Inquérito apura deslizamento de terra em construção do setor Marista
Polícia Científica deve emitir laudo técnico sobre as causas do deslizamento para Polícia Civil
Gabriel Neves e João Reynol
Após o deslizamento de terra em uma construção de prédio no setor Marista, em Goiânia, moradores dos edifícios afetados pelo acidente foram à Delegacia Especializada do Meio Ambiente (Dema), nesta terça-feira (16), e fizeram registro de ocorrência. A unidade policial instaurou inquérito para identificar as causas que provocaram o episódio. Peritos estiveram no local das obras para dar início às investigações.
Para Luziano de Carvalho, titular da Dema e encarregado de investigar as causas do deslizamento, um laudo pericial deverá ser emitido pela Polícia Científica de Goiás. “O fator mais importante agora é conseguirmos o laudo técnico que nos norteará do que realmente aconteceu naquela noite, muito pelo fato de esse tipo de incidente ocorrer com muitas testemunhas e porque cada pessoa tem a sua versão”, diz Carvalho.
O delegado afirma que as investigações criminais são entabuladas para garantir a segurança dos moradores. “Nós precisamos investigar porque um desabamento pode expor as pessoas e os patrimônios delas ao risco”, afirma. “Nós temos uma parte específica para este tipo de ocorrência no nosso Código Penal, que é o artigo 256. Mas vale lembrar que ainda estamos investigando para encontrar a verdade.”
A Dema deve ouvir o engenheiro incumbido da construção da Opus Incorporadora, que é responsável pelo empreendimento. O artigo 256 do Código Penal qualifica como crime “causar desabamento ou desmoronamento, expondo a perigo a vida, a integridade física ou o patrimônio de outrem”. O texto ainda prevê reclusão — de um a quatro anos — e multa.
A Companhia de Saneamento de Goiás (Saneago) emitiu nota, nesta quarta-feira (17), em que “repudia toda e qualquer narrativa que tente imputar à companhia a responsabilidade pelo desmoronamento na rua 1.128, no setor Marista”. O incidente que ocorreu na madrugada de segunda-feira (15) provocou a evacuação de moradores de ao menos dois prédios próximos ao local onde ocorriam as obras. Parte da pista cedeu e foi interditada.
A nota segue dizendo que “assim como os moradores dos prédios vizinhos, a Saneago também é vítima do desmoronamento, que carregou parte da rede de água da Companhia” e esclarece que a adutora de 150mm de diâmetro, construída por empreiteira para atender ao Edifício Fluence Marista, “encontra-se intacta e não foi afetada pelo desmoronamento”.
“No entanto, a rede de água de 75mm – da qual derivam ramais de 20 mm de diâmetro, que atendem aos demais imóveis da rua 1.128 – foi danificada com o desmoronamento, gerando um vazamento após o ocorrido”, segue o texto. De acordo com a Saneago, a equipe da Opus teria aberto um registro de atendimento junto à companhia às 4h da manhã de segunda, em que informava sobre o vazamento decorrente do desmoronamento. Nos últimos anos, essa teria sido a única ocorrência de vazamento registrada no endereço, segundo a Saneago que diz também estar “apurando os valores dos prejuízos ocasionados pelo desmoronamento para cobrar, posteriormente, da incorporadora”.
A companhia ainda classificou como “absurda”, do ponto de vista técnico e de engenharia, a narrativa construída pela Opus de que o acidente teria ocorrido por causa do vazamento. “Ainda assim, tentar alegar, sem nenhuma prova, que eventual vazamento em ramal de rede de pequeno porte (20mm) possa causar um acidente de tamanhas proporções é, no mínimo, irresponsável”, diz a companhia ao informar, também, que tomará medidas legais contra a incorporadora.
Além disso, o jornal O HOJE apurou que houve uma denúncia pública online emitida por uma pessoa através do MP Cidadão, uma ferramenta digital do Ministério Público de Goiás (MP-GO). Segundo a entidade, um procedimento já foi instaurado na 81ª Promotoria de Justiça de Goiânia junto a órgãos municipais para coletar dados acerca do ocorrido a fim de fundamentar um inquérito civil público. Tal inquérito deverá mostrar se foi de responsabilidade da construtora o dano causado aos prédios dos moradores.
Outra investigação feita pelo Corpo de Bombeiros Militar de Goiás (CBM-GO) também encontrou danos estruturais em um dos edifícios evacuados nesta segunda-feira. Segundo os militares, o edifício Villa Lobos foi avariado pelo deslizamento e teve de ser interditado sem previsão de retorno dado aos moradores.
Por outro lado, o edifício Catas Altas já é apontado como seguro pela consultoria de engenharia “Geometria Fundações”, contratada pela construtora em laudo entregue nesta terça-feira. Parte dos moradores, no entanto, rejeitaram o laudo por ele “não compor elementos considerados cruciais” e não retornaram ao prédio.
Um acordo entre a construtora e os residentes do edifício foi firmado para a elaboração de um novo laudo técnico sobre a situação estrutural do imóvel. Em nota, a Opus Incorporadora afirma que tem “a segurança dos moradores e dos seus patrimônios em mente”. “(…) Embora o atual parecer já ateste a ausência de riscos para que o prédio volte a ser habitado, os esforços da empresa visam atender ao pedido dos moradores para que se sintam igualmente seguros” diz o texto,
Para o engenheiro ambiental Jamison Aguida, além do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Goiás (Crea-GO), os órgãos públicos, sejam estaduais ou municipais, também precisam investir mais em fiscalização de construções imobiliárias para que incidentes como esse sejam evitados. Aguida chama a atenção para o fator das mudanças climáticas, que corroboram para acontecimentos inesperados. “A população precisa ficar atenta a possíveis irregularidades e cobrar os governos para que adotem medidas”, afirma.