Moradores reclamam de falta de medicamentos e médicos em unidade de saúde de Goiânia
Após ser elevado ao status de UPA, antigo Cais Novo Mundo ainda sofre com falta de recursos humanos| Foto: Wesley Costa
Igor Caldas
Moradores do setor Jardim Novo Mundo reclamam de falta de médicos e fármacos na Unidade de Pronto Atendimento do bairro. O local passou por uma longa reforma no ano passado para se adequar ao padrão de UPA (Unidade de Pronto Atendimento) 24 horas Ampliada, do Ministério da Saúde (MS) e deveria atender pelo menos por 30 bairros da Região Leste de Goiânia.
O professor de dança e líder comunitário da região, Jean Popper, procurou atendimento médico para sua esposa na unidade de saúde do Jardim Novo Mundo na última segunda-feira (6), mas não havia médicos para realizar atendimento. Funcionários da UPA o orientaram a procurar por atendimento em outro bairro. “Para que construir toda essa estrutura se não há médicos para fazerem atendimento?”, questiona o professor.
“Vim procurar atendimento de urgência para minha mulher e eles me mandaram ir procurar médico no Cais do Setor Vila Nova”. Jean ainda diz que encontrou a unidade aberta, mas, sem atendimento. Ele afirma que não é a primeira vez que a unidade de saúde deixa a desejar. “Já aconteceram várias vezes. Eu já tive que trazer minha netinha com suspeita de dengue aqui e não havia pediatras”, lamenta.
“O Jardim Novo Mundo é o segundo maior bairro de Goiânia e talvez o mais populoso e temos aqui uma unidade de saúde sem atendimento médico”, lamenta. Jean defende que o prefeito Iris Rezende virou as costas para a saúde do município. “É uma vergonha e isso é culpa do prefeito que prioriza as obras da cidade, mas deixa a saúde à míngua”, declara.
A aposentada Wanda Maria Oliveira tentou pegar medicamentos contra sua ansiedade e depressão na tarde desta quarta-feira (8), mas voltou para casa apenas com a receita do medicamento. “Vim aqui apenas para pegar o remédio, mas me disseram que está em falta na rede pública”. Wanda afirma que não pode ficar sem o uso do fármaco. “Eu não tenho condições de comprá-lo, mas vou ter que dar um jeito”, lamenta.
O professor esteve com a equipe do Jornal O Hoje no local ontem e questionou a funcionária da unidade de saúde sobre a falta de médicos na última segunda-feira (6), mas teve aborrecimentos como resposta. “Fui lá perguntar se os médicos estavam de folga e o funcionário achou ruim. Quer dizer que se alguém passar mal na segunda-feira, vai morrer sem conseguir atendimento?”, questiona o líder comunitário.
Um cidadão que não quis ser identificado esperou cerca de três horas para ser atendido na UPA. “Parece que tem dois médicos aqui hoje, mas já vi aqui funcionar apenas com um. Tinha que ter mais profissionais”. O cidadão afirma que estava com sintomas de Covid-19, tentou fazer exames na unidade de saúde, mas teve que ir para um município vizinho para conseguir realizar o teste.
A unidade ganhou status de UPA em setembro de 2019. Antes funcionava um Centro de Atenção Integral em Saúde (CAIS) no local. Jean afirma que antes da reforma, o Cais estava “caindo aos pedaços” e os moradores do bairro ficaram felizes quando foi anunciado a reforma. “Demorou um tempão para reformar, gastou-se um dinheirão para nada. Do que serve essa estrutura se não existem recursos humanos?”.
Um Cais deve fazer atendimento de baixa complexidade e uma UPA atende aos casos de baixa, média, alta complexidade e transferências para hospitais por meio de ambulâncias. O Cais deve funcionar apenas com recursos municipais. No entanto, uma UPA, como a do Jardim Novo Mundo, pode receber repasses de até R$ 250 mil mensais subsidiadas pelo Governo Federal.
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) alega, por meio de nota, que na última segunda-feira até que fosse feito um remanejamento a UPA Novo Mundo ficou com apenas um profissional. Os outros dois médicos escalados para o plantão apresentaram atestado médico.
Em relação aos medicamentos, a pasta diz ainda que alguns desses prescritos pelos médicos não fazem parte da Relação Municipal de Medicamentos Essenciais (REMUME). As medicações que fazem parte da REMUME são administradas na própria unidade ou quando é de uso contínuo o paciente pode retirar nas farmácias do SUS. Quando os medicamentos não fazem parte da Relação Municipal de Medicamentos o médico prescreve a receita ao paciente e este deve adquirir a medicação por meios próprios.
Faltam profissionais também na atenção primária
A falta de recursos humanos na saúde do município também acontece na atenção primária à saúde que deveria atuar na prevenção de doenças para aliviar os Centros de Atenção Integral à Saúde e Unidades de Pronto Atendimento. A atenção primária é considerada a porta de entrada da população aos serviços de saúde onde seria possível resolver 90% dos problemas de saúde dos cidadãos.
Mais da metade da população da Capital não recebe cobertura de atenção primária à saúde (APS), prestada pelas equipes de saúde da família. Apenas 49% dos habitantes de Goiânia são atendidos nessa modalidade. De acordo com o Ministério da Saúde (MS), a cobertura ideal seria de 100% da população com a capacidade de cada equipe de Estratégia da Saúde da Família (ESF) atender, em média, 3,5 mil pessoas. Atualmente, a Capital conta com 193 equipes ESF que atuam em 59 Unidades Básicas de Saúde. O déficit chega a 1,406 profissionais.
A Estratégia de Saúde da Família (ESF) é composta por equipe multiprofissional que possui, no mínimo, médico generalista ou especialista em saúde da família ou médico de família e comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família, auxiliar ou técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS). Agentes comunitários de saúde são profissionais ligados à atenção primária que atuam dentro da comunidade, monitorando a saúde da população local e levando essas demandas para as unidades de saúde.
De acordo com a presidente do Sindicato de Servidores da Saúde de Goiás (SindSaúde/GO), Flaviana Alves, o déficit de atendimento em APS prejudica qualidade do serviço de toda cadeia da Saúde Pública, pois atua na medicina preventiva, promoção e proteção à saúde e gera economia em tratamento e procedimentos médicos. Um estudo realizado em 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que para cada dólar investido em prevenção de saúde são economizados três dólares. (Especial para O Hoje)