Goiás está entre os estados com mais pedidos de recuperação judicial no agronegócio
Mesmo com crescimento do PIB e destaque nacional em liberdade econômica, micro e pequenas empresas e produtores rurais enfrentam recorde de solicitações para se manterem ativos
O aumento do Produto Interno Bruto (PIB) de Goiás, que posiciona o Estado como um dos mais dinâmicos do País, não tem se refletido em estabilidade para empresas e produtores rurais. Ao contrário: micro, pequenas e médias companhias, além de agricultores, enfrentam um cenário de fragilidade financeira que se traduz em recordes sucessivos de pedidos de recuperação judicial.
Dados da Serasa Experian apontam que o agronegócio brasileiro registrou 1.272 pedidos de recuperação judicial em 2024, mais que o dobro do ano anterior (534). No ranking dos estados mais afetados, Mato Grosso e Goiás ocupam as primeiras posições.
Somente em 2024, produtores rurais pessoa física protocolaram 566 solicitações em todo o País, sendo 122 apenas em Goiás. No primeiro trimestre de 2025, a tendência se manteve: 389 novos pedidos foram registrados no setor agrícola em nível nacional, aumento de 44,6% em relação ao mesmo período de 2024, com Goiás figurando novamente entre os estados mais críticos.
Segundo o advogado e especialista em recuperação judicial Rafael Brasil, o peso do agronegócio para Goiás ajuda a explicar parte dessa realidade. “Embora seja um setor econômico de destaque, ele não é imune às crises econômica, climática e política. Os reflexos, por exemplo, da política externa impactam diretamente na produção aqui em Goiás. Além disso, o agro brasileiro é formado, de maneira preponderante, por pequenos produtores, que são mais sensíveis a esses impactos, seja por falta de estrutura e profissionalização adequada de seu negócio ou pela atual escassez da concessão de crédito no agronegócio. Quanto maior o índice de inadimplência, mais dificuldade o produtor encontra para tomar novos créditos e isso o leva para um cenário de maior dificuldade”, analisa.
O especialista aponta que as micro e pequenas empresas também estão entre as mais afetadas. Para ele, o problema é estrutural. “São formadas, via de regra, por empreendedores que não têm um domínio adequado de seu próprio negócio. Sem uma gestão eficiente, um cenário de crise econômica na empresa se agrava e isso pode levar a um processo de recuperação judicial ou até mesmo uma falência”, pontua. Ele acrescenta que hoje, o crédito está escasso e mais caro, até mesmo para empresas saudáveis, e para aquelas que dependem exclusivamente de crédito para sobreviver, o cenário é ainda mais preocupante.
Apesar do avanço do PIB goiano, o descompasso entre crescimento econômico e a realidade empresarial permanece. Para Rafael, a explicação está no chamado “Custo Brasil” e na ausência histórica de políticas de incentivo ao empreendedorismo.
“Atualmente, o Estado de Goiás é o estado com maior liberdade econômica do País, e os reflexos disso serão sentidos com o tempo. O aquecimento da economia leva tempo e “fazer a máquina girar” é algo lento, no entanto, as empresas goianas não são imunes ao contexto nacional e internacional. Ou seja, embora o PIB de Goiás apresente alta, se o cenário a nível nacional não melhorar (com a redução do chamado Custo Brasil, por exemplo), a realidade não mudará”.
O advogado alerta que empresários goianos precisam adotar uma postura preventiva. Ao perceber sinais de endividamento, é essencial agir rápido: renegociar dívidas, firmar novos acordos e buscar suporte jurídico especializado antes que a crise se agrave. A recuperação judicial não pode ser vista como última cartada, mas como um instrumento de reestruturação consciente.
Apesar da gravidade do momento, o especialista vê em Goiás um cenário de maior possibilidade de recuperação em comparação a outras regiões do País. “O cenário econômico em Goiás é pujante, especialmente no agronegócio.” Isso dá mais perspectiva de soerguimento para empresas em crise, se houver planejamento e perspectiva de melhoria, a recuperação judicial tende a ser mais eficaz aqui, já que a economia local ainda oferece condições para a retomada.
Com o avanço dos pedidos de recuperação judicial em ritmo acelerado, Goiás se consolida como um retrato da contradição brasileira: ao mesmo tempo em que apresenta crescimento econômico, expõe a fragilidade de pequenos empresários e produtores rurais que, diante da falta de crédito e da instabilidade do cenário nacional, acabam recorrendo à Justiça como única saída para manter suas atividades.