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terça-feira, 26 de novembro de 2024
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Crise Carcerária

Famílias de detentos fazem vigília em frente ao presídio de Alcaçuz

Elas se dividem na porta da unidade, trocam acusações e até agressões

Postado em 22 de janeiro de 2017 por Renato
Famílias de detentos fazem vigília em frente ao presídio de Alcaçuz
Elas se dividem na porta da unidade

A guerra entre o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o
Sindicato do Crime RN, na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta,
no Rio Grande do Norte, extrapolou os muros e afetou os que estão do lado de
fora da unidade à espera do fim do conflito que já dura oito dias. As famílias
dos detentos se dividem na porta da unidade, trocam acusações e até agressões.
Mulheres e crianças lidam com condições insalubres no exterior do presídio, mas
não tiram os pés da areia no local.

Na entrada da penitenciária, ripas de madeira e telhados se
equilibram junto com pedaços de alvenaria sem reboco, no local onde as mulheres
de detentos que fazem parte do sindicato se reúnem noite e dia, desde o
massacre que deixou 26 mortos no Alcaçuz. A estrutura é usada normalmente em
dias de visita. Uma pia serve de cozinha para o grupo, e um menino de pouca
idade dorme, nu, em cima do balcão.

Ao lado dessa proteção, que é praticamente a única, em um
colchão, colocado à sombra de uma árvore rasteira, uma das mulheres descansa,
enquanto aguarda novidades. No bar, ao lado do presídio, outros colchonetes se
espalham pelo chão, cortesia da dona, que permite o descanso das famílias até
fechar o estabelecimento. Quando o bar é fechado, as mulheres se transferem
para a calçada e dormem ali mesmo.

Uma casa em frente também é usada como apoio para o grupo.
“Não queremos sair daqui, temos medo que aconteça alguma coisa com eles. Deixei
meus filhos menores com minha mãe e estou aqui desde domingo. Sou manicure, mas
nem isso estou fazendo”, conta Carla* – nome fictício para presevar a
identidade das mulheres, a pedidos.

Já nos fundos do presídio, uma estrutura parecida – com um
pouco mais de espaço e partes de alvenaria – abriga mulheres de detentos do
PCC. Mais desconfiadas, las não aceitam gravar entrevistas ou tirar fotos,
mesmo de costas. A superexposição que tiveram na mídia deixaram medo e consequências.
“Meus patrões disseram que não querem mais ver a minha cara. Você faria o quê,
se a sua empregada aparecesse na televisão falando que o marido é do PCC?”,
afirma a mulher de um dos detentos.

O medo também é de retaliações. As famílias, dos dois lados,
trocam acusações de agressão. Do lado do PCC, as mulheres reclamam que as
outras foram até o local com uma enxada e ameaçaram um espancamento. “Até a voz
eu não quero gravar porque podem reconhecer. Depois que foram até a casa de uma
de nós, para matar , a gente está com muito medo”, destacou Carla*. Já as
esposas de membros do sindicato as acusam de receber provocações constantes e
admitem ter estapeado e roubado a “feira” de uma das moças do grupo
rival.

As famílias defendem as facções. Entre os familiares e os
presos, a comunicação é constante, por celular. Cada grupo defende que o outro
deu início à confusão que se transformou em um conflito sangrento e prolongado.
Não enxergam saída para a guerra nem do lado de fora. “Meu marido está baleado
aí dentro e se recusou a ir para o hospital, porque lá tem muitos do
sindicato”, diz Sheila*. Os dois lados criticam o que seria a falta de um código
de honra do rival.

“No PCC tem só estupradores. O sindicato não aceita isso,
não aceita roubar ônibus, escola. Vai roubar o povo que não tem nada? É só
tráfico”, disse Maria*, mulher de um detento do sindicato.

“O sindicato não tem respeito pelas mulheres, pelos
filhos, e não separam as coisas. Querem matar todo mundo”, afirmou Teresa*,
esposa de um preso do PCC. Na percepção de mulheres de detentos do sindicato, o
PCC recebe tratamento privilegiado. Ontem (20), as que pertencem ao grupo do
sindicato não conseguiram entregar alimentos para os detentos. Já as mulheres
dos detentos do PCC confirmaram que conseguiram repassar arroz, feijão e
cuscuz.

Em resposta ao questionamento do favorecimento do PCC na
entrada de alimentos na unidade, a assessoria de comunicação da Secretaria de
Justiça e Cidadania do Rio Grande do Norte afirmou que os presos estão sendo
alimentados com três refeições diárias e que as feiras de familiares estão
suspensas em ambos os lados.

A realidade precária, a falta de alimentos e condições de
higiene – não há banheiros disponíveis –, é comum a todas as famílias. O
sofrimento também. Enquanto as esposas do PCC se queixam da falta de segurança
e de alimentos, uma menina brinca, de calcinha, nas areias da frente do
presídio de Alcaçuz, com brinquedos de praia. A mãe a levou porque não tinha
com quem deixar. A criança parecia alheia às conversas sobre os acontecimentos
e a briga entre famílias. Mas, segundo a mãe, é só aparência. “Ela pergunta pra
mim: ‘isso é guerra, mãe? Por que ficam batendo, matando? Eu quero meu pai’”.

Foto: (Sumaia Villela) 

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