Vereadores pressionam prefeitura a rever fechamento do Goiânia Ouro
Em reunião da Comissão de Cultura, parlamentares classificam medida como “inapropriada” e se comprometem a oficiar o Paço e o secretário de Cultura
Na manhã da última terça-feira (7), o Cine Goiânia Ouro voltou a ser tema de embate político na Câmara Municipal. Em reunião ordinária da Comissão de Cultura, vereadores de diferentes partidos se uniram em defesa da manutenção do espaço, após o anúncio da prefeitura de que o local deixará de receber atividades culturais a partir do fim do ano. O encontro reuniu Fabrício Rosa, Anselmo Pereira, Henrique Alves e Léo José, todos críticos da decisão do prefeito Sandro Mabel.
O debate foi iniciado por Fabrício Rosa, que classificou o fechamento como “inapropriado” e destacou o caráter simbólico do espaço. “Recebemos uma enxurrada de reclamações da classe cultural. Estamos falando de um equipamento com 55 anos de história, que recentemente passou por uma reforma paga com recursos públicos. Não há justificativa plausível para desativar um espaço tão acessível e central”, afirmou. Para ele, a medida representa perda de autonomia da política cultural municipal, que passaria a depender exclusivamente de agendas em equipamentos estaduais, como o Teatro Goiânia e o Centro Cultural Oscar Niemeyer.
Patrimônio urbano e afetivo
O decano da Câmara, Anselmo Pereira, resgatou lembranças pessoais para reforçar a defesa do Cine Ouro. Ele recordou ter participado da inauguração do espaço em 1968, quando ainda era jovem. “Lembro-me do primeiro filme exibido, lembro do senhor Walter, responsável por tantos cinemas da cidade. O Ouro sempre foi um ponto de encontro, um motivo de requalificação do centro. Se começarmos a fechar esses espaços, corremos o risco de esvaziar ainda mais a região”, disse.
Anselmo comparou a situação com a de outros cinemas de rua que desapareceram. Citou, por exemplo, o Cine Avenida, na Avenida Anhanguera, que acabou transformado em igreja. “Não tenho nada contra templos religiosos, mas o que se perdeu ali foi irreparável do ponto de vista cultural. Não podemos repetir o mesmo erro com o Cine Ouro”, alertou.
Economia e contradições
Outro ponto levantado pelos vereadores foi o custo de manutenção. A prefeitura tem justificado a medida com base em questões financeiras. Para Henrique Alves, porém, o argumento não se sustenta. “Não há custos exorbitantes com aquele espaço. Pelo contrário, os dividendos sociais e culturais superam em muito qualquer despesa. É um dos poucos lugares públicos ainda disponíveis no centro para a realização de eventos”, avaliou.
Anselmo chegou a propor a destinação de emendas impositivas parlamentares para bancar parte das despesas. “Se a questão é financeira, podemos nos organizar. Não é aceitável que se use o orçamento como desculpa para encerrar um espaço de tamanha relevância. O custo não pode ser colocado acima da função cultural e social que ele cumpre”, disse.
Mobilização e ofício conjunto
Ao longo da reunião, os parlamentares convergiram em torno de um encaminhamento comum: a elaboração de um ofício, assinado coletivamente, pedindo ao prefeito e ao secretário de Cultura que revejam a decisão. A sugestão partiu de Fabrício Rosa, que também propôs uma audiência formal da comissão com o titular da pasta.
Henrique Alves se comprometeu a intermediar o encontro. “Vou ligar para o secretário e marcar essa audiência. Esse é um assunto de grande relevância para Goiânia, e precisamos apresentar alternativas concretas”, declarou.
O vereador Léo José também reforçou apoio à mobilização. “Muitos dirigentes tratam cultura como sinônimo de shows grandiosos, que reúnem multidões. Mas cultura é também a preservação de espaços como o Cine Ouro, que formam público e dão oportunidade a diferentes expressões artísticas. Conte comigo”, disse.
Espaço em disputa
Incorporado à Secretaria Municipal de Cultura em 2006, o Cine Goiânia Ouro consolidou-se ao longo das últimas décadas como referência para o cinema de arte, concertos, apresentações teatrais e projetos de formação de público. Foi palco de festivais, mostras, oficinas e espetáculos que marcaram gerações.
A decisão de encerramento das atividades gerou reação imediata da sociedade civil. Entidades como o Fórum Goiano de Mulheres da Cultura já divulgaram carta pedindo a manutenção do espaço. Produtores e artistas também se manifestaram nas redes sociais, classificando a medida como “um retrocesso” e “um contrassenso”, sobretudo porque o teatro passou por reforma entre 2023 e 2024.
Para Fabrício Rosa, a resposta precisa ser política e coletiva. “Se é um espaço consolidado, acessível e com 55 anos de história, por que fechar?”, questionou.
Próximos passos
Ao final da reunião, ficou definido que uma minuta do ofício será redigida e encaminhada aos vereadores para sugestões e ajustes. A expectativa é que o documento seja protocolado nos próximos dias. O grupo pretende, ainda em outubro, realizar a audiência com o secretário de Cultura.
Embora a prefeitura insista que outras estruturas, como o Teatro Goiânia e o Cine Cultura, possam absorver as atividades, os vereadores argumentam que um prédio não substitui outro. A disputa em torno do Cine Ouro, portanto, ultrapassa a lógica administrativa: trata-se de memória, identidade e permanência de um espaço que ajudou a moldar a vida cultural do centro da capital.

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