O nome por trás das músicas mais tocadas do sertanejo
Conhecido por assinar hits do sertanejo moderno, Marcelo Melo revisita a carreira, revela bastidores e explica como reencontrou o ritmo após dois anos parado
Ele já foi motoboy em São Paulo, fã de Legião Urbana, cozinheiro de chambaril para amigos do Sul e jogador apaixonado pelo Mirassol. Mas é nas entrelinhas das grandes canções que Marcelo Melo se tornou realmente conhecido. Autor de sucessos como Mudando de Assunto, Tinta de Amor, Pra Que Juízo? e Impasse, gravados por Henrique & Juliano, Bruno & Marrone, Jorge & Mateus e Marília Mendonça, o compositor relembrou sua trajetória no episódio da última segunda-feira (14) do podcast MandaVê, apresentado por Juan Allaesse.
Com mais de três décadas de carreira e parcerias com nomes centrais do sertanejo moderno, Marcelo não romantiza o processo. Pelo contrário, disse ter adoecido com o ritmo da indústria fonográfica. Após anos compondo em alta intensidade, foi vencido pela ansiedade. Passou dois anos sem escrever uma única linha. “Me trancava no banheiro com dor de barriga, era meu único lugar seguro”, contou no podcast. O bloqueio criativo foi quebrado de forma abrupta, numa manhã solitária em São Paulo, quando compôs duas músicas de uma só vez, no intervalo de algumas horas.
A entrevista percorre memórias da infância e juventude em São Paulo, onde ele cresceu ouvindo música internacional dos anos 1980 e, aos sete anos, já arriscava versões de hits americanos. Passou pelos bares paulistanos interpretando rock nacional até ouvir É o Amor, de Zezé di Camargo & Luciano, e decidir migrar de vez para o sertanejo. Começou tocando em botecos, até ser gravado pelas primeiras duplas — entre elas, os irmãos Johnny e Filó, do interior de Goiás.
O marco inicial de sua virada profissional foi a música Fã Número 1, gravada por Eduardo Costa e composta em parceria com Fátima Leão. Apesar de ser reconhecida como obra da letrista goiana, a canção abriu portas e rendeu os primeiros ganhos significativos para Marcelo. “Todo mundo dizia que era só da Fátima. Eu precisava andar com papel para provar que também era minha”, relembra, rindo.
A presença de Fátima Leão, uma das principais compositoras do gênero, é recorrente em sua fala. Segundo ele, trabalhar com Fátima era um exercício de velocidade e humildade. “Ela fazia uma música inteira enquanto você ainda estava escolhendo a primeira rima”. Foi com ela que ele escreveu, entre outras, Sou Seu Fã, música que considera inspirada na estética lírica de Dois Corações e Uma História.
Outra presença constante na carreira é a de sua companheira de vida e de composição, Vivi Abreu. Foi com ela que Marcelo estruturou boa parte de seu repertório mais popular, incluindo sucessos como Mudando de Assunto e Não Fala Meu Nome, gravadas por Henrique & Juliano. A relação profissional e afetiva fundiu-se de tal forma que, nas palavras do próprio compositor, “não existe mais a minha história separada da dela”.
Marcelo também revisitou as experiências com artistas em começo de carreira, como foi o caso de Marília Mendonça. “Ela era um furacão. Trabalhei com ela em dois projetos. Mas a Fátima ainda era mais rápida”, contou, numa comparação que arrancou risos do apresentador. Além de Marília, ele contribuiu com composições para Daniel, Zezé Di Camargo & Luciano, Gusttavo Lima, Munhoz & Mariano, Maria Cecília & Rodolfo e Paula Mattos.
No episódio, há espaço também para falar da vida longe dos palcos. O compositor lembra com afeto dos tempos em que fazia entregas de moto pelas ruas da capital paulista, quando ainda usava guias impressas para se localizar. “Era tudo no xerox. Cinco mata-burros e uma porteira”, brincou. Hoje, aos 49 anos, ele divide o tempo entre sessões de composição, partidas de futebol com amigos e churrascos regados a cachaça e memórias, de preferência, em Mirassol, cidade e clube de futebol que adotou como segunda casa.
Questionado sobre o momento em que decidiu voltar a escrever, o artista foi direto. “Quis provar para mim mesmo”. Esse desejo se realizou recentemente com a gravação de uma canção inédita por Luiza Martins e Marília Tavares, que ainda não foi lançada oficialmente.
A entrevista também revelou uma faceta pouco conhecida: a de Marcelo como mentor de novos talentos. Ele organizou acampamentos criativos com jovens compositores como Mateus de Pádua e Cristian Ribeiro. Relembrou ainda parcerias com nomes como Ivan Miyazato, Pepato e Dudu Borges. “Fizemos músicas para o Jorge, para o Henrique e para a Marília. Mas o mais importante sempre foi compor com verdade”.
Aos 49 anos, Marcelo Melo segue ativo no mercado musical, mas afastado da lógica industrial que marcou parte da sua trajetória. Depois de compor para os principais nomes do sertanejo, ele reorganizou prioridades e passou a adotar um ritmo próprio de produção. O que antes era rotina virou processo seletivo, com foco em projetos nos quais se reconhece. A pausa forçada deu lugar a uma retomada menos acelerada, mas mais consciente do lugar que ocupa na cena.