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segunda-feira, 25 de novembro de 2024
Aperfeiçoamento

Modernização do caipira: o que mudou na música sertaneja ao longo dos anos

Dia do Sertanejo é comemorado neste domingo, 3 de maio, o estilo passou por grandes mudanças durantes os anos| Foto: Divulgação

Postado em 3 de maio de 2020 por Redação
Modernização do caipira: o que mudou na música sertaneja ao longo dos anos
Dia do Sertanejo é comemorado neste domingo

Lanna Duarte*

Totalmente brasileiro, o sertanejo trouxe toda a melancolia das histórias vividas por quem ocupava os campos do interior do País, em 1929, quando o pesquisador, compositor, escritor e humorista, Cornélio Pires, decidiu espalhar os costumes caipiras em forma de música e encenações teatrais. A música que então se denominava caipira, não imaginava no que o sertanejo se transformaria. Hoje uma das indústrias que mais arrecada, o sertanejo é uma potência da economia brasileira, girando milhões de reais por ano. O cantor e compositor Franco Levine diz ao Essência que a música sertaneja passou por transformações inerentes a sociedade. “A globalização, trouxe consigo a modernidade, e com isso também inovações sonoras, harmônicas, e consequentemente, as letras acompanham as mudanças de comportamento, de posicionamento, de linguagem. Acho interessante essas mudanças, mas nunca esquecendo as raízes. O passado sempre tem algo a acrescentar no futuro”.

Tonico e Tinoco, Marciano e Caçula, dentre outros, cantavam nesses primórdios do sertanejo caipira, uma letra carregada do sofrimento vivido pelas pessoas que moravam no campo e uma melodia simples. Outra característica da música caipira são os instrumentos artesanais como a viola, acordeão e a gaita. Hoje, os grandes sucessos já não são embalados pelos mesmos temas, de acordo com o produtor musical Geovani Fernandes, a música está em constante mudança. “Essa história de que a música está estagnada não existe, a música está sempre mudando. Eu acho é que hoje a música, de uma maneira geral, está mais difícil de ser feita. O sertanejo já explorou todos os estilos e está ficando sem saída”.

O produtor Geovani Fernandes, nome respeitado dentro do mercado do sertanejo, começou a se interessar por música desde muito novo, com o sonho de tocar rock. Em entrevista ao Essência ele conta que ao lado de seu amigo Guilherme Bicalho decidiu abrir o estúdio e logo no começo, produziram artistas que deram visibilidade para o trabalho que eles estavam desenvolvendo. “Já trabalhamos com muitos artistas como Jorge e Mateus, Chico Rey e Paraná e Gusttavo Lima, mas o começo foi com PO Box, com a música ‘Papo de Jacaré’, que fez grande sucesso na época, Henrique e Hernani, Marcos e Fernando e a banda Nechivile”.

Os produtores Geovani e Guilherme, além de todos esses nomes, foram responsáveis por inserir no sertanejo o cantor e compositor Franco Levine, nome apreciado pelo mundo da música. “Eles me convidaram pra participar do projeto ‘Luau Sertanejo’ com a dupla Henrique e Hernani, cantando uma composição de minha autoria, ‘Por Ti’. O timbre diferente, somado com as vozes da dupla e aliado a qualidade da canção, gerou um choque no mercado, e foi um grande sucesso. Ela é uma canção que já teve inúmeras regravações, inclusive recentemente, regravada por Bruno e Marrone, no último DVD da dupla”, relembra Franco. Ele ainda diz que cantar e compor, para ele, sempre andou junto. “Uma coisa completa a outra, o processo de criação é algo que tem uma magia que só a música proporciona, é muito gratificante ver as ideias ganhando forma, e em seguida ganhando o mundo”.

O cantor que já teve três músicas em novelas e gravadas por grandes nomes, como Bruno e Marrone, Henrique e Juliano, João Neto e Frederico, Cristiano Araújo, Rick e Renner, entre outros, relata que logo trará para o público um projeto novo. “Logo mais volto com um projeto acústico, com releituras de canções minhas e de Clássicos nacionais e internacionais e um projeto pra muito breve, logo poderei falar mais sobre ele”.

Após 30 anos de vários sucessos, a música sertaneja se modernizou, acrescentou às modas de viola os metais e um compasso mais acelerado. Irmãs Galvão e Sérgio Reis fizeram parte desse movimento de inovação na música brasileira. Mas foi com a dupla Milionário e José Rico, nos anos 70, que a música sertaneja realmente saiu dos campos e foi para as rádios FMs. Eles introduziram nos seus arranjos elementos da tradição mexicana, o Mariachi, com floreios de violino e trompete. Eles que hoje, voltaram a embalar as festas sertanejas, os jovens começaram a conhecer o que o sertanejo já foi. Até os cantores da atualidade, incorporaram músicas dessa época em seus repertórios.

A partir desse momento, o sertanejo raiz alcançou o horário nobre das tvs e virou trilha sonora de novelas. Já em 1980, houve uma grande exploração comercial da música sertaneja no Brasil, começando com Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo, Zezé de Camargo & Luciano, Chrystian & Ralf e outras diversas duplas que surgiram e tiveram seu auge entre os anos de 1988 e 1990. Isso desencadeou o surgimento de outro estilo dentro da música sertaneja, o romântico. 

