Mórmon processa igreja após ser demitido por manter relação homoafetiva
A cada dois anos, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias promove uma reunião para atualizar a sua chamada credencial para autorizar a entrada de membros e funcionários. Frederico Jorge Cardoso Rocha, mórmon há 43 anos e funcionário da instituição religiosa já conhecia as perguntas: Você crê em Deus? Você paga dízimo? E sempre respondia sim à todas.
A cada dois anos, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias promove uma reunião para atualizar a sua chamada credencial para autorizar a entrada de membros e funcionários. Frederico Jorge Cardoso Rocha, mórmon há 43 anos e funcionário da instituição religiosa já conhecia as perguntas: Você crê em Deus? Você paga dízimo? E sempre respondia sim à todas.
Mas, em 22 de fevereiro, na sede da igreja no Ipiranga, em São Paulo, o líder eclesiástico responsável pela recomendação, não seguiu o roteiro. Segundo Frederico, a igreja havia recebido uma denúncia de que Rocha seria homossexual e manteria um relacionamento homoafetivo.
A igreja disse que iria “investigar” o caso. No dia 25 de fevereiro, a ex-mulher do mórmon foi procurada, mas se recusou a confirmar a denúncia ou dar mais informações e acesso aos três filhos do casal. Em março, durante uma nova reunião, a entrada de Rocha foi oficialmente negada por “violação à lei de castidade”.
O líder disse ao devoto que homossexuais podem ser aceitos pela igreja, desde que sigam a lei religiosa. “Deus ordenou que somente haja relações sexuais no casamento entre um homem e uma mulher. Esse mandamento é chamado de lei da castidade”.
Somente em abril a investigação interna chegou a uma conclusão. Frederico foi demitido por justa causa, sem direito a seguro desemprego, por não ter seguido a “recomendação para o templo”. O mórmon move uma ação trabalhista contra a igreja, mas o caso também está sendo tratado no âmbito criminal.
“Sofrer uma denúncia diante do seu empregador por ser homossexual é discriminação e o Supremo Tribunal Federal determinou que homofobia é crime” afirma o advogado criminalista Eduardo Levy Picchetto, que assina a representação, ao UOL.
Aceitação
Aos 61 anos, Rocha mora em um apartamento com seu companheiro e um cachorro maltês, chamado Nico. “Os jovens cruzarem a Paulista e flertarem é algo rotineiro. Tenho mais de 60, demorei muitas décadas para me aceitar”, disse o mórmon ao UOL.
De acordo com Frederico, o presidente da igreja tentou convence-lo a mudar de posição: “Se você quiser negar, está tudo resolvido”. Rocha confirmou a homossexualidade. “Você quer eu flerte com meu passado. Não posso fazer isso”, reafirmou.
Rocha cuidava de projetos de construção de capelas. No entanto, com a demissão, ele conta que um lado da sua vida foi retirada. “Eles [a igreja] me perguntaram o que eu queria. Meu desejo é ser reintegrado ao meu trabalho. Para mim, isto é um ato de devoção. É toda minha vida”, diz.
“Não tenho uma mácula no meu prontuário. Não se trata de uma questão trabalhista, é a vida da gente”, reforça. A Associação Brasileira da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias afirma que os funcionários aceitam voluntariamente viver conforme a doutrina, que a igreja impõe.
“Um funcionário não é demitido devido à sua identidade ou preferência sexual. A Igreja não divulga a condição ou situação como funcionário das pessoas empregadas pela Igreja”, diz a nota enviada ao TAB.
“Engraçado, não é? Eu disse como era maravilhoso chegar aos 61 com alegria. Pensava na minha vida hoje, no meu amor, em como, depois de dez anos de terapia, passei a ser agente das minhas decisões. Sabe, a vida é muito curta. Curta demais pra ser quem não se é”, completa Frederico.