Usuários peregrinam em Goiânia em busca de raio-x
Falta de profissionais e técnicos da saúde municipal causam transtornos à população – Foto: Reprodução
Igor Caldas
Mesmo com 10 aparelhos de radiologia espalhados nas unidades de saúde de Goiânia, usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) tem que percorrer quilômetros para conseguir realizar um exame de raio-x na Capital. A má gestão da Saúde Municipal resulta em desassistência às demandas da população, até mesmo em Unidades de Pronto Atendimento (UPA), especializadas em receber pacientes em estado de emergência. Representante do Sindicato dos Servidores da Saúde do Estado de Goiás (Sindsaúde-GO) apontam falha na gestão e déficit de profissionais.
Uma denúncia feita à equipe do Jornal O Hoje por um motociclista que não quis se identificar revela a situação precária das unidades de atendimento à saúde em Goiânia. O motociclista foi atropelado por um caminhão na região do Residencial Jardim Itaipú na última segunda-feira (26) e foi até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do bairro, mas teve o pedido de exame de raio-x negado por falta de profissionais técnicos no local.
A secretária-geral do Sindicato dos Trabalhadores(as) do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde/GO), Flaviana Alves afirma que deixar uma Unidade de Pronto Atendimento desassistida de servidores da saúde é falha de competência de gestão. “Qual motivo de termos gestores nas unidades de saúde, se não para resolver os problemas que possam surgir ao longo dos expedientes?”, questiona.
O acidentado foi orientado pelos servidores da UPA Jardim Itaipú a procurar uma unidade de saúde mais próxima para a realização do exame. O acidentado percorreu mais de 10 quilômetros até o Centro Integrado de Atenção Médico Sanitária (Ciams), no Jardim Novo Horizonte, que conta com um aparelho de raio-x. No entanto, também não conseguiu fazer o exame nessa unidade de saúde porque foi avisado que o equipamento não estava funcionando.
Unidades de Saúde fechadas
Se estivesse em funcionamento, o enfermo poderia ir até a unidade de saúde do bairro Jardim América, mas ela permanece fechada há anos com a promessa de uma reforma que a transformaria em uma UPA. A conclusão da obra está prevista para o fim deste ano. Assim como a reforma do Cais Cândida de Moraes, e Ciams Jardim Guanabara. Sem opções, o acidentado se dirigiu até o Cais de Campinas e lá conseguiu realizar o exame de raio-X. Ele precisou percorrer quase 20 quilômetros para ser atendido.
Questionada sobre o ocorrido, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou, por meio de nota, que o raio-x da UPA Itaipú bem como as outras 10 unidades que possuem o exame, está funcionando normalmente. A Secretaria alega que a rede municipal de saúde conta com 10 locais para realização do exame de raio-X e 119 técnicos realizam plantão de 12 horas, sendo que cada técnico possui carga horária semanal de 24 horas.
No entanto, consta na nota da SMS que pela manhã do dia 26 de outubro, houve um vazamento de um equipamento de ar condicionado na UPA do Jardim Itaipú cujo conserto gerou atrasos na realização dos exames. No período vespertino, a SMS admitiu que os exames de raio-x não estavam sendo realizados na unidade porque a técnica responsável pela operação do equipamento teve uma emergência médica e não estava presente para realizar o exame.
Equipamentos
A SMS também admitiu que no Ciams Novo Horizonte há equipamento de exames de raio-x, mas encontra-se com problemas na parte elétrica que inviabilizam a realização dos exames. No entanto, a Secretaria alega que o problema está em fase de correção. Também não é possível tirar chapas de raio-x na Upa Noroeste, pois o equipamento ainda está sendo instalado.
De acordo com a nota enviada pela SMS, as unidades de saúde que realizam o exame de raio-x na rede de saúde municipal são a Upa Itaipu, Upa Chácara do Governador, Cais Campinas, CROF, Cais Vila Nova, Ciams Urias Magalhães, Cais Finsocial, Cais Amendoeiras e Upa Novo Mundo.
Sindsaúde aponta mau uso dos recursos públicos
Outra falha de gestão apontada pela representante do Sindicato dos Servidores da Saúde está relacionada ao mau uso dos equipamentos hospitalares nas unidades de saúde. “Em alguns lugares têm o equipamento, mas ele não funciona. Outros locais o aparelho continua na caixa, sem uso”. Ela afirma que quando o Cais Chácara do Governador foi reaberto, o aparelho de raio-x não saiu da embalagem e não havia sido instalado.
Não é a primeira vez que há mal uso dos equipamentos hospitalares pela Prefeitura de Goiânia. Em 2018, a Comissão Especial de Inquérito (CEI), instalada na Câmara Municipal, denunciou gasto de R$ 11.242.913,70 com a terceirização do serviço de raio-x em sete unidades da Capital. O serviço estava sendo prestado pela empresa Techcapital desde 2014 com equipamentos obsoletos e sucateados, enquanto sete máquinas adquiridas entre 2015 e 2016 estavam novas e sem uso, no almoxarifado da Secretaria Municipal de Saúde (SMS).
A Secretaria Municipal de Saúde afirma que o serviço de raio-x foi municipalizado. No entanto, para Flaviana Alves, a questão não foi suficiente para mudar a realidade do atendimento ao cidadão. “A Prefeitura de Goiânia municipalizou o serviço, mas não supriu a demanda da população”. Segundo ela, o maior desafio para o próximo prefeito da Capital será enfrentar os problemas da saúde do município. “O gestor que pegar o próximo mandato vai pegar a saúde em frangalhos”, lamenta.
Flaviana ainda diz que é natural e direito de trabalhadores se isentarem de suas funções por problemas médicos, mas o gestor da unidade de saúde tem o dever de garantir que todos os serviços oferecidos ao usuário do Sistema Único de Saúde continuem a funcionar. “A culpa de deixar a unidade de saúde desassistida não é do profissional que teve que se ausentar, mas do gestor, o papel dele é resolver esse tipo de problema”, declara.
Falta de profissionais
A representante do Sindicato ainda aponta que há um déficit profissional em todas as áreas da saúde do município desde a gestão do prefeito Paulo Garcia. “Se tiver 119 técnicos para atender a rede municipal, o que acho muito difícil, esse tipo de falha não poderia acontecer, mas temos déficit de profissional em todas as áreas da saúde municipal”, defende.
De acordo com Flaviana, as vagas disponibilizadas pelo último edital de concurso para contratação de profissionais da saúde para o município não são suficientes para cobrir o déficit desses profissionais. O concurso está suspenso devido à pandemia da Covid-19. “Este concurso já deveria ter sido feito desde o início da gestão do atual prefeito, mas assim como as obras, ele resolveu deixar tudo para o final do mandato”, lamenta.
Flaviana defende que muitos dos problemas enfrentados em todas as unidades de saúde de Goiânia são reflexo da falta de profissionais na rede. “Além da deficiência de profissionais da saúde afetar o número de trabalhadores que combatem à pandemia, também prejudica o atendimento à população na rede de saúde municipal como um todo”, garante Flaviana. (Especial para O Hoje)