Cigarro eletrônico preocupa médicos no Dia Mundial de Combate ao Câncer de Pulmão
Especialistas alertam para os riscos do uso dos vapes, especialmente entre jovens
O Dia Mundial de Combate ao Câncer de Pulmão, lembrado nesta sexta-feira (1º/8), reforça o alerta de especialistas sobre os riscos dessa doença, que é uma das que mais matam no Brasil. Embora o tabagismo tradicional continue sendo o principal fator de risco, responsável por mais de 86% dos casos, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca) , o uso crescente de cigarros eletrônicos nos últimos anos tem se tornado uma nova preocupação, sobretudo entre adolescentes e jovens adultos.
Estudo divulgado em 2024 pela Fundação do Câncer, com base em dados da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, projeta que os casos de câncer de pulmão no país devem crescer 65% até 2040, e a mortalidade pode aumentar 74%, caso o padrão atual de consumo de derivados do tabaco se mantenha.
A pneumologista Daniela Campos, que atende no centro clínico do Órion Complex, em Goiânia, destaca como a aparência e o apelo visual desses produtos contribuem para sua popularização entre os jovens. “O cigarro eletrônico, o famoso vape ou pod, atrai muitos jovens pela nova roupagem, alguns são até customizados. Além disso, não tem cheiro ruim e tem sabores, não tem aquele gosto ruim do alcatrão igual ao cigarro convencional.”
Ela explica que, apesar da narrativa inicial de que os cigarros eletrônicos ajudariam a abandonar o tabaco, a proposta se mostrou enganosa. “A indústria começou com esse engodo, de que estavam lançando um produto para que ajudasse as pessoas a parar de fumar e algumas acreditaram, porque foi falado que existia uma quantidade de nicotina em gotas que a gente conseguia tatear. Por exemplo, o paciente fumava 20 cigarros, então a gente ia começar com o eletrônico com X gotas. Só que isso nunca existiu para nós médicos, porque a gente nunca soube a real quantidade de nicotina que tinha naquela gota. E a maioria desses cigarros eletrônicos já vinham com THC, que é um derivado da maconha.”
Embora sejam produtos recentes, os dispositivos já estão associados a uma série de complicações graves. “Mesmo sendo um produto novo é uma droga que já vem sendo estudada há um tempo. Em 2019 vários jovens faleceram de uma doença chamada EVALI, que é um dano alveolar difuso que vem causando nesses pacientes que levam a uma insuficiência respiratória aguda grave por um tapetamento, como se fosse um cimento que gruda no pulmão. Os pacientes internam como se fosse uma pneumonia e não é”, explica.
A médica também aponta outras doenças relacionadas. “Recentemente também foi descoberto o pulmão de pipoca, que é uma bronquiolite obliterante. E várias outras alterações sem serem pulmonares, como risco de câncer de boca, laringe, AVC, infarto, etc.”
Mesmo quando há alegações de que os usuários conseguem controlar a dose de nicotina ou escolher substâncias supostamente menos nocivas, Daniela contesta. “É muito difícil controlar a quantidade de nicotina, mas mesmo que não tenha nicotina, tem o derivado da maconha, que é o THC. E mesmo que não tenha THC, tem amônia, propilenoglicol, chumbo, produtos extremamente tóxicos, nocivos e cancerígenos para o pulmão. Então vai fazer mal praticamente do mesmo jeito.”
Ela também reforça que os danos não se limitam a quem usa os dispositivos. “A sua fumaça também tem substâncias tóxicas que podem levar ao enfisema e doenças pulmonares, como uma asma, em quem não é o fumante, mas inala essa fumaça.”
Projetos de lei sobre a regulamentação dos cigarros eletrônicos tramitam no Congresso Nacional, mas enfrentam resistência de entidades médicas. Daniela é taxativa sobre o posicionamento da categoria. “Nenhuma das sociedades médicas sérias apoiam a legalização do cigarro eletrônico, já que a gente viu que países como a Inglaterra e Reino Unido, que liberaram o uso dele, estão penando hoje com internações e a falta de leito por conta da EVALI e do pulmão da pipoca, que é a bronquiolite. E com jovens de 12, 13 anos usando, porque foi permitido. Então, nós somos contra. A Sociedade Goiana de Pneumologia é contra. A Sociedade Brasileira de Pneumologia é contra. Continuaremos contra.”