Pela primeira vez, Academia Brasileira de Letras elege uma mulher negra para o quadro de imortais
Ana Maria Gonçalves conquista cadeira número 33 com 30 votos e marca um momento histórico na instituição fundada há 128 anos
A Academia Brasileira de Letras (ABL) elegeu, na tarde desta quinta-feira (10), a escritora Ana Maria Gonçalves como sua mais nova integrante. Aos 54 anos, a autora do romance Um Defeito de Cor passa a ocupar a cadeira número 33, anteriormente pertencente ao linguista Evanildo Bechara, falecido em maio deste ano. Com a eleição, Ana Maria torna-se a primeira mulher negra a integrar a ABL desde sua fundação, em 1897.
Mineira e radicada fora do Brasil há anos, a escritora obteve 30 dos 31 votos possíveis dos acadêmicos, vencendo por ampla maioria uma disputa que reuniu outros 12 candidatos. Entre eles, estavam a escritora indígena Eliane Potiguara — que obteve um voto — e nomes como Ruy Lobo, Célia Prado, João Calazans Filho e Roberto Numeriano.
A eleição ocorre menos de dois meses após a morte de Bechara, quando foi realizada a tradicional “sessão da saudade” em 27 de maio. Ana Maria foi a primeira a se inscrever para a vaga, sinalizando uma candidatura articulada e respaldada por membros da instituição.
Obra reconhecida e trajetória literária de Ana Maria Gonçalves
Aclamada por seu trabalho como romancista, roteirista e dramaturga, Ana Maria Gonçalves ganhou notoriedade com a publicação de “Um Defeito de Cor“, em 2006, pela editora Record. A obra de quase mil páginas conta a trajetória de Kehinde, uma mulher africana escravizada na Bahia, que percorre décadas em busca de um filho perdido. A narrativa é considerada um marco na literatura afro-brasileira e recebeu o Prêmio Casa de las Américas em 2007. Em 2020, um júri da Folha de S.Paulo elegeu o livro como o melhor romance brasileiro do século XXI até então.
O romance também foi celebrado na cultura popular. No Carnaval de 2024, a história de Kehinde inspirou o samba-enredo da Portela, uma das principais escolas de samba do Rio de Janeiro.
Além da produção literária, Ana Maria se destacou como professora de escrita criativa, curadora de projetos culturais e debatedora de temas ligados à literatura e à questão racial. Ela já atuou como escritora residente em universidades norte-americanas como Tulane, Stanford e Middlebury, acumulando experiência internacional em diferentes áreas do campo cultural.
A ABL anunciou o resultado da eleição em suas redes sociais. “Temos a satisfação de anunciar Ana Maria Gonçalves como nossa mais nova Acadêmica. Ela é a primeira mulher negra a integrar a Academia Brasileira de Letras em 128 anos e também a mais jovem do atual quadro de imortais”, informou a instituição em publicação no Instagram.

Representatividade e mudanças na ABL
Com a eleição de Ana Maria, a Academia Brasileira de Letras passa a contar com 13 mulheres em seu quadro atual, composto por 40 cadeiras. A presença feminina, ainda minoritária, tem se ampliado gradualmente ao longo dos últimos anos. O ingresso de Ana também representa um novo passo nas mudanças internas da instituição, que tem buscado diversificar o perfil de seus integrantes.
Até então, apenas dois outros membros negros ocupavam cadeiras na ABL: o escritor Domício Proença Filho e o músico e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil. Em 2023, o escritor e ativista Ailton Krenak foi o primeiro indígena eleito para o grupo de imortais.
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