Um terço dos brasileiros gasta todo o salário em até 36 horas
Levantamento mostra que a renda chega às contas já comprometida por dívidas e despesas fixas; 56% ficam com menos de R$ 100 no fim do mês
Uma análise de movimentações bancárias de mais de sete mil pessoas, realizada pela fintech Klavi, expôs o ritmo com que os salários desaparecem das contas dos brasileiros. O estudo revela que 35% da população consome integralmente os valores recebidos em até 36 horas. Entre eles, 18% gastam tudo em 24 horas, e 42% encerram esse ciclo em um dia e meio.
A pesquisa, baseada em dados do sistema financeiro aberto (open finance), indica ainda que mais da metade dos usuários avaliados, 56%, mantêm menos de R$ 100 de saldo mensal. O padrão observado sugere que a renda não cumpre o papel de prover estabilidade, mas sim o de liquidar despesas já acumuladas.
O levantamento dialoga com os números de inadimplência divulgados pela Serasa em junho deste ano. O país alcançou o maior índice de devedores de sua história: 77,8 milhões de brasileiros com dívidas médias superiores a R$ 6 mil por pessoa, o equivalente a R$ 477 bilhões em débitos não quitados.
Segundo os pesquisadores, o consumo imediato do salário expõe o encolhimento da margem de manobra financeira das famílias. A renda é rapidamente absorvida por contas de serviços básicos, financiamentos e dívidas de longo prazo, sem sobra para reservas, investimentos ou gastos imprevistos.
Embora o fenômeno seja generalizado, especialistas apontam que ele se concentra sobretudo em trabalhadores de baixa e média renda, mais expostos a oscilações econômicas e com menor acesso a instrumentos de crédito menos onerosos.
Para instituições financeiras, a pesquisa funciona como alerta sobre a fragilidade da capacidade de pagamento do consumidor brasileiro. Já para as famílias, confirma a dificuldade em transformar o salário em recurso disponível, num contexto em que o crédito bancário se torna tanto saída quanto armadilha.
O estudo dimensiona um cenário em que o salário não representa estabilidade, mas sim fluxo contínuo de entrada e saída, sem acumulação. No Brasil, a renda de milhões de pessoas não dura mais do que algumas horas.