Nova proposta de isenção de IR compensa perdas da inflação, diz economista
“Há muito tempo não há essa equivalência. Portanto, o trabalhador perdeu muito com a tabela do imposto de renda tão alta”

O governo federal enviou à Câmara dos Deputados, na terça-feira (18), o projeto de isenção do imposto de renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil. A medida é uma aposta do governo Lula para melhorar a popularidade do presidente, conforme já adiantado pelo O HOJE. Conforme a economista Andreia Magalhães, a medida, mesmo que indiretamente, compensa perdas com a inflação com o passar dos anos.
“Há muito tempo não há essa equivalência. Portanto, o trabalhador perdeu muito com a tabela do imposto de renda tão alta”, avalia. “Quem está perdendo ao longo dos anos são só as pessoas que têm menos poder aquisitivo e, com o real desvalorizado, inflação pressionando, taxa Selic alta, dólar alto, isso [a isenção] ajudaria em muito a população brasileira.”
Para a economista, o impacto natural é que o governo arrecadará menos tributos. Por outro lado, para quem está na faixa 5 (acima de R$ 4.664,68, 27,5% de IR), o desconto é muito alto. “Na verdade, R$ 5 mil parece muito, mas é pouco mais que três salários-mínimos. Portanto, a medida vai agradar muito o trabalhador e é justa pelo valor cobrado. Contudo, o governo federal perde em arrecadação”, diz Andreia.
Sobre a compensação, seria aumentar a cobrança de quem ganha muito, declara. “Se for necessário, reavalia-se a tabela para quem acima de R$ 50 mil. O governo federal tem, sim, que se mexer. Os deputados, os senadores, os ministros e todos que detém o poder precisam ajudar a população brasileira para termos uma economia mais forte. E não é estrangulando as pessoas que ganham pouco que se faz uma economia pujante. Na verdade, é sabendo aplicar os valores arrecadados e, para isso, todos precisam ajudar à sociedade e ao País”, arremata.
De fato, a expectativa do governo é a taxação daqueles que ganham acima de R$ 50 mil por mês, ou seja, R$ 600 mil por ano. Assim como a tributação de dividendos.
Promessa
Isentar essa faixa do IR é promessa de campanha de Lula. Na segunda-feira (17), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a isenção custará cerca de R$ 27 bilhões em 2026 ao governo federal (valor que deixará de arrecadar).
Ele explicou que a ideia é implementar a faixa de isenção a partir de 2026 – ano eleitoral, vale ressaltar. Inicialmente, o valor estimado de não arrecadação ou para compensação era de R$ 32 bilhões, mas a equipe econômica fez um recálculo.
“Foi um recálculo porque esse ano vai ter uma pequena correção depois do Orçamento. Este ano vai ter uma pequena correção por conta do aumento do salário-mínimo. Então, muda a base [para alterar o limite de isenção]”, disse Haddad a jornalistas.
Análise
Conforme o professor e cientista político Marcos Marinho, por se tratar de uma promessa de campanha, caso passe, retira uma arma da oposição [de denunciar o não cumprimento] e dá um pouco mais de credibilidade ao governo, além de gerar uma sensação positiva por parte de uma base eleitoral que é imensa, uma ‘classe média baixa’.
“Pode acontecer de mais pessoas entrarem na formalidade, de declarar o real, colocar CPF na nota, por perder o medo de ser taxado. Essa isenção deixa um ambiente melhor e coloca um pouco mais dinheiro para circular. Então, existe o ganho de imagem, tanto da base eleitoral, quanto de desarmar um discurso da oposição.” Ele avalia, contudo, que há o elemento de renúncia fiscal, que precisará ser complementado. A depender do que for feito, poderá abrir outra crise.
Pode não surtir efeito
O especialista em políticas públicas e professor Luiz Signates avalia que a fragilidade de imagem do governo Lula se deve muito mais ao que no marketing político a gente chama de “cansaço de material”, que é a perda de popularidade decorrente da longevidade de um grupo político no poder, do que a episódios específicos relacionados à economia ou à comunicação.
“Quando isso ocorre, atos positivos têm muita dificuldade de repercutirem fortemente na imagem, enquanto ocorrências negativas, ainda que pequenas, causam facilmente uma repercussão maior. É o eleitor como que cansado do mesmo, ainda que bom”, detalha.
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Ele diz não ter uma pesquisa sobre o tema, mas que, caso esse diagnóstico esteja correto, “a repercussão das bondades do governo Lula será sempre pequena, e o governo terá que prosseguir num esforço muito grande para obter a necessária aprovação que o tranquilize para as próximas eleições”.
Outro aspecto relevante é que, se esse for o diagnóstico correto, o problema do governo não é a oposição, diz o professor. “Eu diria que, caso Lula não consiga a margem necessária para vencer as próximas eleições, ganhará será quem, em uma postura de centro-direita, moderada, conseguir ‘roubar’ as bandeiras do petista e convencer a população de que avançará no processo de distribuição de renda, combate à miséria e avanço nos direitos humanos.”
Signates reforça que o diagnóstico dele se “baseia na hipótese do ‘cansaço de material’.
A parte da população que votou em Lula e tende a não querê-lo mais, não quer também uma alternativa de governante que ‘governe para os ricos’. A direita moderada e democrática tem que saber disso, se não quiser perder de novo”.
Desaprovação
Pesquisas de satisfação mostram uma queda gradual na popularidade do presidente, o que tem gerado preocupação dentro do próprio Partido dos Trabalhadores (PT). Diferentes fontes ligadas à sigla apontam que, ao longo dos próximos meses, a principal estratégia do governo será a recuperação dessa popularidade, com foco na implementação de promessas feitas durante a campanha eleitoral de 2022. A ideia é chegar forte em 2026.
Pesquisa Ipsos-Ipec divulgada na última semana mostra que a avaliação negativa do presidente Lula (PT) superou a positiva pela primeira vez neste mandato. Na ocasião, 55% desaprovavam o petista. Em dezembro, eram 46% pelo mesmo instituto. Já a aprovação foi de 40% contra 47% no levantamento anterior.
A desaprovação feminina, que era de 43%, subiu para 52%, enquanto a aprovação caiu de 48% para 42%. No Nordeste, área em que o presidente sempre vai bem, ele era desaprovado por 31% e chegou a 43%. Também houve queda entre os que aprovam o gestor na região: a descida foi de 66%, em dezembro, para 53% na última semana.
Outro recorte foi por religião. Entre os evangélicos, a desaprovação subiu de 56% para 66%, enquanto a aprovação caiu de 38% para 30%. Queda também entre os católicos: os 54% que aprovavam em dezembro agora são 50%, enquanto os que desaprovavam subiram de 40% para 45%.
A pesquisa Ipec-Ipsos ouviu 2 mil brasileiros maiores de 16 anos em 131 municípios pessoalmente entre 7 e 11 de março. O levantamento tem 95% de nível de confiança e margem de erro de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.