. Esse filme é sobre isso,” explica Ângelo.

O outro, Baque Duro em Buenos Aires é sobre um bloco de Maracatu que se prepara para reinar durante o Carnaval na cidade do interior do Pernambuco, que tem o mesmo nome da capital argentina. “É uma sacada, porque as pessoas pensam que vão ver algo sobre o tango e acabam descobrindo uma manifestação riquíssima de maracatu nordestino. Meus títulos sempre têm boas sacadas.”

O diretor realizou Nódoas com recursos de leis de incentivo, como a Lei Goyazes, mas também costuma realizar seus filmes de maneira independente. “As leis são importantes, mas o artista tem mais é que fazer. Na tora!”, diz ele. Mas ele acredita que para o cineasta, os projetos, não só de incentivo à produção, mas também de exibição do cinema goiano devem ser levados mais a sério. “O filme não é feito para a vaidade do diretor, é feito para ser visto pelo maior número de pessoas possível. Então as escolas podem adotar essas produções, porque elas dialogam com a História. Quer saber sobre Ditadura? Tem um filme meu sobre isso.. Quer uma aula sobre as Congadas? Também tem… É uma forma de devolver ao cineasta o trabalho que ele realizou.”

SERVIÇO

Lançamento de Nódoas

Data e horário: Hoje, às 20h

Local: Cine Cultura, Praça Cívica

Entrada franca 

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