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segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
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Investigações

Goiás é o 8º estado com mais pessoas desaparecidas

Goiânia teve 212 registros de desaparecimento, mas 90% dos casos foram solucionados.

Postado em 19 de setembro de 2022 por Sabrina Vilela

Murilo Soares Rodrigues, 12, era um jovem amado por todos ao seu redor e tinha o sonho de ser jogador de futebol. Por isso, vivia brincando de jogar bola no bairro em que cresceu, no setor Papilon Park, em Aparecida de Goiânia. Mas em 22 de abril de 2005  a vida dele e da família mudaram completamente. Ele foi visitar o pai, mas nesse dia em específico o pai não conseguiu ficar com ele, então pediu que o amigo Paulo Sérgio, 21, o levasse de volta para casa.

No trajeto eles foram abordados por uma equipe da Ronda Ostensiva Tática Metropolitana (Rotam) – oito policiais no total. O veículo dos meninos foi encontrado um dia depois no setor Alto do Vale, completamente carbonizado. Contudo, sem qualquer indício do paradeiro dos dois jovens. 

Segundo a mãe, os policiais que abordaram o filho só foram recolhidos por seis meses, houve a audiência de cada um deles, mas depois foram absolvidos por falta de provas, “mesmo com testemunhas”. Murilo e Paulo fazem parte das mais de 65 mil pessoas desaparecidas em todo o país, de acordo com Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021. 

Destes, 2.463 são de registros de Goiás – que está em 8º lugar entre os estados com maior número de pessoas desaparecidas – no mesmo ano 874 foram encontrados. Em 2020, foram 2.289 desaparecidos e 746 pessoas achadas.

17 anos sem respostas

“Ele dizia que não queria me ver triste porque ele iria se tornar um jogador famoso para me ajudar”, lembra a mãe do jovem, Maria das Graças Soares,53. A dor da dúvida dura há mais de 17 anos. Ela conta que os policiais foram absolvidos por falta de provas. Encontramos só o carro carbonizado sem o som e sem as rodas.  “Até hoje corro atrás, luto e procuro saber  onde está meu filho. Porque meu sonho é pelo menos enterrar os restos mortais dele”, desabafa. 

Além de Murilo, Maria das Graças tem outro filho, mas seu coração não está completo desde que a tragédia aconteceu. “Eu não vivo mais, eu vegeto, nunca mais trabalhei, sou dependente de remédio, faço tratamento psiquiátrico todo mês e com psicólogo duas vezes na semana. Nunca recebi nenhuma ajuda por parte do estado”.

A situação de Soares piorou após ser obrigada a receber uma certidão de óbito do filho há dois anos. Ela tinha uma casa em nome dos dois filhos , mas como ela queria sair do imóvel ela foi orientada a tirar o nome do Murilo para arrumar a documentação novamente. Ela queria uma documentação que comprovasse o desaparecimento de Murilo, não que fosse dado como morto. “Foi um choque eu ter recebido uma certidão de óbito. Entrei em depressão outra vez porque não era isso que eu esperava. O juiz me disse que depois de 10 anos a pessoa tem direito a uma certidão de óbito do desaparecido. Mas, está escrito morte presumida, não está escrito o motivo da morte”. 

Assim como toda mãe, a vontade de Maria das Graças era que seu filho fosse eternizado por meio de uma amiga que faz parte do “Mães do Cerrrado”. Em 14 de junho de 2022 houve a inauguração do espaço de lazer e prática de esportes que leva o nome de Murilo, o Parque da Criança Murilo Soares Rodrigues no setor Mansões Paraíso. “Fiquei feliz em saber que meu filho não será esquecido”.

Medidas 

O Ministério Público de Goiás (MP-GO) possui um sistema para ajudar a identificar pessoas desaparecidas chamado de  Programa de Localização e Identificação de Desaparecidos do Ministério Público do Estado de Goiás (PLID Goiás). Gestora técnica do programa, Estefânia Pollianna Nunes destaca que a ação faz a coleta de informações para um olhar mais humanizado de modo a entender o contexto envolvido do desaparecimento e amparar a família.

“Trabalhamos articulados em rede de forma mais sincronizada, com evolução nessas políticas públicas, olhar de forma mais criteriosa porque por trás do desaparecimento pode ter um tipo de crime como tráfico de órgãos , tráfico de pessoas, trabalho escravo, mulher vítima de violência doméstica que se esconde”, exemplifica.

Para ela, o PLID atua de forma complementar ao Grupo de Investigação de Desaparecidos da Polícia Civil (GIP) visto que Goiás não tem uma delegacia especializada em pessoas desaparecidas e o GIP não tem atribuição de delegacia. 

Nunes destaca que o Ministério Público tem o acolhimento humanizado para cada família, porque é um momento em que elas ficam desesperadas sem saber o que fazer. “Orientamos as famílias, escutamos as histórias para entender o contexto do desaparecimento, ajudamos a fazer as buscas onde ela já fez e onde pode fazer. Não é um trabalho investigativo como o da polícia, então o trabalho complementa um ao outro”. 

As pessoas quando fazem boletim de ocorrência na delegacia automaticamente esse registro caí no Sistema Nacional de Localização e Identificação de Desaparecidos (Sinalid) – banco de dados nacional de pessoas desaparecidas do Rio de Janeiro. Após a denúncia o Sinalid  faz a distribuição dos dados de acordo com cada estado, ou seja, o PLID de cada estado. 

Delegacia especializada

Delegada do Grupo de Investigação de Desaparecidos da Polícia Civil (GIP), Ana Paula Machado declara que houve um leve aumento no número de pessoas desaparecidas nos últimos anos. Contudo, ela afirma que as estatísticas não são dados consolidados porque muitas vezes as famílias registram o desaparecimento e quando a pessoa é localizada eles não informam a Polícia Civil e o caso fica em aberto. 

O GIP é responsável pelo controle de pessoas desaparecidas da capital. Ela afirma que em Goiânia de abril a agosto deste ano 212 pessoas desapareceram, mas que 90% dos casos conseguiram ser solucionados. Os dados se referem apenas a pessoas maiores de 18 anos. A estatística para menores de idade fica a cargo da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).  “Quando a gente consegue monitorar de perto todos os casos de desaparecimento da capital, a gente consegue dar uma resposta e trazer estatísticas mais consolidadas. Agora mesmo que a família não procure a Polícia Civil nós vamos até as famílias para buscar essas informações”. 

A delegada afirma que existe uma previsão de criação da Delegacia Especializada de Pessoas Desaparecidas que com maior estrutura conseguirá atender todos os tipos de casos. O perfil das pessoas desaparecidas é diversificado, mas Machado afirma que no geral são pessoas do sexo masculino e jovens. 

No que se refere às causas existem três fatores: causa civil, em que a pessoa sai do âmbito familiar de forma voluntária; involuntário no qual o indivíduo possui algum problema psiquiátrico; e criminosos que podem ter relação com homicídio com ocultação de cadáver, sequestro, drogas entre outros. Em Goiás a maior incidência são de desaparecimentos civis. 

Para notificar um desaparecimento, não é mais necessário aguardar o prazo de 24 horas, isso contribui para que o número de registros aumente. “A partir do momento em que a família percebe que a pessoa saiu da sua rotina habitual, está em local incerto e não sabido e não consegue identificar o paradeiro, a família deve procurar a Polícia Civil e registrar o Boletim de Ocorrência na delegacia mais próxima”, explica. (Especial para O Hoje)

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