Meses após a retirada de ambulantes, Rua 44 registra mudanças no comércio e na circulação
Medida trouxe ganhos para lojistas e segurança, mas levanta críticas sobre impactos sociais
A retirada dos vendedores ambulantes da Rua 44, em Goiânia, modificou a paisagem do principal polo de confecções da Capital. A medida foi determinada pelo prefeito Sandro Mabel e executada com apoio da Guarda Civil Metropolitana (GCM), que mantém desde então um patrulhamento constante na região. Para os lojistas, a medida trouxe ganhos imediatos. Já clientes dizem que os camelôs faziam parte da identidade e dos preços acessíveis da área.
A operação foi iniciada em abril e teve como objetivo liberar as calçadas, reduzir ocorrências criminais e organizar o comércio, e de acordo com um levantamento feito pela prefeitura de Goiânia, cerca de 700 ambulantes atuavam na região.
Segundo o inspetor Marcos Alexandre Couto, da coordenadoria de apoio à fiscalização da 44, a atuação resultou em avanços visíveis. Couto também destacou que a medida contribuiu para reduzir os registros de furto, roubo e tumulto: “Houve queda significativa nesse tipo de ocorrência desde o início do trabalho […] a gente teve uma diminuição de mais de 95% nas ocorrências de furto na região”.
E pontuou que “A Guarda Civil Metropolitana, a gente, sempre está trabalhando com mais de 10 agentes dia. No serviço de patrulhamento preventivo e ostensivo e o apoio à fiscalização de posturas […] Em média, cinco viaturas dia, podendo chegar até mais de 30, caso seja necessário.”
Lojistas relatam que as vendas aumentaram após a liberação das calçadas. “Antes tinha muita briga na porta da loja. Os clientes não vinham, só pediam online. Agora eles entram na loja, a gente vende mais”, disse uma vendedora. Outro comerciante da região contou que a mudança foi essencial para a visibilidade dos estabelecimentos. “Nossa loja agora aparece. Antes, não via. E as pessoas tinham medo de vir.”
João Pedro Marinho, que atua há 23 anos na 44, considera que a concorrência com camelôs era desleal. “A gente paga imposto e eles não. Vendem a mesma roupa pelo mesmo preço. E ainda atrapalham com confusão, atrito com o Rapa. O cliente fica assustado.” Outra lojista pontuou que “Ficou bem melhor bem melhor para as pessoas que compram, para os clientes ficou bem melhor porque antes não tinha nem como passar para, você queria atravessar a rua, não tinha como, né? Agora sim, agora tem como.”
Para consumidores que frequentam a região há anos, no entanto, a ausência dos ambulantes afeta os preços e a diversidade. “Tinha de tudo e a gente conseguia pechinchar. Agora ficou tudo mais caro. Parece que tiraram o espírito da rua”, avalia uma cliente do Entorno do Distrito Federal, que preferiu não se identificar. Outra visitante de Aparecida de Goiânia disse que os ambulantes “faziam parte da tradição”.
A Rua 44 é um dos maiores polos de vestuário popular do País, com centenas de lojas e forte movimentação de sacoleiros e turistas, especialmente em feriados e fins de semana. Antes da medida, as calçadas eram tomadas por barracas improvisadas, e motoristas de aplicativo relataram dificuldade para circular ou parar na região.
Lucas Matalos, lojista da área, considera a mudança positiva. “Antes os ambulantes ficavam 24 horas. Uber não conseguia chegar, o pessoal desanimava. Aquele tanto de barraca atrapalhava muito o comércio.” O comerciante também faz um contraponto sobre outros períodos: “Em 2019 eles ficavam em horário que era determinado. Eles (os ambulantes) abriam noite e ficavam de madrugada, então era mais organizado e tal, eu acho que a gente vendia melhor na época.”
Apesar de reconhecerem uma melhora na situação, os comerciantes da região avaliam que ela ainda não foi significativa. Eles destacam, no entanto, que a organização foi um ponto positivo. “Na organização mesmo, o pessoal fica mais confiante de vir, de andar, de pesquisar, porque querendo ou não eles ficam muito em cima das pessoas também. Então eu acho que melhorou um pouco nesse sentido. Não consigo dizer se é 50%, não. Melhorou uns 10%, 15%”.
A GCM informou que continua realizando rondas constantes no local e atua em parceria com fiscais de postura para manter a organização urbana. “Nosso trabalho não é só de repressão, é de orientação. Quando a gente retira os ambulantes, muitos voltam e tentam insistir. A gente dialoga, mas precisamos garantir o que está previsto no Código de Posturas”, reforçou.
Em uma nota exclusiva da Associação Empresarial da Região da Rua 44 (AER44) enviada para o jornal O HOJE foi ressaltado que a decisão da prefeitura contou com amplo apoio da Associação Empresarial da Região da Rua 4. E que “a retirada foi feita dentro da lei e de forma negociada e sem proibir o direito ao trabalho de ninguém, uma vez que a grande maioria dos ambulantes foram alocados em outras áreas”, diz o informe.
A AER44 também pontuou que “estimamos que essa realocação dos ambulantes e a contínua fiscalização da região resultaram num aumento de aproximadamente 13 milhões de reais por mês no volume financeiro movimentado na Região, por mês.”
Apesar dos benefícios apontados por comerciantes, movimentos populares cobram alternativas para os vendedores informais. “Não se pode tratar como caso de polícia um problema social e econômico”, disse um ativista. “Essas pessoas precisam trabalhar. O que falta é política pública.”