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sábado, 23 de novembro de 2024
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Herança

Como jornalista teve vida transformada após ‘herdar’ doença degenerativa do pai

A ataxia é um distúrbio neurológico que afeta a coordenação motora e o equilíbrio, impactando atividades cotidianas como andar, falar, comer e realizar tarefas diárias

Postado em 26 de agosto de 2024 por Ronilma Pinheiro

Em um dia que deveria ser como qualquer outro, a vida de Rodrigo Mansil, um jornalista de 42 anos, mudou para sempre. Seis anos atrás, ao receber o diagnóstico de Ataxia Espinocerebelar Machado Joseph, Mansil foi confrontado com a dura realidade de uma condição neurodegenerativa progressiva, sem tratamento específico e sem cura. O impacto da notícia foi profundo e a sua jornada desde então tem sido marcada por uma combinação de luta pessoal, coragem e um compromisso renovado com a causa das doenças raras.

A ataxia espinocerebelar é hereditária e foi transmitida a Mansil por seu pai, que também sofreu com a doença e faleceu aos 73 anos. Mansil lembra com clareza o momento em que recebeu a notícia. “Eu estava sozinho e com muito medo no dia que recebi o resultado do exame,” ele compartilha em uma postagem emocionante nas redes sociais. “Foi quando percebi que tudo mudaria e que eu viveria em um corpo pesado, cansado e doente.”

Rodrigo Mansil nasceu em Anápolis, Goiás, e desde jovem teve uma trajetória marcada pela busca do conhecimento e pela dedicação profissional. Aos 17 anos, mudou-se para São José do Rio Preto, onde cursou jornalismo, psicologia e fez pós-graduação em sexologia. Sua carreira, inicialmente voltada para o jornalismo, foi ampla e diversificada, incluindo atuação como produtor, editor, repórter e apresentador em cidades como São José do Rio Preto, Catanduva, Araçatuba e Bauru, no interior de São Paulo, além de Goiânia.

Foi em Goiânia, em 2017, que Mansil começou a notar os primeiros sinais da doença. Quedas frequentes e uma fadiga persistente levaram-no a procurar ajuda médica, culminando no diagnóstico de ataxia espinocerebelar tipo 3 no ano seguinte. A descoberta foi um divisor de águas na vida de Mansil, forçando-o a enfrentar uma nova realidade marcada pela perda gradual de habilidades motoras.

Atualmente, após seis anos enfrentando a doença, Mansil está aposentado por incapacidade para o trabalho. Ele enfrenta a progressão da ataxia com um regime rigoroso de fisioterapia, musculação e equoterapia, buscando manter sua qualidade de vida e autonomia. Sua luta pessoal, no entanto, vai além da batalha diária contra a doença. Rodrigo decidiu se tornar um defensor ativo das doenças raras e das pessoas que sofrem com condições semelhantes.

Fotos: Arquivo pessoal

Em julho de 2023, Mansil foi delegado na 17ª Conferência Nacional de Saúde, onde teve um papel fundamental na votação para a criação de mais Centros de Diagnóstico e Referência de doenças raras no Brasil, com atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Sua atuação na conferência reflete seu compromisso em melhorar o acesso ao diagnóstico e tratamento para outras pessoas que enfrentam doenças raras.

Além de seu trabalho na conferência, Mansil é voluntário da Associação Brasileira das Ataxias Hereditárias e Adquiridas (Abahe), onde contribui com sua experiência e conhecimento para a causa. Para compartilhar sua jornada e informar o público sobre a realidade dos pacientes com ataxia, ele criou o Instagram @rodri_goataxia. Em seu perfil, Mansil posta vídeos e atualizações sobre os desafios diários de conviver com a doença, além de fornecer informações valiosas sobre os diversos tipos de ataxias.

