O Hoje, O melhor conteúdo online e impresso - Skip to main content

sábado, 10 de agosto de 2024
PublicidadePublicidade
Reforma Tributária

As “compensações” no imposto do pecado da reforma tributária

Constitucionalista explica regulamentação do projeto que passou na Câmara dos Deputados e segue para o Senado

Postado em 16 de julho de 2024 por Francisco Costa
5 foto Marcos Oliveira Agencia Senado
Vale citar que a reforma tributária aprovada em 2023 no Congresso estabelece regras e guias para as cobranças dos três impostos sobre o consumo (IBS

A Câmara dos Deputados aprovou e segue para o Senado projeto que regulamenta novas cobranças da reforma tributária, na última semana. Constitucionalista e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), o advogado Clodoaldo Moreira avalia os possíveis impactos do imposto seletivo, que passou na Casa Baixa do Congresso. Segundo ele, o imposto do pecado, como é chamado, aumenta em razão de alguns produtos, como bebida, cigarro, jogos, aplicações de previdência privada, etc.

Vale citar que a reforma tributária aprovada em 2023 no Congresso estabelece regras e guias para as cobranças dos três impostos sobre o consumo (IBS, CBS e imposto seletivo). Esses substituirão cinco tributos: PIS, Cofins, IPI, ICMS, ISS. Já a regulamentação da reforma tributária define o funcionamento do imposto seletivo. Se o texto não sofrer alterações no Senado, a cobrança valerá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de determinadas categorias de bens e serviços, como os citados por Clodoaldo.

Conforme ferramenta desenvolvida pelo Banco Mundial, as taxas do imposto do pecado podem chegar a 32,9% para os refrigerantes; 46,3% para cerveja e chope; 61,6% para outras bebidas alcoólicas; e 250% no caso dos cigarros. Os dados foram estimados com base em informações repassadas pelo Ministério da Fazenda, mas não são exatos – a matéria ainda precisa terminar de tramitar no Congresso.

Clodoaldo diz que a implementação de uma tributação mais elevada sobre produtos nocivos à saúde, como álcool e cigarro, tem uma justificativa multifacetada que vai além da mera arrecadação. “O princípio fundamental é que as empresas que lucram com a venda desses produtos devem contribuir de forma mais significativa para os cofres públicos, considerando os custos sociais e de saúde associados ao seu consumo.”

O constitucionalista explica: “Existe uma discussão de que as pessoas que ‘bebem muito’ vão depender do serviço de saúde. Aqueles que fumam também, infelizmente, conforme o caso, dependem do serviço de saúde. E o serviço de saúde, o SUS, acaba respondendo por tudo e isso gera um impacto na arrecadação da saúde.”

Esta realidade,segundo ele, cria uma situação injusta onde toda a sociedade arca com as despesas de saúde decorrentes do uso desses produtos, enquanto as empresas que os produzem e vendem não compartilham proporcionalmente dessa responsabilidade. Moreira argumenta: “Se as empresas que vendem bebidas alcoólicas e cigarros, se elas poderiam, nesse caso, ser responsabilizadas, compartilhando esses prejuízos [com a saúde], pagos pelo cidadão comum. Então, com o aumento da incidência contributiva, a tentativa do governo é tentar gerar uma compensação”.

Além disso, a proposta do imposto seletivo visa também abordar questões de equidade fiscal. “A ideia do imposto seletivo é, da mesma forma, possibilitar que o cidadão que tem acesso a estes produtos que são ‘em tese de luxo’ contribua mais para o sistema”, explica Moreira.

Para ele, é importante notar que existem outros estudos que corroboram esta abordagem, levando em consideração fatores como o aumento da renda da população. Estes estudos sugerem que, à medida que a renda aumenta, a capacidade de contribuição também cresce, justificando uma tributação mais elevada sobre produtos não essenciais e potencialmente prejudiciais.

Esta estratégia tributária busca, portanto, não apenas aumentar a arrecadação, mas também criar um mecanismo de compensação pelos custos sociais e de saúde associados ao consumo de produtos nocivos, ao mesmo tempo em que promove uma distribuição mais justa da carga tributária na sociedade, avalia o jurista.

Reforma tributária

Segundo Clodoaldo, existem pontos de melhoria potencial na reforma tributária de modo geral. “Um deles é a simplificação tributária. A unificação de vários impostos em poucos tributos simplifica o sistema tributário e acaba reduzindo custos de conformidade para as empresas”, observa. Além disso, segundo ele, a mudança acaba com a guerra fiscal entre os Estados. Também conforme Clodoaldo, o novo sistema tributário promete ser mais transparente ao consumidor.

E continua a enumerar: “Não cumulatividade plena, ou seja, isso poderia reduzir o custo ao longo da cadeia produtiva; e desoneração de investimentos e exportações, podendo aumentar a competitividade da indústria brasileira.”

Já na parte negativa, ele pontua como pontos de preocupação: “Alíquota efetiva: havia preocupação sobre qual seria a alíquota efetiva do novo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), pois isso poderia impactar o custo final de produtos e serviços; setores com tratamento diferenciado: a definição de quais setores receberiam alíquotas reduzidas ou isenções era um ponto de debate, pois poderia afetar a competitividade de diferentes indústrias; impacto nos serviços: havia preocupação de que o setor de serviços poderia ser mais onerado com o novo sistema; e complexidade na transição: o período de transição de 8 anos poderia criar complexidades temporárias para empresas e contribuintes.”

Destaques na regulamentação

Depois de votar o texto-base, os deputados analisaram os chamados destaques, que nada mais é do que as sugestões de alteração no texto. A principal discussão dessa etapa foi a tributação zero da carne bovina e do frango, uma demanda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que foi defendida também pela oposição, mas que não era bem vista pela equipe econômica do governo.

E esse destaque foi aprovado. Ou seja, a carne vermelha entra na cesta básica e não pagará imposto sobre consumo. Mas um destaque que foi rejeitado pedia cobrança do chamado imposto seletivo (ou imposto do pecado) para armas. Com a rejeição, armas não serão submetidas a esse imposto, que busca taxar itens nocivos à saúde ou ao meio ambiente.

Durante a votação dos destaques, o relator, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), costurou um acordo para a aprovação da emenda que isenta carnes, sal, peixes e queijos de tributação de impostos sobre consumo. Esse foi o ponto que mais mobilizou os deputados nos últimos dias.

Apesar de o pedido ser de Lula, foi o PL, maior partido da oposição, o autor da emenda aprovada. Politicamente, é uma medida que rende resultados. É boa para o consumidor de carne, que comprará sem imposto, e para o produtor, que venderá sem imposto.

Pelo relatório anterior de Lopes, a carne teria redução de 60% no imposto, mas não estaria isenta. Por isso, após a aprovação do texto, base e oposição disputaram no plenário a “paternidade” sobre a inclusão das carnes na cesta básica nacional.

A isenção das proteínas animais representa uma derrota do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que se posicionou contrariamente a proposta nos últimos dias. Segundo os interlocutores, ele chegou a classificar a medida como “insanidade”. A equipe econômica do governo também não queria a isenção, por considerar o impacto na arrecadação.

Veja também