Beatriz Nascimento destacou-se por suas pesquisas sobre quilombos, diáspora africana e resistência cultural negra
Historiadora, ativista e poeta, Beatriz Nascimento desafiou narrativas hegemônicas e deixou um legado que inspira movimentos antirracistas e feministas até hoje

Beatriz Nascimento (1942-1995) foi uma das mais importantes intelectuais negras do Brasil. Nascida em Aracaju, Sergipe, mudou-se ainda criança para o Rio de Janeiro com sua família em busca de melhores condições de vida. Em 1969, ingressou no curso de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), rompendo barreiras em um ambiente acadêmico dominado por homens brancos. Sua trajetória acadêmica e política marcou profundamente os estudos sobre a história negra no Brasil, ao reposicionar negros como protagonistas históricos e culturais.
Nos anos 1970, Beatriz foi uma das responsáveis pelo renascimento do movimento negro no país. Ela fundou o Grupo de Trabalho André Rebouças na Universidade Federal Fluminense (UFF), considerado um dos primeiros coletivos negros estudantis do Brasil. Suas pesquisas sobre quilombos foram revolucionárias: Beatriz enxergava esses espaços como símbolos de resistência e humanização, cunhando o conceito de “paz quilombola”. Para ela, os quilombos não eram apenas refúgios contra a opressão escravocrata, mas também expressões de uma identidade cultural negra que resistia à violência colonial.
Além da academia, ela encontrou na arte uma forma de expressão política. Em 1989, ela narrou o documentário Ôrí, dirigido por Raquel Gerber, que abordava os movimentos negros brasileiros entre 1977 e 1988. O filme conectava a história do Brasil à diáspora africana e reforçava a importância dos quilombos na formação da identidade nacional. Beatriz também era poeta e publicou textos que exploravam questões de raça, gênero e afeto. Sua obra poética foi reunida postumamente no livro Todas (as) Distâncias (2015), organizado por sua filha Bethania Nascimento.
Sua vida foi interrompida tragicamente em janeiro de 1995, quando foi assassinada aos 52 anos ao tentar ajudar uma amiga vítima de violência doméstica. O crime chocou o país e gerou mobilização nos movimentos negro e feminista, evidenciando a vulnerabilidade das mulheres negras à violência. Dados recentes mostram que mulheres negras ainda representam cerca de 75% das vítimas de feminicídio no Brasil, um reflexo das desigualdades estruturais que a intelectual tanto denunciou.
Seu trabalho acadêmico e militante influenciou gerações e permanece como referência nos estudos sobre raça, gênero e cultura no Brasil. Recentemente, seu nome foi homenageado em iniciativas como o programa “Atlânticas – Programa Beatriz Nascimento para Mulheres na Ciência”, que apoia cientistas negras, indígenas e quilombolas.