O que é a ataxia

A ataxia é um distúrbio neurológico que afeta a coordenação motora e o equilíbrio, impactando atividades cotidianas como andar, falar, comer e realizar tarefas diárias. Segundo o médico neurologista do hospital Mater Dei de Goiânia Marcos Alexandre, a ataxia se manifesta como uma dificuldade ou incapacidade de manter a coordenação motora normalmente, prejudicando movimentos voluntários que o paciente deseja executar, como levantar um objeto ou erguer um garfo para se alimentar.

A condição pode ser desencadeada por diversas causas. Entre elas estão o Acidente Vascular Cerebral (AVC), a esclerose múltipla, traumas cranianos, deficiências vitamínicas, sífilis e tumores cerebrais. Além disso, a ataxia pode ter origem genética e é classificada em diferentes tipos. Dentre eles estão: Ataxia Cerebelar, Ataxia Vestibular, Ataxia Sensorial e Ataxia de Friedreich. 

A Ataxia Cerebelar resulta de lesões no cerebelo – parte do encéfalo, a segunda maior estrutura do cérebro, que está localizada na parte inferior do órgão, logo acima do tronco cerebral – ou suas vias, levando a dificuldades no controle da musculatura axial, tremores e tendência a quedas para o lado da lesão. Os sintomas variam conforme a localização da lesão no cerebelo.

A Ataxia Vestibular é causada por danos na via vestíbulo-ponto-cerebelar, afetando o equilíbrio, coordenação e orientação espacial. Os sinais incluem desequilíbrio, vertigem, nistagmo – movimentos oculares involuntários e repetitivos -, náuseas e vômitos.

Enquanto isso, a Ataxia Sensorial decorre do comprometimento da propriocepção, ou seja, a capacidade de reconhecer a posição e orientação do corpo no espaço. Os sintomas se assemelham aos da ataxia cerebelar, mas com agravamento ao fechar os olhos, perda da propriocepção e marcha tabética, em que o calcanhar é usado com força excessiva no chão.

Originada por uma mutação genética no cromossomo 9q21.11, a Ataxia de Friedreich é a forma mais comum de ataxia autossômica recessiva. Geralmente, inicia-se entre 12 e 18 anos, apresentando ataxia cerebelar, nistagmo e disartria, ou seja, dificuldade em articular palavras, além de envolvimento do sistema nervoso periférico, com diminuição da sensibilidade vibratória e propriocepção, e alterações sistêmicas como cardiopatia, escoliose, pés cavos e diabetes mellitus.

Novo medicamento aguarda aprovação da Anvisa 

Amália Maranhão, mãe de um paciente com Ataxia de Friedreich, jornalista, fundadora do movimento Ataxia de Friedreich Brasil e diretora da Abahe, tem se dedicado à luta por soluções para as doenças de ataxia.

Ao jornal O Hoje, ela falou sobre as expectativas sobre o novo medicamento omaveloxolone, que está aguardando aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O prazo para análise do pedido vence no final de setembro, e a expectativa é se a Anvisa tomará uma decisão nesse prazo ou estenderá a análise.

O omaveloxolone já foi aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos,  e pela European Medicines Agency (EMA) da Europa.

Em Goiás, há pelo menos 23 pessoas com Ataxia de Friedreich. O medicamento omaveloxolone é destinado exclusivamente para essa condição, e a medicação para a SCA3, que afeta Rodrigo, está em fase final de pesquisa, com conclusão prevista para o final do ano, embora possa demorar mais para chegar ao Brasil.

Atualmente, a Ataxia de Friedreich Brasil conta com cerca de 4 mil pacientes no total, dos quais 740 têm Ataxia de Friedreich, 1200 têm SCA3, 1200 têm ataxia cerebelar não especificada (devido à falta de acesso a testes genéticos), e o restante está distribuído entre 20 outros tipos de ataxia. As pesquisas no Brasil estão associadas a estudos americanos, sendo chamadas de multicêntricas internacionais, o que ajuda o país a se inserir no campo de estudos sobre ataxias.

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