Caiado adota estratégia do silêncio em colapso iminente
A ausência do democrata é proposital, calculada e acertada | Foto: reprodução
Rubens Salomão
Não apenas o cancelamento da agenda pública e tratamento de saúde, diante de conhecida infecção urinária, deixaram o governador Ronaldo Caiado (DEM) fora do debate com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nesta e nas últimas semanas. A ausência do democrata é proposital, calculada e acertada. “Para ser da base não precisa comungar com tudo ipsis litteris”, definiu o senador Vanderlan Cardoso (PSD) em conversa com este articulista nesta semana. A definição se encaixa na situação de constrangimento de Caiado e aliados centristas diante dos impropérios do presidente.
Com urgente interesse em atendimentos efetivos ao estado de Goiás pelo governo federal, muito além dos R$ 27,1 bilhões de 2020 – 98% deles referentes a repasses constitucionais e obrigatórios, Caiado adota estratégia do silêncio diante de novos rompantes negacionistas de Bolsonaro e evita, acertadamente, entrar em embate direto. O único momento de manifestação se restringiu à assinatura em carta apoiada por outros 18 governadores, no início da semana, em que os gestores estaduais rebateram publicações falsas sobre transferências de recursos da União.
Depois da assinatura e antes do afastamento por questão de Saúde, o governador voltou a medir distância quilométrica do presidente, ao menos quando o assunto é a pandemia. Questionado sobre as divergências, Caiado adiantava que o “último espaço que cabe a este assunto é o da polêmica” e que é preciso “usar todas as forças para convergir num objetivo só, que é salvar vidas”. Como médico, dizia que “não existe nada que não pode confrontar a ciência, com as pessoas diminuindo a sua capacidade de se descolar, não se aglomerarem, usarem as máscaras e fazerem a higienização das mãos. Isso é universal. Não há quem possa contestar e, se contesta, não tem fundamento científico”.
Se não há consideração no Palácio da Alvorada às conclusões da ciência para o combate ao vírus, deveria haver ao menos com relação à referência em questões econômicas? Nem isso. No mesmo dia em Bolsonaro chamou de “burra” a política de fechamento de atividades econômicas para reduzir a disseminação do vírus, por prejudicar os setores produtivos, o ministro da Economia, Paulo Guedes, apontou que a prioridade deve ser a saúde para, assim, encontrar a retomada financeira o mais cedo possível. “Nós precisamos de saúde, emprego e renda. Primeiro a saúde. Sem saúde, não há economia”, afirmou em vídeo postado pelo próprio ministério.
A estratégia
Não se pode, no entanto, considerar afoitamente que a agressividade de Bolsonaro seja injustificada ou apenas explicada por um suposto perfil beligerante próprio dele. O retorno dos gritos e ataques a prefeitos, governadores e, claro, contra a mídia, é parte fundamental da estratégia de manter o clima de confronto e a existência de um inimigo. Isso motiva e mantém coesa a base bolsonarista. E esta estratégia, até agora, tem sido bem sucedida. A prioridade é manter a fidelidade do terço conservador e o diálogo com a parte média na polarização política, com foco na reeleição em 2022. Neste sentido, não fará diferença a quantidade de leitos ou de mortos, mas sim a manutenção da fúnebre guerra de narrativas.