O sertanejo romântico veio com uma proposta de falar de amor, incorporando arranjos instrumentais mais complexos, como de orquestras. Grandes referências dessa época, são as músicas ‘Fio de Cabelo’ e ‘Evidências’, ovacionada em todos os cantos do Brasil. Mas logo depois disso, o estilo perdeu força para outros ritmos que ganharam espaço. E foi em 2001 que novamente o sertanejo ressurgiu nas vozes das duplas Bruno e Marrone, Gian e Giovani, Rick e Renner e Edson e Hudson.

Sertanejo hoje

Enfim o sertanejo como se conhece hoje, denominado universitário. Duplas como Jorge e Mateus, João Neto e Frederico e a banda Nechivile foram os que surgiram com essa nova tendência na música brasileira. O produtor Geovani relembra como foi a experiência de participar dessa reinvenção na música. “Na época a gente não sabia direito o que estávamos fazendo, mas sempre foi uma característica minha e do Guilherme, querer fazer algo diferente. Não sabíamos ainda as proporções que isso tomaria. Depois que as coisas foram acontecendo, que percebemos as mudanças. Depois que gravamos uma sequência de discos, todos os outros tinham os mesmos solos de violão”.

Ele explica como surgiu a ideia de incorporar novas melodias ao sertanejo romântico. “A gente ouvia muito Zezé de Camargo & Luciano, e o produtor deles usava muitas guitarras que gostávamos, mas elas as vezes me cansavam um pouco. Foi quando entrei no estúdio e decidi fazer arranjos com o violão, mas com uma pegada rock and roll. Uma das minhas referências era o guitarrista Joe Satriani, ele usa melodias simples e diretas. E eu queria fazer isso na música sertaneja, eu queria tocar e que as pessoas entendessem”.

Ele aponta que a primeira oportunidade que teve de empregar esses arranjos com solos de violão foi com a dupla Marcos e Fernando, e logo veio a oportunidade de produzir a banda Nechivile e a dupla João Neto e Frederico que foi um sucesso estrondoso. “Quando já tinha feito algumas músicas com a Nechivile nessa pegada, algumas pessoas torceram o nariz, e uma pessoa me disse que eu estava completamente louco de fazer o que ninguém estava fazendo no mercado da época. Quando ele me falou isso eu comecei a acreditar na minha ideia, e apesar de estar fora da moda, eu me sentia bem quando ouvia as músicas”.

Outro movimento que revolucionou o sertanejo atual, foi a evidência das mulheres como protagonistas. Marília Mendonça e Maiara e Maraisa já eram compositoras de grandes sucessos cantados por homens. E desde alguns anos elas se apropriaram das suas letras e resolveram cantá-las. Temas como traições e bebedeiras são eixos dos sucessos das cantoras que tem companhia nessa luta de Simone e Simaria, Lauana Prado, Yasmin Santos, Nayara Azevedo, dentre outras.

O momento que o mundo vive, com a indústria da música parada, as lives sertanejas tomaram conta das casas dos fãs de duplas como Zé Neto e Cristiano, Henrique e Juliano, Matheus e Kauan, entre outros. De acordo do Geovani, essa iniciativa, além de ajudar a comunidade, é válida para que o mercado não esfrie, e como citou acima, o sertanejo está em constante mudança e é o ritmo que mais se adapta as adversidades. Isso nada mais é que o sertanejo se reinventando mais uma vez.

Os artistas

A música sertaneja evoluiu, se tornou a maior fatia do bolo do mercado da música no Brasil e os cantores se tornaram verdadeiras personalidades. Com grandes festivais como Villa Mix e Caldas Country, os cantores se viram com a necessidade de grandes produções e de se preocupar com sua imagem. De acordo com a consultora de imagem e visagista Maris Tavares essa mudança de estilo foi natural, porque evoluiu conforme o cotidiano e vivência dos cantores. Eles se tornaram formadores de opinião, ditadores de tendências e muitas vezes inspiração.

Maris explica que a imagem do cantor sertanejo vem evoluindo conforme a evolução da música e da realidade em que estão inseridos. “Na época do sertanejo caipira, a gente se depara com uma música bem rural, onde as pessoas iam pra roça e precisavam de roupas resistentes para aguentar a lida, é onde entra os tecidos grossos. Peças icônicas como o jeans e o couro ainda permanecem no nosso cotidiano. Hoje o sertanejo universitário não está na roça mais, então teve uma evolução natural. Eles estão nas boates, nas Ferraris e os mais bem sucedidos tem até seus próprios aviões. Como mudaram de estilo de vida, consequentemente, mudou-se de vestimentas também. Não faz sentido usar peças que não fazem parte do seu cotidiano”.

Maris foi consultora do cantor Cristiano Araújo, e depois disso teve como clientes dentro do sertanejo, Cesar Menotti e Fabiano, Lucas Lucco, Felipe Araújo, dentre vários do meio. Ela acredita que o seu trabalho com os cantores sertanejos é reforçar a personalidade dos cantores. “Hoje, com os meus clientes, eu busco muito por autenticidade, porque estamos na era da personalização. Busco peças pra compor uma produção que tenha um registro da identidade visual de cada um. Que as pessoas vejam uma peça, e imediatamente, liguem ao meu cliente”. Ela finaliza dizendo que não haver cópias, que a imagem tem que ter uma conexão com que o artista realmente seja. (*Lanna Duarte é estagiária do jornal O Hoje, sob orientação do editor Lucas de Godoi)

 

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