Os riscos do contrato de empréstimo com cartão de crédito
Reportagem do jornal O Hoje ouve especialistas sobre como empréstimo com altos juros pode comprometer vida financeira
Na primeira semana do ano as contas não paravam de chegar na casa do Evaldo de Sousa Pereira. Ele e a esposa são os provedores do vale, e arcam com uma dívida média de R$2,500 por mês. Só que os boletos de janeiro chegaram mais altos, devido aos materiais escolares dos dois filhos, além do IPTU e IPVA, e foi aí que o autônomo pensou em fazer um empréstimo utilizando o cartão de crédito.
“Veio a necessidade de conseguir pagar todas as contas nesse início de ano, e sempre que ando pelas ruas da cidade vejo os anúncios de empréstimo de cartão. Procurei o contato, conversei com o rapaz e ele me orientou tudo. Mas o que me impediu de fazer essa transação foi o valor dos juros. Eu iria pegar R$ 2 mil para pagar R$ 2,670. Foi aí que desisti e procurei um empréstimo por meio do meu banco”, relata Evaldo.
Uma coisa é certa, frequentemente tornou-se muito comum os empréstimos com cartões de crédito no Brasil inteiro, principalmente pelas pessoas que já estão muito endividadas e encontram neste tipo de operação, uma alternativa para conseguir dinheiro e pagar contas básicas de consumo, como água e energia.
Segundo o consultor financeiro, Cássio Souza, na maioria das operações os juros são abusivos, passando de 10% ao mês e em muitos casos na verdade bem acima de 20% ao mês. “Para quem já está com dificuldades financeiras, só pioram a sua situação por assumir um compromisso que provavelmente se tornará impagável. Esses juros das famosas maquininhas de cartão, que fazem a operação, são extremamente altos, deixando pessoas endividadas na forca”, expõe.
Apesar de bastante comum, por lei, pessoas e estabelecimentos comerciais não devem realizar esse tipo de operação financeira. Trata-se de uma fraude e podem responder criminalmente a essa situação. “Temos a lei, porém, em contrapartida, já vemos algumas instituições financeiras e fintech realizando isso, não com o pagamento em espécie, mas através de uma operação de fomento mercantil”, complementou Cássio.
A reportagem do Jornal O Hoje entrou em contato com alguns telefones e lojas que praticam a atividade do empréstimo via cartão de crédito. Durante a ligação, o possível empresário informou que a atividade era segura, e o dinheiro cairia em até 10 minutos na conta do cliente. “Você precisa ter seu cartão com o limite. É como se fosse uma compra. Depois de passar o cartão faço o PIX pra você aqui comigo”, contou um atendente que pediu para não ser identificado.
O consultor destacou ainda que esse empréstimo é difícil de se fiscalizar, pela quantidade de locais e pessoas que costumam fazer isso, seja pelas autoridades ou mesmo as bandeiras dos cartões. Mas em vários casos podem ocorrer inclusive sonegação fiscal, já que não existe o recolhimento de IOF, imposto que incide sobre transações de crédito e financiamentos.
“Com o tempo de realização de várias ‘vendas’ vais e enquadrando fora da atividade fim das empresas que usam suas maquininhas de cartão para esse empréstimo, o que pode causar diversos problemas contábeis, a exemplo de erros no lançamento de produtos em estoque e talvez mais a frente, um novo problema, já que existe a hipótese da empresa vender determinado produto, sem a emissão de nota fiscal para “limpar” o estoque”, exemplificou o tipo de fraude.
Na visão do economista Luís Carlos Ongaratto, o que motiva as pessoas a utilizarem do meio de ‘empréstimo via cartão’ é a falta de crédito no banco. “Às vezes para não ficar inadimplente essa pessoa prefere pagar taxa de juros muito mais elevada que a do cartão de crédito. Essa não é uma questão também de sonegação, e sim de pensar que ao pagar várias parcelas de um dinheiro, os juros são bem maiores “, exemplifica.
Ongaratto pontuou ainda que atualmente não existe nenhum regulamento específico que proíba a utilização das maquininhas para essas finalidades, porém, isso é uma distorção do que está acontecendo. “Se uma empresa ou pessoa usa para fazer uma operação financeira de empréstimo, não é recomendado. Quem está autorizado, até mesmo quem tem taxas de juros mais atrativas, são as financeiras, os bancos e outras instituições de crédito, que tem, sim, toda uma parte de governança específica para essa finalidade”, recomentou o economista.
Como essa infelizmente é uma alternativa adotada por pessoas em momentos quase que de desespero, visto que já não conseguem acesso a crédito nas instituições bancárias com juros atrativos, o consultor financeiro diz que é necessário tomar atitudes com antecedência para não chegar a este ponto.