Medidas emergenciais impostas ao Aterro Ouro Verde reacendem debate sobre lixões em Goiás
Decisão determina ações imediatas após novos deslizamentos no aterro em Padre Bernardo em meio a impasses sobre licenciamento, responsabilidades ambientais e a política estadual de resíduos sólidos em Goiás
A Justiça Federal determinou a adoção imediata de medidas emergenciais no Aterro Sanitário Ouro Verde, localizado em Padre Bernardo, após acolher pedido de tutela de urgência apresentado pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO) e pelo Ministério Público Federal em Goiás (MPF-GO).
A decisão foi proferida na quarta-feira (17) pela Vara Federal de Luziânia e tem como base a gravidade da situação ambiental registrada no local, agravada por novos deslizamentos ocorridos no mês de novembro.
Os episódios provocaram o lançamento de resíduos sólidos e chorume no Córrego Santa Bárbara, afluente da Bacia do Descoberto, responsável pelo abastecimento de água do Distrito Federal e de municípios do Entorno. Relatórios técnicos anexados aos autos apontam risco iminente de ruptura das lagoas de chorume, especialmente durante o período chuvoso, o que poderia comprometer o fornecimento de água para milhões de pessoas.
Na decisão, o magistrado determinou que o Estado de Goiás, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), apresente, no prazo de três dias, um Plano Emergencial de Contingência. O documento deverá conter diagnóstico atualizado da área, mapeamento de riscos, estratégias para prevenir novos deslizamentos e evitar o colapso das lagoas de chorume, além de um cronograma detalhado de ações.
A Justiça também ordenou a execução imediata de reforço geotécnico emergencial nas lagoas e a comunicação formal à Defesa Civil Estadual e Nacional, para garantir monitoramento permanente da área. Diante de indícios de esvaziamento patrimonial, o juiz ainda determinou a intimação dos sócios do Aterro Ouro Verde sobre o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa.
Em nota, a Semad contestou a possibilidade de o Estado custear a mitigação dos danos ambientais. Segundo a secretaria, não é correto utilizar recursos do Tesouro Estadual para solucionar problemas causados por uma empresa privada. A pasta sustenta que a responsabilidade pelos danos decorrentes do deslizamento ocorrido em 18 de junho de 2025 é da própria empresa, que, segundo a Semad, vem cumprindo o Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado em julho, apesar das dificuldades impostas pelo período chuvoso.
A secretaria também afirmou que esteve presente no local desde o dia seguinte ao acidente, acompanhando ações como a estabilização do maciço de lixo e o monitoramento da qualidade da água do Córrego Santa Bárbara. A Semad destacou ainda que, quando propôs um TAC emergencial à empresa, o Ministério Público optou por não assiná-lo.
Por fim, a pasta questionou decisões judiciais anteriores que permitiram a continuidade da operação do empreendimento ao longo dos anos e informou que o Estado vai recorrer da decisão.
Gestão de resíduos de aterros e lixões em Goiás expõe avanços e impasses estruturais

O caso de Padre Bernardo ocorre em meio a um cenário mais amplo e complexo da gestão de resíduos sólidos em Goiás. Um levantamento feito pela Semad no último mês, aponta que 125 municípios goianos já realizam a destinação ambientalmente adequada de resíduos sólidos urbanos, o equivalente a 72% de todo o lixo gerado no Estado, com o envio de quase 5 mil toneladas por dia para aterros sanitários licenciados, aterros temporários de pequeno porte ou, em situações específicas, sob amparo de decisões judiciais.
Apesar do avanço, a secretaria ressalta que a destinação correta não se confunde com o encerramento definitivo dos lixões. Até o início de novembro, foram emitidas 83 licenças de encerramento, enquanto 91 municípios ainda têm processos em análise e 64 permanecem irregulares por não terem sequer solicitado o licenciamento.
Goiânia, que gera cerca de 1,4 mil toneladas de resíduos por dia, integra a estatística por operar com base em decisão judicial, apesar de o aterro municipal não possuir licença ambiental de operação.
A Capital, inclusive, tornou-se um novo foco de controvérsia nesta semana. Após um ano de disputa judicial pelo direito ao autolicenciamento do lixão, a prefeitura solicitou apoio emergencial da Semad para capacitar servidores municipais na área de licenciamento ambiental de aterros sanitários. O pedido ocorreu poucas semanas depois de decisão da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás reconhecer a competência do município para realizar o licenciamento, entendimento contestado pelo Estado.
Relatório técnico emitido pela Semad em julho, apontam falhas estruturais graves no aterro de Goiânia, como risco de contaminação do solo e das águas por chorume, ausência de sistema adequado de captação de biogás e possibilidade de incêndios e explosões. A avaliação técnica indica que a recuperação do local é inviável nas condições atuais, sendo necessário o encerramento do maciço e a migração para um sistema regionalizado de destinação.
Enquanto decisões judiciais impõem medidas emergenciais, como no caso do Aterro Ouro Verde, especialistas alertam que o desafio vai além do fechamento de lixões: envolve a definição de responsabilidades, a proteção dos recursos hídricos e a construção de um modelo sustentável de gestão de resíduos em Goiás.