População negra é maioria em Goiás, mas ainda enfrenta desigualdades estruturais
Pretos e pardos representam 63,37% dos goianos, porém lideram índices de informalidade, menor escolaridade, salários mais baixos e maior vulnerabilidade social
A população negra, somando pretos e pardos, é maioria em Goiás, representando 63,37% dos moradores, o equivalente a 4,47 milhões de pessoas, segundo o Censo 2022 do IBGE. Em 227 dos 246 municípios goianos — ou seja, 92% do estado — os pardos constituem o principal grupo populacional. Apesar dessa expressiva presença demográfica, os indicadores sociais revelam desigualdades profundas e persistentes no acesso a renda, educação, mercado de trabalho, políticas públicas e segurança.
Desigualdade de renda e escolaridade
Os dados mostram que o rendimento-hora dos trabalhadores brancos em Goiás é 61,4% maior do que o de pretos e pardos. Enquanto um trabalhador branco recebe R$ 20,00 por hora, negros e pardos ganham R$ 12,40. A disparidade também aparece na remuneração média:
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brancos: R$ 1.343,58
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pretos: R$ 993,47
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pardos: R$ 974,02
Na educação, a desigualdade se aprofunda. Em Goiânia, 54% das pessoas negras inscritas no Cadastro Único não concluíram o ensino fundamental. O índice de alfabetização chega a 91,80% entre amarelos, mas cai para 85,79% entre pretos.

O sociólogo Rafael Costa contextualiza: “A baixa escolaridade entre a população negra não é consequência individual, mas resultado de um sistema que historicamente negou acesso a educação de qualidade.”
Mercado de trabalho: informalidade, subutilização e ocupações mais vulneráveis
A população negra é maioria entre trabalhadores desocupados (64,2%) e subutilizados (66,1%). A informalidade atinge 47,3% de pretos e pardos, contra 34,6% entre brancos.
Negros também predominam em ocupações de menor remuneração e maior risco:
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serviços domésticos: 66,4%
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construção civil: 65,1%
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agropecuária: 62%
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transporte e armazenagem: 57%
Mesmo com ensino superior, a desigualdade permanece: brancos com diploma ganham R$ 35,30 por hora, enquanto pretos e pardos recebem R$ 25,70, diferença de 37,6%.
Empreendedorismo negro: força e desafios
Cerca de 57% dos negócios em Goiás são liderados por pessoas negras. Mas 60,1% deles estão na informalidade, enfrentando barreiras para crédito e capacitação.
O empresário Roberto Lima, do setor de alimentação, relata: “O caminho foi difícil. Mesmo com o negócio crescendo, ainda sinto diferença de tratamento quando procuro fornecedores ou clientes maiores.”
Discriminação institucional
Pesquisa do Instituto Locomotiva mostra que 70% dos negros já viveram situações de preconceito. O impacto aparece no comportamento:
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39% evitam correr para pegar ônibus com medo de serem abordados
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36% deixam de pedir informações à polícia
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73% dizem que episódios de discriminação afetam a saúde mental
Comunidades quilombolas
Goiás abriga comunidades tradicionais como o Quilombo Kalunga, em Cavalcante — o maior quilombo do Brasil. A líder Isabel Francisca Maia relata: “Mantemos nossas tradições, mas faltam serviços básicos como água tratada e saúde.”
Consciência e futuro
No Dia da Consciência Negra, os números reforçam que, embora seja maioria, a população negra em Goiás ainda enfrenta desigualdades profundas. Movimentos culturais, coletivos, empreendedores e lideranças comunitárias seguem construindo caminhos de resistência e transformação, enquanto cobram políticas públicas que reduzam desigualdades históricas.