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terça-feira, 23 de dezembro de 2025
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Mais Saúde Goiânia aposta em APP, enquanto rede básica enfrenta desafios estruturais

Ferramenta integrada à plataforma Prefeitura 24h promete ampliar o agendamento de consultas na atenção básica, mas TCM-GO, pacientes e Sindsaúde apontam limites da tecnologia diante da falta de estrutura e profissionais

Anna Salgadopor Anna Salgado em 23 de dezembro de 2025
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Foto: Alex Malheiros

O lançamento do aplicativo Mais Saúde Goiânia pela prefeitura de Goiânia, integrado à plataforma “Prefeitura 24h”, representa a mais recente aposta tecnológica da gestão municipal para organizar o agendamento de consultas na rede pública. 

Com uso de inteligência artificial e georreferenciamento, a ferramenta promete ampliar o acesso a cerca de 30 mil consultas mensais na atenção básica, nas áreas de clínica geral, pediatria, ginecologia e odontologia. Para usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), entretanto, a iniciativa convive com dificuldades estruturais já apontadas por órgãos de controle e por relatos de pacientes.

O histórico do município com o agendamento digital é marcado por instabilidade. Em 2019, Goiânia utilizava o aplicativo “Saúde Fácil”, descontinuado pela gestão seguinte, o que levou a população a depender exclusivamente de canais alternativos. Durante esse período, o agendamento ficou restrito ao número 0800-646-1560, que não aceita chamadas de celular, e ao WhatsApp (62) 3209-9727. 

Usuários relatam falhas recorrentes, como mensagens de inexistência do número, ligações interrompidas e atendimento lento, baseado em respostas automáticas que nem sempre resultam em marcações efetivas.

Embora a prefeitura informe que o Mais Saúde foi desenvolvido internamente, sem custos adicionais, e integre um plano de transformação digital estimado em R$ 200 milhões, os dados do Relatório de Levantamento nº 1/2025 do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM-GO) indicam entraves que extrapolam o campo tecnológico. 

Auditoria aponta gargalos estruturais na rede de saúde

A auditoria, realizada nos primeiros 100 dias da atual gestão, apontou que 73% das unidades de atenção básica estão sobrecarregadas, principalmente pela falta de técnicos de enfermagem e pessoal administrativo. Além disso, 67,9% das unidades não possuem gestor nomeado.

O levantamento também revelou que mais de 80% das unidades enfrentam desabastecimento de medicamentos essenciais, como antibióticos e psicotrópicos, e que 100% das unidades de urgência inspecionadas apresentaram infiltrações ou mofo. Nesse cenário, pacientes relatam que a facilidade no agendamento nem sempre se converte em atendimento efetivo.

A paciente Camila Domingos afirma: “No mês passado marquei uma consulta com um mês de antecedência e quando chegou no dia a médica não tinha ido, eles remarcaram para quase um mês depois e a unidade não me informou nada”. Ela acrescenta que a digitalização não alterou a rotina do serviço: “Só mudou a forma, pois os funcionários não querem atender pessoalmente e marcar, sempre fazem desfeita”. 

Camila também critica o desempenho do sistema: “O aplicativo é bem lento e muitas vezes trava bastante e quando chega na unidade demora o atendimento”.

A prefeitura justifica a adoção do aplicativo citando um índice de absenteísmo de 70% nas consultas agendadas, argumentando que a possibilidade de desmarcação pode otimizar as vagas. Ainda assim, profissionais relatam sensação de insegurança no ambiente de trabalho, apontada por 91,7% dos servidores ouvidos pelo TCM-GO.

Em nota à imprensa, o Sindicato dos Trabalhadores do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde-GO) afirmou que apoia iniciativas que fortaleçam o SUS e reconhece que o uso de tecnologias digitais pode representar avanço no acesso aos serviços. No entanto, a entidade alertou que nenhuma ferramenta tecnológica é capaz de suprir a falta de profissionais e a precarização das condições de trabalho na rede municipal. 

O sindicato destacou problemas como déficit de servidores, sobrecarga das equipes e pendências trabalhistas, incluindo data-base paga abaixo do IPCA, atrasos em progressões de carreira, retenção de vale-alimentação e ausência de pagamento de retroativos.

Para o Sindsaúde/GO, não há saúde pública de qualidade sem valorização dos trabalhadores, defendendo concursos públicos, recomposição salarial e respeito aos planos de carreira. A entidade cobrou coerência da gestão municipal e afirmou que segue mobilizada na defesa de um SUS fortalecido.

Em resposta à reportagem, a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) informou que está em andamento um novo credenciamento médico para suprir o déficit de profissionais nas unidades de saúde da Capital. Segundo a pasta, para a rede de atenção primária à saúde, que oferta consultas ambulatoriais por meio do aplicativo Prefeitura 24h, estão previstas a contratação de 275 novos médicos.

A SMS também destacou que a rede de atenção primária realiza, em média, 28 mil consultas por mês e que, além do aplicativo, o agendamento de atendimentos pode ser feito pelos canais alternativos, como o WhatsApp (62) 3209-9727 e o telefone 0800 646 1560.

 

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