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terça-feira, 10 de dezembro de 2024
Opinião

A Falta de dignidade denominada escravidão

Por João Paulo Chaves Arantes Me comoveu muito a história de Madalena Santiago da Silva, uma senhora de 62 anos que teve vídeo viralizado nos últimos dias na web. Em resumo, para quem não acompanhou o caso, Madalena foi resgatada de um trabalho análogo ao escravo e, ao dar entrevista para TV Bahia, filiada da […]

Postado em 5 de maio de 2022 por Redação

Por João Paulo Chaves Arantes

Me comoveu muito a história de Madalena Santiago da Silva, uma senhora de 62 anos que teve vídeo viralizado nos últimos dias na web.

Em resumo, para quem não acompanhou o caso, Madalena foi resgatada de um trabalho análogo ao escravo e, ao dar entrevista para TV Bahia, filiada da TV Globo naquele Estado, se emocionou ao segurar a mão da repórter que era branca, pois era maltratada e sofria racismo pelo seus antigos patrões, não recebia seus proventos com a alegação de ser “considerada da família.”

Embora achemos que o trabalho escravo foi adotado apenas durante o período colonial e monárquico e está abolido no Brasil desde 1888, não é bem esta a realidade que muitas das vezes nos deparamos, como é o caso, por exemplo, da senhora Madalena.

A escravidão moderna é uma realidade e hoje tomou moldes que podem diferir das senzalas e chibatadas que os senhores de engenho aplicavam como punições em seus escravos, porém, não menos injusto, agressivo, desumano e repulsivo.

O “trabalho escravo contemporâneo” ou “trabalho análogo a escravidão” é marcado hoje pelo trabalho forçado, com vigilância ostensiva, que limita ou proíbe a liberdade e a locomoção do trabalhador, jornadas exaustivas, condições degradantes, servidão por dívidas, onde o trabalhador é obrigado a exercer suas atividades sem receber a devida contraprestação laboral, a submissão do trabalhador a trabalho exigido sob ameaça de punição, com uso de coação, realizado de maneira involuntária, padecendo com o racismo e assédios de diversas classes. Tal definição está transcrita na Portaria do Ministério do Trabalho nº 1.129/2017.

Embora pareça uma realidade distante, pois aqui de nossos gabinetes, escritórios e consultórios não enxergamos a veracidade latente que a cada dia mais assola nossa sociedade, temos no Brasil, por exemplo no ano de 2021, cerca de 1937 pessoas resgatadas em “condições análogas à escravidão”, conforme divulgado pelo site reporterbrasil.org.br, mostrando que muitos trabalhadores ainda se encontram descobertos as bestialidades que em outrora era praticada. O número realmente é expressivo e assustador.

O “trabalho escravo contemporâneo” ou “trabalho análogo a escravidão” fere um princípio fundamental, iniciado lá no século XVIII com o Iluminismo de que “todos os homens nascem livres e iguais em direitos” (Princípio da Dignidade da Pessoa Humana).

Em nosso ordenamento jurídico vigente, incluído pela Lei 10.803/2003, temos no artigo 149 do Código Penal a atual redação que balizou em que consiste o “trabalho análogo a escravidão” no Brasil, definindo inclusive tal prática como crime, punido com reclusão de 4 à 8 anos, além de multa.

Temos que combater veementemente a prática narrada. A erradicação do “trabalho análogo a escravidão” é fundamental e necessária.

O mundo empresarial contemporâneo repudia qualquer situação que seja próxima a “escravidão”, inclusive, as grandes empresas multinacionais mundo afora exigem padrões elevados de respeito ao trabalhador, inclusive obrigam a garantir que não exista violação de direitos humanos em seu meio ambiente laboral.

Para que isso ocorra é necessário uma política de conscientização das empresas e empresários, para que os mesmos monitorem o meio ambiente de trabalho em especial a cadeia de produção e não vejam tal prática como benéfica, visando garantir apenas o lucro, que sejam criadas leis rigorosas e que a fiscalização seja implacável.

Essa política de fiscalização tem que ser severa, pois caso contrário, despertaria desconfiança no mercado e nos consumidores mundiais podendo findar ou dificultar as tratativa mercantis internacionais de nosso país.

Por derradeiro, acredito sim em um mundo melhor, um mundo em que as pessoas respeitem seus semelhantes, um mundo solidário em que as vontades de ganho não sobreponham o respeito ao ser humano e a dignidade da pessoa, um mundo em que pessoas, como a senhora Madalena, não precisem chorar ou ter vergonha de sua condição social, ou de raça, ou cor, que não precise se esconder, que tenha seus direitos e garantias resguardados pelo Estado e pela Lei, independente de ideologia.

Transcrevendo Max Weber “o trabalho dignifica o homem”, sabem por quê? 

Porque é através do trabalho que homens e mulheres ganham qualidade moral que infunde respeito, adquirem consciência do próprio valor, mensuram o tamanho de sua honraria e nobreza, pois é através do trabalho que podemos humanizar o mundo e somente através dele podemos realmente adquirir o conceito de dignidade.

João Paulo Chaves Arantes é advogado em Direito do Trabalho e Previdenciário

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