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terça-feira, 24 de junho de 2025
COMPORTAMENTO

A crise de meia-idade dos millennials desafia ideias antigas de sucesso

Desgastados e sem estabilidade, adultos entre 35 e 45 anos enfrentam frustrações geracionais em meio a promessas não cumpridas de propósito, flexibilidade e liberdade

Luana Avelarpor Luana Avelar em 4 de junho de 2025

A geração que cresceu ouvindo que poderia ser o que quisesse agora se vê às voltas com boletos acumulados, planos adiados e um sentimento coletivo de esgotamento. Para os millennials, nascidos entre o início dos anos 1980 e meados da década de 1990, a chegada aos 40 anos não veio acompanhada da estabilidade que marcava a meia-idade das gerações anteriores. O que se desenha é uma crise silenciosa, mas abrangente, que desafia os modelos tradicionais de sucesso, bem-estar e realização pessoal.

Diferentemente dos pais, os baby boomers, que associavam a meia-idade à consolidação da carreira, aquisição da casa própria e criação dos filhos, muitos millennials ainda enfrentam vínculos de trabalho instáveis, aluguel prolongado e a sensação de que a promessa de um futuro melhor foi adiada, ou talvez nunca tenha existido. Segundo relatório da Young Invincibles, essa geração possui hoje metade da riqueza líquida que os boomers tinham na mesma faixa etária.

A ideia de que bastava seguir um propósito e priorizar a flexibilidade para alcançar a realização se revelou, para muitos, uma utopia. Dados da pesquisa Deloitte Global 2022 Gen Z & Millennial Survey indicam que 92% dos millennials consideram importante ter um trabalho com propósito. No entanto, apenas 49% estão satisfeitos com o equilíbrio entre vida profissional e pessoal. A sobrecarga mental e a frustração com o mercado são agravadas por um cenário econômico instável e pela precarização das relações de trabalho.

No Brasil, os dados confirmam essa tendência. A Síntese de Indicadores Sociais 2023 do IBGE mostra que, embora a pobreza tenha caído para 27,4% da população, as desigualdades entre jovens adultos persistem, especialmente entre pessoas negras e pardas. Um levantamento da Catho registrou mais de 7 milhões de demissões voluntárias em 2022, movimento que aponta para o abandono de vínculos considerados insatisfatórios, mesmo sem garantias melhores à vista.

Essa busca por novas formas de viver e trabalhar não acontece sem efeitos colaterais. Reportagem da revista Fortune classificou a situação como uma “crise de propósito”, em que a insatisfação pessoal e profissional se acumula justamente no momento em que se esperava colher os frutos de décadas de esforço. Ao contrário das crises dos 40 tradicionalmente marcadas por dilemas individuais, o mal-estar millennial é coletivo e amplificado pelas redes sociais, que expõem e distorcem conquistas alheias.

A sensação de fracasso compartilhado tem levado muitos a reavaliar metas e relações com o trabalho. A série Wellmania, da Netflix, explora esse contexto ao retratar uma mulher de cerca de 40 anos em busca de equilíbrio físico e emocional, um reflexo do cotidiano de milhares de mulheres na mesma faixa etária, especialmente entre as autônomas e profissionais liberais.

Um dos elementos centrais dessa frustração geracional é o descompasso entre o discurso de liberdade e a realidade de um sistema que nunca esteve preparado para oferecer autonomia real. A promessa de que bastava seguir a própria paixão para ter sucesso colidiu com os limites de um mercado que exige produtividade constante. Para muitos, a pergunta deixou de ser se o sonho era grande demais e passou a ser se o sistema era pequeno demais para comportá-lo.

A geração millennial envelhece em meio a expectativas frustradas e começa a ressignificar o que é ter sucesso. No lugar de grandes conquistas, valorizam-se pequenas vitórias: tempo, vínculos reais e saúde mental. A pergunta que ecoa hoje não é mais “o que eu quero ser quando crescer”, mas “o que ainda vale a pena perseguir”.

Se antes a meia-idade era sinônimo de estabilidade, agora ela aponta para recomeços. Admitir o cansaço, rejeitar velhos moldes e buscar uma vida possível, mesmo que fora dos holofotes, tornou-se um novo sinal de maturidade.

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