Conheça Maurício Garcêz, músico autista que lança show online com canções autorais neste domingo (10)
Músicas foram compostas durante sessões de musicoterapia ao longo de oito anos
Ele tem 33 anos, é universitário e conseguiu provar que diagnóstico algum é capaz de limitar uma trajetória de vida. No mês em que a conscientização sobre o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) ganha visibilidade, Maurício Garcêz tem o que comemorar: aquilo que antes era seu mundo particular virou show autoral e estará na rede mundial de computadores a partir do próximo domingo (10/4), às 17 horas, no canal do YouTube @diariodemauriciogarcez.
O jovem cursa física na Universidade Federal de Goiás (UFG), mas foi a música que deu uma verdadeira guinada em sua vida. “A primeira vez que vi que o Maurício tinha um vozeirão foi numa brincadeira de karaokê aqui em casa mesmo”, relembra a mãe do rapaz, Sandra Andrade. Ela conta que outras pessoas envolvidas com a causa do autismo a levaram à busca pela musicoterapia. Foi quando conheceu Kelly Tobias, que há oito anos trabalha com Maurício.
Do processo terapêutico surgiram composições próprias que, agora, integram o show online “Mundo Particular”, gravado recentemente pelo jovem com recursos oriundos da Lei Aldir Blanc. Assim que soube do edital do programa de incentivo, Sandra correu atrás de toda a documentação necessária e encaminhou proposta, aprovada pela Secretaria de Estado de Cultura (Secult).
O repertório da apresentação é composto por doze canções que retratam um pouco da rotina, dos gostos e “desgostos” da vida do jovem universitário. Isso porque, como algumas das marcas registradas das pessoas com autismo são a sinceridade e a literalidade das palavras, Maurício não se esquivou de falar sobre sentimentos como a preguiça, por exemplo.
“Eu tenho preguiça, preguiça de cantar
E são muitas coisas a me atrapalhar,
Eu fiz uma música pra você saber
Que essa preguiça vai virar CD”
“No início, havia um pouco de resistência com a terapia, mas ela foi vencida. A Kelly aproveitava todas as oportunidades e até da falta de ânimo do Maurício nasceu canções”, celebra Sandra ao comentar sobre o trabalho desenvolvido pela musicoterapeuta e também fundadora do Instituto de Vida Sonora (IVS).
Para Kelly, a música é uma ferramenta valiosa para as pessoas que têm o diagnóstico de TEA. “Quando canta, o autista consegue estar à frente de muitas pessoas, sair do seu mundo e interagir com o outro, o que, normalmente, é uma dificuldade”, pondera.
Essa interação sobre a qual a especialista fala e a afetividade – característica que algumas pessoas acreditam não fazer parte da vida dos indivíduos com TEA – estão presentes nas músicas de Maurício. Duas composições, em especial, provam isso: “A exemplar”, escrita para homenagear a mãe, e “O amigão”, uma referência carinhosa ao pai.
Além dessas duas canções e de “Preguiça”, fazem parte do repertório a ser lançado “Múltiplos de 11”, “O Amor”, “Tempo”, “Vamos brincar”, “Klauss”, “Através do meu silêncio”, “O que penso”, “Mundo Azul” e “Mundo Particular”.
A proposta aprovada pela Secult viabilizou a gravação do show no estúdio Up Music, em Goiânia, no último dia 20 de março. A apresentação contou com apoio de violão e cavaquinho (Rafael Mendonça), teclado (Ygor Vieira), percussão (Bruno Cardoso) e backing vocal (Fernanda Felipe), além, claro, da participação especial da terapeuta Kelly Tobias. A duração é de aproximadamente uma hora.
Autismo
Atualmente, de acordo com o Centro de Controle de Doenças e Prevenção (CDC) dos Estados Unidos, uma a cada 44 crianças aos 8 anos de idade é diagnosticada com autismo no País. O número, divulgado em dezembro do ano passado, é 22% maior do que o catalogado na pesquisa anterior, de 2020, cuja proporção era de 1:54.
No Brasil, ainda não há estudos científicos sobre a prevalência do TEA. Entretanto, caso a porcentagem do último relatório do CDC (de 2,3% da população) fosse aplicada aqui, a estimativa seria de aproximadamente 4,8 milhões de autistas.
Definição
O Manual de Orientação da Sociedade Brasileira de Pediatria no 5 de 2019 define o TEA como um transtorno do desenvolvimento neurológico, caracterizado por dificuldades de comunicação e interação social, e pela presença de comportamentos e/ou interesses repetitivos ou restritos. Esses sintomas configuram o núcleo do transtorno, mas a gravidade de sua apresentação é variável.
“Trata-se de um transtorno permanente, não havendo cura, ainda que a intervenção precoce possa alterar o prognóstico e suavizar os sintomas. Além disso, é importante enfatizar que o impacto econômico na família e no país também será alterado pela intervenção precoce intensiva e baseada em evidência”, diz trecho do documento.