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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025
saúde mental

Síndrome de Burnon: alerta para os perigos da hiperprodutividade

Especialistas explicam como a síndrome atua silenciosamente, impactando a saúde mental e ultrapassando os limites

Postado em 12 de dezembro de 2024 por Luana Carvalho
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Apontado como uma “prima” do burnout | Foto: iStock

A busca por produtividade e realizações profissionais tem sido exaltada em diversas sociedades contemporâneas. No entanto, a hiperdedicação pode mascarar sinais de esgotamento que afetam não apenas o desempenho no trabalho, mas também a saúde mental e física. Nesse contexto, uma nova síndrome vem chamando a atenção de especialistas: o burnon. Apontado como uma “prima” do burnout, a condição apresenta características sutis e, muitas vezes, ignoradas, mas que podem gerar consequências graves.

Diferentemente do burnout, que já é reconhecido como doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e frequentemente associado à exaustão extrema, o burnon está relacionado à hiperprodutividade e à falta de percepção sobre os limites ultrapassados. A neurocientista Marina Andrade, explica: “O burnon é um estado de alerta constante, impulsionado por altos níveis de cortisol, o hormônio do estresse. A pessoa continua funcional, mas atua no piloto automático, sem perceber que extrapolou limites”.

Essa condição pode afetar diferentes áreas da vida, indo além do ambiente de trabalho. Sinais como descontentamento generalizado, negligência no autocuidado e compulsões alimentares podem aparecer sem que o indivíduo identifique que está sobrecarregado. Marina destaca que “no burnon, o cansaço extremo não é evidente, o que torna o quadro mais difícil de ser diagnosticado”.

De acordo com estudos realizados pelos psiquiatras alemães Timo Schiele e Bert te Wildt, o burnon pode ser compreendido como uma forma crônica de depressão mascarada pela eficiência. Apesar de não apresentarem os sintomas mais evidentes do burnout, os pacientes com burnon vivem em um estado de insatisfação constante, o que acaba impactando sua qualidade de vida e relações interpessoais.

Histórias reais de superação

A engenheira de software Amanda Costa, de 34 anos, vivenciou na pele os impactos do burnon. Em 2019, ao ingressar em uma startup de tecnologia em Goiânia, ela se dedicava intensamente ao trabalho, acumulando horas extras e tarefas além de sua função. “Eu achava que era meu dever dar o máximo de mim, mas, com o tempo, comecei a me isolar, perdi o interesse por atividades que antes me davam prazer e desenvolvi compulsão alimentar”, relata Amanda.

A situação piorou após a chegada do primeiro filho, quando Amanda enfrentou a depressão pós-parto e foi forçada a deixar o emprego. “Mesmo sem diagnóstico, hoje entendo que vivenciei o burnon”, reflete. Atualmente, com o apoio de terapia e um emprego que prioriza o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, Amanda se esforça para evitar uma recaída.

Outra história semelhante é a de Paulo Nogueira, 42, que atuava como gestor de vendas em uma grande empresa. “Eu sentia que estava no auge da minha carreira, mas, ao mesmo tempo, tinha uma sensação de vazio. Nada parecia suficiente”, conta ele. Paulo se tornou tão absorvido pelo trabalho que negligenciou a família e os amigos. “A conta veio quando percebi que minha saúde estava em risco. Tive insônia crônica e dores de cabeça”. Hoje, ele trabalha em um ritmo mais equilibrado e busca apoio em práticas de mindfulness e exercícios físicos.

Causas e prevenção do burnon

O burnon tem causas multifatoriais, frequentemente ligadas a ambientes de trabalho exigentes e à falta de limites claros entre vida profissional e pessoal. Segundo o psicólogo Rafael Brito, a cultura corporativa que valoriza o desempenho acima de tudo é um gatilho importante. “Empregos que exigem grande investimento de tempo, como enfermagem, medicina e ensino, ou que não possuem horário fixo, tendem a ser mais propensos ao desenvolvimento da síndrome”, afirma.

O professor de psicologia organizacional Luiz Fernando Moreira aponta que o burnon também está relacionado à dificuldade de estabelecer limites pessoais. “Quem se define principalmente por suas realizações tende a ignorar sinais de esgotamento, pois acredita que o valor pessoal está atrelado ao sucesso profissional”, alerta ele.

Para Rafael, estabelecer limites claros e buscar apoio profissional são passos cruciais na prevenção. O psicólogo complementa: “Identificar sinais de desgaste e promover uma cultura de diálogo aberto no ambiente de trabalho são fundamentais para evitar a evolução do burnon para o burnout”. Ele também enfatiza a importância de práticas como feedback construtivo e iniciativas que encorajam os colaboradores a expressarem suas preocupações sem medo de retaliação.

Sinais de alerta e tratamento

Os sintomas do burnon são variados e, muitas vezes, confundidos com dedicação excessiva. Pessoas com essa síndrome tendem a se considerar inadequadas, mesmo sendo altamente produtivas, e sofrem com sentimentos de culpa e vergonha. No plano emocional, predominam sinais de depressão, enquanto os sintomas físicos podem incluir dores de cabeça, insônia, pressão alta e dores musculares.

“Mesmo durante as férias, a mente dessas pessoas está conectada ao trabalho”, alerta Rafael. O tratamento envolve intervenções multidisciplinares, como terapia psicológica, ajustes no estilo de vida e, em casos mais graves, o uso de medicamentos sob orientação médica.

Outro ponto relevante é a busca por atividades que tragam prazer e satisfação fora do ambiente profissional. O psicoterapeuta Eduardo Vasconcelos recomenda a prática de hobbies, como artesanato, esportes ou leitura. “Essas atividades ajudam a reconectar a pessoa com seus interesses pessoais e a reduzir o impacto do estresse”, diz ele.

Com a crescente competitividade no mercado de trabalho, o burnon se apresenta como um sinal de que é necessário repensar valores e prioridades. Buscar equilíbrio entre carreira e bem-estar é essencial para prevenir o esgotamento e preservar a saúde em todos os aspectos da vida. O alerta dos especialistas é claro: é hora de desacelerar antes que os efeitos sejam irreversíveis.

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