Conheça Aluísio, o vendedor ambulante que passou para medicina na UFG
O estudante já vai iniciar seu terceiro ano de faculdade e a trajetória dentro da medicina, que teve pontapé lá em 2023, segue sendo inspiração para quem ouve
Palhaço e vendedor ambulante, mas, acima de tudo, um estudante com o desejo de se tornar médico. Esta é a história do Aluísio Gustavo Miranda da Silva, de 42 anos, que após nove anos de dedicação, foi aprovado em 11º lugar no curso de medicina pela Universidade Federal de Goiás (UFG), a segunda instituição federal que conquistou a vaga dos sonhos. O estudante este mês inicia o seu terceiro ano de faculdade e a trajetória dentro da medicina que teve um ponta pé lá em 2023, segue ainda hoje trazendo inspirações para quem a ouve.
Com uma agenda lotada, Aluísio dividia os seus dias entre os estudos e o seu trabalho como palhaço animando festas, além de vender brinquedos e algodão doce nos semáforos. Hoje, depois de tantos anos estudando, ele equilibra o seu tempo entre as aulas de reforço escolares e as correções de provas, durante o período escolar, já nas férias, ele retorna com o seu trabalho de ambulante.
“Quando está no auge do período letivo do ensino médio, eu dou aula particular de reforço para alguns alunos, eu corrijo prova para alguns professores, que eu consigo organizar nos meus horários livres, são poucos, mas eu consigo organizar, além do que eu levanto todos os dias, de segunda a sexta, três horas da manhã, ou para estudar conteúdo da faculdade ou para corrigir prova”, explica.
A sua corrida para conseguir uma vaga na universidade iniciou lá em 2003. “Se for somar tudo, foram 12 anos de cursinho. Eu já tinha feito dois anos de cursinho, fiz 2003 e 2004”, revela. Ele conta que na época o resultado era pego de forma presencial na Praça Universitária, mas infelizmente a nota de corte não permitiu com que Aluísio conseguisse uma vaga.
“Eu fui lá pegar o resultado e eu fui lá e falei, ‘meu nome tem que estar na lista, porque eu não tenho como estudar mais’. Já tinha feito dois anos de cursinho e não tinha mais como estudar”.
Foi aí que teve que dar uma pausa nos estudos, por causa da sua situação financeira. “Só que os professores me encontraram na rua, vendendo aqueles palhacinhos de cone, eu trabalhava na porta do Ita, lá no Flamboyant. Eles falaram, não, você vai voltar a estudar”, foi através de uma outra bolsa de estudo, que Aluísio retornou a sua jornada.
Mesmo o objetivo do vendedor ambulante sempre ter sido a medicina, ele continuou enfrentando dificuldades para ser aprovado no disputado vestibular. Foi quando em 2006, finalmente conseguiu uma vaga para estudar medicina veterinária. “Eu passei em primeiro lugar na Federal Tocantins, passei na UFG e fiz veterinária na UFG”.
Mas, ao final do curso, descobriu que tinha alergia a pelo de animais, o que tornou inviável sua continuidade na clínica onde atuava. “Eu sou médico, bacharel em medicina veterinária, me formei em 2013, só que de 2011 pra cá, eu desenvolvi tanta alergia, que eu não posso exercer a veterinária […] Eu só atendi uma clínica até hoje, depois que eu me formei. Mas eu tive várias crises que tive que parar de trabalhar na clínica. E aí eu atendi a domicílio, só que, mesmo atendendo a domicílio, as crises, elas sempre vão e voltam”, explica.
Foi então que ele decidiu ressuscitar seu sonho de ser médico. Sem recursos para pagar cursos preparatórios, conseguiu bolsas de estudo em instituições particulares na capital.
“Em 2014 eu voltei pro cursinho. Fui lá no colégio, eles reativaram a minha bolsa e foram mais nove anos. Nove anos de muita luta, de muita dedicação. Graças a Deus, consegui ser aprovado em duas universidades federais”, relembra o estudante.
Aluísio destaca que durante o período de estudos, passava horas em um quarto cheio de livros, apostilas e cadernos. A luta contra o cansaço da rotina exigiu algumas medidas incomuns.
“Tinha dia que eu chegava em casa, que estava tão cansado, mas tinha que estudar, e a gente tinha uma bacia de água gelada. Eu colocava essa bacia debaixo da mesa e enfiava os pés dentro para não dormir. Quando a água não resolvia mais, eu pegava o livro e estudava em pé, andando no quarto, de um lado para o outro, para não dormir”, diz.
E depois de tantas tentativas, veio a aprovação. O estudante de medicina já tem uma meta traçada para quando se tornar o “Doutor Aluísio”. O seu início no curso de medicina não foi apenas uma vitória pessoal, mas uma conquista coletiva, com o apoio e torcida de toda a sua família.
“Na hora que aconteceu que saiu o resultado que tinha passado, parece que a gente não estava acreditando porque parecia que era algo impossível de acontecer”, diz. “Me deparar com o resultado foi assim, um choque, um choque de realidade”, continua.
Hoje, acompanhado da esposa Maria Iraci e do filho Davi, Aluísio continua escrevendo sua trajetória. “Quem não vive e não suporta processo, jamais vai viver propósito […] cada um tem o seu momento, cada um tem a sua luta. A gente não pode ficar comparando, ‘mas a luta de…’, não, tudo é a vida. Cada um tem a sua realidade. Viva a sua realidade, viva a sua luta, viva o seu processo, você vai viver o seu propósito”, finaliza.