Alto índice de incêndios no Cerrado ameaça fauna local
Entre 1985 e 2023, 88 milhões de hectares do bioma foram destruídos pelo fogo, segundo dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
Maior bioma da América do Sul e segundo maior do Brasil, o Cerrado é conhecido por ser uma região savana que alcança cerca de 22% de todo o território brasileiro. O bioma estende-se por cerca de 200 milhões de quilômetros quadrados e possui uma formação vegetal de grande biodiversidade e grande potencial aquífero.
O bioma abrange 23% do território nacional e quase 2 milhões de quilômetros quadrados, presente em estados como Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Paraná, São Paulo e o Distrito Federal.
Apesar de toda grandeza, atualmente, o Cerrado é considerado o segundo bioma mais ameaçado do país. Entre 1985 e 2023, 88 milhões de hectares do bioma foram destruídos pelo fogo, o que equivale a 43% de toda a extensão do bioma, chegando a superar o território de países como Chile e Turquia. Os dados são do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Além disso, segundo o Instituto Brasiliero do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), atualmente ocorre um alto índice de incêndios e queimadas, que são etapas do processo de desmatamento. No segundo semestre deste ano, o país enfrenta um período de seca que agrava ainda mais esse cenário de incêndios.
Esta ameaça é real não somente para a flora mas também para a fauna, já que o Cerrado é lar de 5% da biodiversidade mundial. O celeiro de vidas abriga 12.599 espécies de plantas e cerca de 2.653 espécies de animais vertebrados. Quando ocorre uma queimada, muitos desses animais, infelizmente, não conseguem fugir das chamas ou mesmo receber atendimento e se recuperar. Assim, acabam falecendo na própria natureza.
Ana Carolina Dias Oliveira, analista ambiental da Educação Ambiental do Ibama e do Centro de Triagem de Animais Silvestres de Goiânia (Cetas), afirma que o Cerrado tem sido deteriorado ao longo dos anos. “É importante refletirmos sobre isso, pois as queimadas, o desmatamento devido à expansão agrícola e a ocupação desordenada têm reduzido as populações de muitas espécies, algumas das quais já estão extintas”, lamenta a analista.
Dentre os animais mais emblemáticos e ameaçados estão o lobo-guará e as onças, principalmente as de grande porte, segundo Ana Carolina. Na tentativa de coibir a violência que esses animais sofrem, o Ibama realiza ações e operações de resgate daqueles que são mantidos presos ou são vítimas de tráfico, de atividades antrópicas ou mesmo daqueles que são entregues espontaneamente pela população, para devolvê-los à natureza.
As aves são o grupo mais afetado pelo tráfico de animais. A razão para isso, segundo a analista, é a beleza e o canto desses bichos. “Muitas vezes, os pássaros são colocados para brigar ou mantidos em gaiolas, o que leva à retirada indiscriminada de muitos deles da natureza”, explica.
Após serem resgatados esses animais são devolvidos à natureza. Enquanto o Ibama faz a fiscalização nacionalmente, o Cetas é responsável por receber os bichos, que passam por um processo de triagem, quarentena e reabilitação. “Após esse processo, eles são devolvidos a áreas de soltura cadastradas no IBAMA, que incluem propriedades rurais parceiras”, detalha Carolina.
As multas para quem comete esse tipo de infração variam de acordo com a gravidade do ato. Para aquele que mantém, transporta, utiliza animais ou seus subprodutos a multa é de R$500, quando envolve animais não ameaçados de extinção e R$5.000 para animais ameaçados. “Em casos de reincidência, a multa pode ser aumentada. Além das penalidades administrativas impostas pelo IBAMA, os infratores também respondem judicialmente, enfrentando processos penais e civis”, acrescenta.
Animais vítimas das queimadas são resgatados pelo Cetas
O Ibama não costuma realizar ações de forma pontual, segundo Ana Carolina. “Nosso papel é promover a educação ambiental do IBAMA não como uma ação pontual, mas como um projeto contínuo”, afirma. “Evitamos realizar ações e palestras isoladas e nossa proposta é formar multiplicadores para promover mudanças de comportamento na sociedade goiana”, acrescenta.
A analista explica que a existência do centro de triagem em si, como local de recebimento para animais entregues espontaneamente ou resgatados, é uma ação importante. “Esses animais podem ser, por exemplo, um tamanduá que entra em um banco ou uma onça que entra em um hospital”, exemplifica.
Ela destaca que o instituto está pronto para receber e também fornecer suporte às ações de fiscalização para animais apreendidos, vítimas do tráfico e da captura indiscriminada. “Isso faz com que o centro seja um ponto de reflexão importante”, comenta.
Outro projeto de conscientização do Ibama é a promoção da educação ambiental quando solicitado, como foi o caso do convite feito pelo Zoológico de Goiânia nesta quarta-feira (11). O Ibama juntamente com o Cetas estiveram no local para promover palestras e ensinar estudantes do ensino fundamental a respeito da fauna e flora do Cerrado.
Além disso, o instituto trabalha com a formação de multiplicadores, por meio de uma parceria com a prefeitura. “Entramos em contato com a prefeitura, que, se interessada, coordena os melhores dias para a formação, que é dividida em uma parte teórica e uma prática”, explica.
A formação dura cerca de 30 horas, incluindo parte teórica no IBAMA, visita ao centro de triagem e participação em algum momento de soltura de animais. O objetivo é que os professores se apropriem do discurso e o levem para salas de aulas. Assim, quando a criança for à uma visita ao zoológico ou ao centro de triagem não será apenas uma experiência estética, “mas um entendimento profundo de que os animais ali presentes não estão lá por acaso; eles foram resgatados de situações de ação antrópica ou capturados e trazidos ao centro”, finaliza.