Por que ainda temos que discutir mulheres na liderança?
Mesmo que haja cada vez mais mulheres em cargos de gestão, o número delas é baixo comparado ao número de homens
Roberto Santos
Infelizmente, essa ainda é uma discussão que temos que fazer. Mesmo que haja cada vez mais mulheres em cargos de gestão, o número delas é baixo se compararmos com o número de posições ocupadas por homens.
No Brasil, a pesquisa recente divulgada pelo IBGE aponta que as mulheres estão em 37,4% dos cargos de liderança – e esse número caiu na pandemia. Além disso, se considerarmos o C-Level (presidente e seus reportes diretos) esse percentual está abaixo de 5%. Daí a necessidade de uma conversa sustentada sobre isso, avançando nas razões pelas quais isso ainda acontece. Há muitas pesquisas que mostram que a redução da desigualdade de gênero pode ter um impacto em termos de inovação, criatividade e até resultados financeiros – e o motivo é simples: a diversidade é que impulsiona todos esses fatores.
Uma equipe de liderança com equilíbrio de gênero é mais eficaz em se relacionar com as partes interessadas de uma organização, clientes, funcionários, parceiros, entre outros stakeholders. Na verdade, as mulheres líderes são mais propensas a serem transformadoras, empáticas e funcionarem como modelos para colegas e subordinados.
Vamos dar um passo atrás para examinar a educação e as carreiras da maioria das mulheres. Vemos um número igual, senão maior, de mulheres saindo da faculdade. Muitas entram no mercado de trabalho sem muitos obstáculos. O problema acontece quando elas começam a pensar em avançar na carreira – poucas ainda são vistas em posições de liderança. Por quê?
Um dos primeiros motivos são os estereótipos de gênero que gênero acabou limitando as escolhas de carreira das mulheres, muitas vezes restringindo-as a campos em que se requer mais inteligência emocional, como Educação ou Recursos Humanos. Isso impediu o crescimento da representação das mulheres em outros cargos, mais técnicos, ou voltados para ciências exatas, por exemplo. Porém, o mundo tem requerido dos seres humanos que usem seu QE (quociente emocional) porque apenas o famoso QI não dá conta de vivermos num mundo complexo, incerto, volátil e ambíguo como o atual… e futuro.
Outro problema é a sobreposição de papéis profissionais e pessoais. A mulher sai do local de trabalho e segue para uma “segunda jornada” em casa – o que se torna um dos principais fatores para as mulheres deixarem o mercado de trabalho em diferentes estágios das suas carreiras. Isso, infelizmente, ocorreu com mais frequência durante a pandemia, com até mesmo mulheres em cargos sêniores optando por deixar suas carreiras de sucesso devido ao estresse físico, mental e emocional.
Isso também nos leva a uma outra questão: a jornada dupla da mulher dificulta as oportunidades de networking. Muitas vezes é difícil para as mulheres se envolverem nessas atividades – como happy hours, entre outros.
Ainda existe um pensamento de que os homens seriam mais competentes do que as mulheres. Um estudo de pesquisadoras de escolas de negócios europeias, como a IE Business School, apontou que as mulheres enfrentam mais dificuldades para provar competência. A mudança desses cenários depende de medidas concretas para termos mais mulheres em posições de poder, como nos Conselhos de Administração, “boards” de empresas e na política.
Para as mulheres, ser líder é muitas vezes um paradoxo. Por que uma mulher em posição de liderança é uma mulher líder enquanto um homem é simplesmente um líder? Isso reflete uma crença subjacente de que os homens são os líderes naturais – uma imagem que é reforçada na mídia diariamente.
Mulheres líderes precisam desafiar o status quo e concordar em definir – sem remorso e sem medo de serem julgadas – quais poderiam e deveriam ser suas carreiras. Além disso, o número de mulheres no topo pode ser menor do que o número de homens, mas certamente não há escassez de mulheres inspiradoras para inspirar outras – e abrir o campo de oportunidades.
Falando nisso, aliás, é preciso que as próprias mulheres deem oportunidades de trabalho a outras. Infelizmente, já assistimos a episódios – amplamente divulgados em redes sociais, inclusive – de mulheres que declararam não contratar profissionais do mesmo gênero por questões relativas à gravidez ou cuidado com os filhos.
Iniciativas existem como belos exemplos a serem multiplicados. Um dos projetos de mentoria gratuita para mulheres está em sua 12ª edição e já atendeu mais de 3.500 mulheres no mundo com uma rede de mais de 500 mentores voluntários. Com programas diversificados, a missão é promover o “desenvolvimento das mulheres e equidade de gênero, principalmente no ambiente de trabalho”, conforme proposto pela idealizadora.
Finalmente, se olharmos pelo lado puramente financeiro, empresas com cultura inclusiva têm seis vezes mais chances de serem inovadoras, de acordo com uma pesquisa da Deloitte. Ao ficar à frente das mudanças, as organizações que equilibram a diversidade de gênero na liderança têm duas vezes mais chances de atingir ou melhorar as metas financeiras. Isso significa fornecer mentoras e modelos femininos, demonstrar confiança (em vez de falar sobre isso), criar um ambiente que incentive a colaboração, o uso da tecnologia para quebrar barreiras e a busca aberta pela inovação.
Roberto Santos é sócio-diretor de empresa de recursos humanos