Chuva alaga Goiânia, deixa moradores ilhados e expõe falhas na resposta ao temporal
Chuva intensa arrastou carros, deixou motorista preso sobre o teto do veículo e provocou alagamentos em pontos já conhecidos da capital, reacendendo críticas à drenagem e ao planejamento urbano
Goiânia registrou mais uma tarde de caos no último sábado (6), após uma forte chuva que, em menos de uma hora, transformou ruas em rios e deixou moradores ilhados em diversos bairros da capital. A tempestade começou por volta das 14h30 e rapidamente provocou pontos de alagamento, transbordamento de córregos e enxurradas que arrastaram veículos e levaram pedestres.
A Defesa Civil chegou a emitir alerta de perigo, mas muitos moradores afirmam que a notificação só apareceu quando a situação já era crítica. Em vídeos divulgados nas redes sociais, é possível ver carros submersos na Marginal Botafogo, feirantes tentando salvar mercadorias e pessoas sendo resgatadas em áreas onde a água subiu de forma repentina.
A Marginal Botafogo, a Avenida 87, o Setor Pedro Ludovico e regiões próximas ao Areião voltaram a figurar entre os pontos mais afetados da chuva, cenário que se repete todos os anos durante o período chuvoso. As equipes da Comurg e da Defesa Civil trabalharam na remoção de árvores, limpeza de vias e auxílio a motoristas que ficaram presos. Mesmo assim, moradores e especialistas reforçam que a cidade ainda depende de soluções estruturais para enfrentar temporais cada vez mais intensos.
Entre os casos que mais repercutiram está o de Manoel Batista, de 55 anos, motorista de aplicativo que ficou completamente ilhado, devido a chuva, na Marginal Botafogo, próximo ao Setor Sul. Ele precisou subir no teto do carro para não ser arrastado pela enxurrada e aguardou a chegada do Corpo de Bombeiros, que conseguiu retirá-lo após alguns minutos.
Manoel estava com passageiros no momento do temporal. Eles conseguiram sair quando a água começou a subir, mas ele acabou ficando preso dentro do veículo, que apagou e em seguida começou a boiar. Segundo o relato da família, o susto foi enorme e tudo aconteceu em questão de segundos.
A filha dele, Ketllyn, contou ao jornal O HOJE que o pai estava trabalhando quando a chuva começou a engrossar. Por volta das 18h, ele tentava sair da região central, mas acabou entrando em um trecho da Marginal Botafogo que já estava parcialmente tomado pela água. “Ele falou que achou que ia dar tempo de passar, porque os outros carros estavam passando também. Mas, de repente, a força da água aumentou e arrastou o carro. Foi tudo muito rápido”, relata.
Enquanto isso, o prefeito Sandro Mabel manteve a versão de que havia sinalização e que o motorista ultrapassou o bloqueio. “Ele já foi retirado e o carro será rebocado. Infelizmente, ele passou pela barreira”, disse em vídeo. A fala, no entanto, não condiz com o que a família afirma ter ocorrido.
A filha dele, Ketlen Emanuelly, disse que ficou surpresa ,e magoada, com a declaração do prefeito Sandro Mabel, que afirmou publicamente que Manoel teria “furado uma barreira” que interditava a via. Segundo ela, isso não aconteceu.
“Meu pai falou que não tinha nenhuma barreira. A água estava normal e, de repente, veio uma tromba de água muito forte. Ele tentou dar ré, mas o carro morreu e logo começou a encher. Nem o alerta da Defesa Civil tinha chegado ainda. Só apareceu depois que ele já estava em cima do carro, tremendo de frio”, contou.
Ela reforça que o comentário do prefeito prejudicou ainda mais a família, que já estava abalada emocionalmente pelo susto. “Fiquei muito triste quando ouvi ele dizendo isso. Parece que meu pai tinha sido imprudente, e não foi. Ele não furaria uma barreira, ainda mais dirigindo há tantos anos. Ele só estava tentando trabalhar.”
Depois de ser retirado do carro, o motorista foi levado para atendimento. Segundo a família, ele recebeu orientações, tomou medicamentos e precisou tomar vacina por ter ficado tanto tempo em contato com água suja, esgoto e possíveis resíduos contaminantes.
“Ele estava tremendo de frio, somente. Os Bombeiros e Secretaria de Engenharia de Trânsito (SET) foram essenciais, ficamos muito agradecidos, prestaram todos os suportes. A SET levou ele no carro deles pra tomar vacina por conta do contato com água suja e depois nos levou pra casa”.
