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domingo, 24 de novembro de 2024
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Coluna econômica

Alta dos juros pode gerar gasto inútil de quase R$ 46,2 bilhões

Confira a coluna Econômica, por Lauro Veiga, deste fim de semana (20 e 21/3) | Foto: Reprodução

Postado em 20 de março de 2021 por Sheyla Sousa
Superávit primário do Estado cresce 25
Confira a coluna Econômica

Lauro Veiga 

Se
confirmada a intenção antecipada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) de
referendar uma segunda rodada de alta nos juros básicos, em percentual idêntico
ao aplicado desde quarta-feira, 17, a taxa terá experimentado elevação de 1,50
pontos de porcentagem até o começo de maio, atingindo 3,50% ao ano, conforme já
detalhado neste espaço. Evidentemente, não estão descartadas novas correções
mais adiante. Até aqui, no entanto, são essas as indicações deixadas claras no
comunicado distribuído pelo comitê ao concluir sua 237ª reunião.

Em
sua trajetória de médio prazo, os juros básicos haviam subido de 13,75% para
14,25% a partir de 29 de julho de 2015, quase seis anos atrás, mantendo-se
naqueles níveis por pouco mais de um ano, até 19 de outubro de 2016, quando
iniciou a série de cortes que derrubariam a taxa para 4,50% em dezembro de
2019. Em 6 de agosto do ano passado, com a pandemia em pleno curso e a inflação
muito abaixo do centro da meta, os juros básicos finalmente caíram para os 2,0%
que, no entanto, vigoraram por menos de 12 meses – mais precisamente, sete
meses e 11 dias.

Ao
final de cada reunião, realizadas ao longo de dois dias em sequência, o Copom
sempre divulga um comunicado aos mercados, explicando os fatores e as razões
levadas em consideração ao tomar suas decisões (ou, simplesmente, ao não tomar
decisão alguma). O que esses comunicados jamais deixam transparente é que
medidas de política monetária (no caso atual, o aumento dos juros) sempre
embutem custos a serem cobertos por toda a população.

Não
apenas porque o crédito tenderá a ficar mais caro. Mas também porque o governo
terá que pagar juros mais altos para renovar sua dívida no mercado e ao vender
novos títulos, o que tem efeito sobre as contas do setor público ao gerar
despesas crescentes e mais déficits. Obviamente, quando as taxas são reduzidas,
os impactos ganham sinais invertidos, a começar pelo barateamento do crédito,
combinado com uma redução das pressões sobre as despesas gerais e, portanto,
sobre os níveis de endividamento do setor público.

A conta
“esquecida”

Em
janeiro deste ano, a chamada “taxa Selic” corrigia perto de 46,2% da dívida
bruta do governo geral (conceito que inclui as administrações estaduais, municipais
e federal, assim como os regimes de Previdência administrados por eles). Ou
seja, toda essa parcela da dívida estava sujeita às variações dos juros básicos
definidos pelo BC. Diante de um saldo total de R$ 6,670 trilhões, valor da
dívida bruta, perto de R$ 3,079 trilhões estavam representados por títulos remunerados
pela taxa básica de juros. Uma alta de 1,5 pontode porcentagem naqueles juros
representaria, numa estimativa preliminar, um gasto adicional de pelo menos R$
46,2 bilhões ao ano, um pouco mais do que os R$ 44,0 bilhões que a equipe
econômica se dispôs a gastar com o auxílio emergencial.Essa despesa extra,
gerada pela elevação dos juros, mas nunca levada em conta nas escolhas de
política econômica feitas pelo governo, todos os demais indicadores constantes
(como gostam de dizer os economistas), produziria uma elevação de 4,5% no
déficit nominal (diferença entre receitas e despesas do governo geral,
incluindo gastos com juros). Para registro, o rombo nominal acumulado em 12
meses até janeiro deste ano já somava R$ 1,017 trilhão, algo como 13,7% do
Produto Interno Bruto (PIB).

Balanço

Entre
janeiro de 2020 e o primeiro mês deste ano, o saldo da dívida bruta do governo
geral cresceu 20,2% aproximadamente, saindo de R$ 5,550 trilhões para R$ 6,670
trilhões (89,7% do PIB), o que significou um acréscimo de quase R$ 1,120
trilhão no período. O estoque da dívida amarrado aos juros básicos, por sua
vez, cresceu bem menos, variando 12,9% e avançando de R$ 2,727 trilhões para R$
3,079 trilhões (R$ 352,8 bilhões a mais, numa contribuição de 31,5% para o
crescimento da dívida total).

Mesmo
diante de todo esse aumento em sua dívida, o setor público brasileiro havia
gasto muito menos com os juros, porque a taxa básica encontrava-se em níveis
muito baixos. Considerando períodos de 12 meses, os
gastos acumulados com juros baixaram 14,9% no total, saindo de R$ 407,729
bilhões até janeiro do ano passado para R$ 347,024 bilhões nos 12 meses
terminados em janeiro deste ano (R$ 60,705 bilhões a menos).

Os
gastos com juros gerados pela dívida amarrada à Selic caíram pela metade
naquele mesmo período, de R$ 150,821 bilhões para R$ 75,284 bilhões, ou seja,
50,1% a menos (redução de R$ 75,537 bilhões). Isso mostra que toda a queda
nesse tipo de gasto veio da dívida corrigida pelos juros básicos, que agora
voltam a subir, gerando novas pressões sobre as contas públicas.

Esse
processo de baixa nos gastos com juros encerrou-se agora e a despesa deverá
voltar a crescer daqui para frente, numa tendência a ser acelerada a partir de
maio, o que fará com que a dívida pública cresça ainda mais diante dos cenários
à frente. A piora dramática da pandemia em todos dos Estados certamente terá
efeitos negativos sobre a atividade econômica, atingindo as receitas de
impostos e contribuições num momento em que as despesas continuarão
pressionadas pela necessidade de socorrer famílias miseráveis e pequenos e
médios empresários. Essa combinação nefasta de fatores já faria o déficit
público crescer, tendência a ser potencializada pela alta dos juros.

Num
exercício teórico, incluindo na conta os efeitos projetados para os 12 meses
seguintes da próxima alta dos juros, em maio, apenas com os dois aumentos (um
já realizado e o outro ainda previsto), os gastos nesta área subiriam 61,4%
quando se considera apenas o estoque da dívida sujeita às variações da taxa
básica. A conta sairia de quase R$ 75,3 bilhões para praticamente R$ 121,5
bilhões. Levando-se em conta todo o saldo da dívida bruta, a despesa com juros
poderá crescer 13,3% em 12 meses, alcançando R$ 393,1 bilhões, algo como 5,3%
do Produto Interno Bruto (PIB).

Para
comparação, essa montanha de gastos deverá superar em pouco mais de um terço
todos os recursos gastos pelo Tesouro entre abril e dezembro do ano passado com
o auxílio emergencial (R$ 293,1 bilhões).

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