O Hoje, O Melhor Conteúdo Online e Impresso, Notícias, Goiânia, Goiás Brasil e do Mundo - Skip to main content

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
mandavê

Vida editada nas redes influencia percepção pessoal

Consciência crítica sobre o que se consome e publica ajuda a evitar comparações prejudiciais

Luana Avelarpor Luana Avelar em 13 de agosto de 2025
WhatsApp Image 2025 08 12 at 13.25.11 1
No MandaVê, psicólogas e empreendedora examinam como a vitrine digital redefine desejos, reorganiza relações e interfere na forma de lidar com a própria história. Foto: Bruna Caetano

O último episódio do podcast MandaVê, apresentado por Juan Allaesse, na última segunda-feira (11), abriu espaço para um mergulho nas consequências emocionais da hiperexposição digital. Sentadas diante dos microfones, a psicóloga Ludmila Paim, a psicóloga Maya Lell e a empreendedora Marilia Slywitch conduziram uma conversa que transitou entre casos clínicos, vivências pessoais e análises sociais, com atenção à maneira como as redes sociais moldam comportamentos e percepções.

Maya abriu a conversa com um caso emblemático. Uma paciente se sentia triste por não ter viajado para esquiar com amigas. Ao explorar a queixa, percebeu que não gostava de neve e nunca sonhara com esse tipo de viagem. A sensação de perda não vinha de uma experiência que queria ter vivido, mas do contato repetitivo com imagens que despertavam um desejo alheio. Essa percepção levou a psicóloga a comparar a atualidade com o início de sua carreira, quando os problemas trazidos pelos pacientes pareciam mais ancorados na realidade cotidiana e menos contaminados por vidas exibidas na tela.

A partir daí, o diálogo se voltou para a lógica de construção dessas imagens. Marilia destacou que o conteúdo publicado nas redes sociais é planejado para omitir falhas, criar narrativas e sustentar um padrão de apresentação. Ludmila reforçou que o que se mostra é apenas um recorte mínimo, produzido com intenção. Para ilustrar, Maya apontou para o próprio estúdio: um bolo sobre a mesa que, visto de um ângulo, parecia intacto; de outro, mostrava-se partido. Essa escolha de enquadramento não é neutra. É a mesma que define o que será visto e o que será ocultado na vitrine digital.

Essa curadoria pessoal conduz a outro ponto: a influência sobre o consumo e o comportamento. Marilia contou que, anos atrás, aceitou um relógio caro oferecido pelo ex-marido não por utilidade, mas pelo status que simbolizava. Com o tempo, percebeu que o objeto não lhe dizia respeito e decidiu doá-lo. Ludmila usou o exemplo para falar da importância de decisões guiadas pelo autoconhecimento, e não pelo desejo de replicar padrões externos. Essa reflexão se conectou à experiência clínica de Maya, que vê cada vez mais relações afetivas permeadas pela vigilância digital. Curtidas, comentários e interações mínimas funcionam como gatilhos para desconfiança e conflito, deslocando o foco da relação para a interpretação do comportamento online.

O impacto das redes, no entanto, não se limita à vida afetiva. Durante a pandemia, o exercício da psicologia foi obrigado a migrar para o ambiente virtual, e as adaptações nem sempre foram simples. Maya recordou sessões online em que pacientes buscavam privacidade improvisada na cozinha ou no banheiro. Além da limitação técnica, há perdas sutis: um pé inquieto ou um olhar evasivo podem desaparecer na tela.

Nesse contexto, apresentaram a Terapia EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing), abordagem criada por Francine Shapiro no fim dos anos 1980 e aprovada pela Organização Mundial da Saúde para o tratamento do Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Estudos apontam resultados positivos também para ansiedade, luto, depressão e outras condições. O método utiliza estímulos bilaterais, visuais, táteis ou auditivos para ajudar o cérebro a processar memórias perturbadoras, permitindo que o passado deixe de provocar sofrimento.

A conversa trouxe ainda relatos pessoais sobre traumas e repressão emocional. Marilia contou que perdeu a mãe aos sete anos e só conseguiu falar sobre isso na terapia, décadas depois. Ludmila explicou que traumas nem sempre vêm de grandes tragédias: situações cotidianas também podem gerar impactos profundos.

Outro ponto discutido foi a adultização de crianças nas redes sociais e na mídia. Ludmila lembrou que, historicamente, a televisão já expôs crianças a conteúdos sexualizados, citando programas como a “Banheira do Gugu”. Hoje, com a internet, a escala é maior e a indústria pornográfica alcança públicos cada vez mais jovens, inclusive com casos envolvendo menores de idade. As convidadas ressaltaram a importância de denúncias como a feita pelo criador de conteúdo Felca, que expôs influenciadores envolvidos em conteúdos que erotizam crianças.

O episódio encerrou com um consenso: é preciso desenvolver consciência crítica sobre o que se consome e se publica, lembrando que a vida exibida nas redes é um fragmento editado da realidade. Reconhecer essa limitação pode ser o primeiro passo para diminuir a pressão das comparações e recuperar um olhar mais autêntico sobre si e sobre o outro.

Siga o Canal do Jornal O Hoje e receba as principais notícias do dia direto no seu WhatsApp! Canal do Jornal O Hoje.
Tags:
Veja também