A Jovem reforçou que o pai recebeu ajuda de muitas pessoas, principalmente dos motoboys que estavam na região. Além do susto, o prejuízo foi grande. O carro do motorista, ferramenta de trabalho, ficou totalmente comprometido. Equipamentos elétricos, painel, estofados e motor foram danificados. Com isso a família está fazendo uma vaquinha, a chave PIX é e-mail, [email protected], está no nome de Manoel Batista Neto.
Chuva intensa provoca resgates e novas estatísticas alarmantes
Além do caso de Manoel, outro episódio grave ocorreu no Setor Pedro Ludovico, onde uma adolescente de 13 anos foi arrastada pela enxurrada após tentar atravessar a rua. Ela ficou presa embaixo de um carro estacionado e moradores correram para ajudar enquanto acionavam o Corpo de Bombeiros. A jovem foi retirada inconsciente e levada para o Hugol, onde segue em observação.
Na Avenida 90, próximo ao Parque Areião, veículos foram arrastados por causa da chuva intensa e ficaram atravessados na pista. Um caminhão dos bombeiros foi utilizado para retirar motoristas que não conseguiam sair. Em alguns pontos, a água ultrapassou meio metro de altura.
A Feira da Lua também foi atingida pela chuva. A enxurrada tomou conta das barracas e interrompeu parte das atividades. Feirantes tentaram levantar mercadorias para evitar prejuízos, mas muitos relataram perdas.
A BR-153 registrou alagamentos na altura do Jardim Goiás, e a Polícia Rodoviária Federal precisou interditar parcialmente a rodovia até que o nível da água baixasse.
Os dados do Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo) mostram a força da chuva:Região Sul (Jardim Botânico): 108,2 mm em menos de duas horas; Jardim América: 63,6 mm e Morro da Serrinha: 60,2 mm.
O levantamento da Defesa Civil indica que Goiânia possui 134 pontos de risco para alagamentos e enxurradas, com a chegada das chuvas. A região Oeste é a mais crítica, seguida por áreas centrais e setores próximos aos córregos Botafogo e Cascavel.
Nas redes sociais, o prefeito de Goiânia, Sandro Mabel, declarou que a cidade respondeu bem a chuva e que houve avanço no sistema de drenagem. Segundo ele: “A drenagem geral da cidade está funcionando melhor após a limpeza dos bueiros. A Marginal Botafogo já tem parte liberada para circulação.
E foi autorizada uma obra de R$ 120 milhões, focada no Córrego Cascavel e no Botafogo, para solucionar definitivamente os problemas de enchente nessas áreas.”
Em nota, a Secretaria Municipal de Infraestrutura afirmou que os efeitos das ações de prevenção puderam ser percebidos logo após o temporal. Segundo a pasta, cerca de uma hora depois da chuva, grande parte das ruas já apresentava escoamento significativo e os bueiros conseguiram absorver o volume de água, mesmo com a intensidade registrada. A secretaria ressaltou que o foco do trabalho atual está na vigilância dos córregos, especialmente os córregos Cascavel e Botafogo, que concentram trechos críticos de alagamento.
A Defesa Civil também divulgou alerta sobre a possibilidade de novas chuvas intensas na região, reforçando orientações de segurança para evitar acidentes. O órgão destacou que a população não deve transitar por áreas alagadas, enfrentar correntezas, se abrigar sob árvores durante rajadas de vento ou estacionar veículos próximos a torres de transmissão e placas de propaganda. A recomendação inclui ainda evitar o uso de aparelhos eletrônicos ligados à tomada durante tempestades. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitiu aviso de chuva entre 20 e 30 mm/h e possibilidade de alcance de até 50 mm/dia, com ventos variando entre 40 e 60 km/h. Embora o risco seja classificado como baixo, inclui chance de queda de galhos, cortes de energia, descargas elétricas e novos alagamentos. O alerta permanece válido até o dia 8 de dezembro, às 11h.
Além disso, a Defesa Civil informou que em alguns trechos, o volume de água subiu rapidamente, provocando inundação súbita e deixando veículos ilhados. A orientação é de que a população evite circular por esses locais até que haja liberação e plena segurança das vias. O órgão afirma que segue monitorando as condições meteorológicas e estruturais da cidade, com atualização constante dos dados e emissão de novos comunicados sempre que necessário.
A Comurg também divulgou nota sobre e informou que técnicos estavam de prontidão após alerta do Gabinete de Crises Climáticas e foram mobilizados para serviços de remoção de árvore caída, raspagem de lama e retirada de resíduos arrastados pela chuva em diferentes bairros. As frentes de trabalho se concentraram principalmente no Setor Pedro Ludovico, na Marginal Botafogo, no Jardim Goiás e na Avenida 87, no Setor Sul. Em atualização posterior, a companhia registrou que atendeu uma ocorrência de árvore caída e que equipes continuam de plantão 24 horas, integradas ao gabinete emergencial.