Clima ainda é o grande risco a pesar sobre a safra 2023/24

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 10 de outubro de 2023

Embora as projeções mais recentes apontem um cenário de certa tranquilidade e até mesmo folga para os mercados de soja e milho na safra já em curso, sob o ponto de vista do abastecimento, o clima tende a ser um complicador a ser levado em conta, colocando sob risco as perspectivas até aqui desenhadas para as safras agrícolas. Ao longo de outubro, a instabilidade no regime de chuvas e a expectativa de baixa precipitação ao longo de boa parte do mês surgem como sinais do que poderá vir adiante. A combinação de um El Niño mais rigoroso e de elevação das temperaturas médias de forma mais persistente e duradoura, com a ocorrência mais frequente de eventos extremos, numa sequência de ondas de calor, períodos de estiagens, chuvas excessivas e tempestades, ainda constitui um fator de risco a pesar sobre as perspectivas de produção na safra 2023/24.

Ao longo desta semana, de acordo com relatório liberado ontem pela Consultoria Agro do Itaú BBA, as chuvas deverão continuar concentradas no Sul do País e “em menor intensidade, na parte leste dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro e no sul de Minas Gerais”. Mas as chuvas deverão “seguir isoladas e em baixos volumes, combinadas com elevadas temperaturas” em praticamente toda a região Centro-Oeste, “dificultando uma aceleração do plantio da soja”. O clima tende a continuar seco no Nordeste, afetando as principais regiões agrícolas, a exemplo do oeste da Bahia, Maranhão e Piauí, e reduzindo a vazão dos mananciais, com a seca castigando duramente o Norte do País.

“O quadro permanecerá desafiador”, segundo a consultoria, até o final da próxima semana, sem grandes alterações em relação ao quadro atual, com precipitações “até um pouco mais escassas que o previsto para esta semana” nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. No limite, alongando-se o período de instabilidade e chuvas inconstantes, a janela de plantio da segunda safra de milho poderá se encurtar, afetando negativamente a oferta doméstica do grão, já pressionada por fatores de mercado.

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Migração

Na avaliação do Itaú BBA, as entregas de fertilizantes para a segunda safra, a ser semeada a partir de fevereiro ou março do próximo ano, “está bem atrasada em relação à média” das safras anteriores, sugerindo alguma indefinição nas decisões dos produtores, que poderão ainda migrar para os cultivos de algodão, que têm demonstrado uma perspectiva de rentabilidade mais favorável. “Com o cenário se desenhando para uma menor produção em 2024, os contratos do milho na B3 começaram a subir. O vencimento de setembro de 2024 está cotado na casa de R$ 65 a saca, contra a média mensal de R$ 63 em julho e R$ 64 em agosto”, registra a equipe de consultores do banco.

Balanço

  • Os dados gerais da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda) mostram que as entregas de fertilizantes ao consumidor final passaram a crescer a partir de maio, depois de meses de baixa, acumulado variação de 6,2% no acumulado entre janeiro e julho deste ano na comparação com os mesmos sete meses do ano passado, num dado sempre divulgado com atrasado pela entidade. O volume entregue avançou de quase 21,752 milhões para 23,098 milhões de toneladas entre 2022 e este ano. A despeito da reação esboçada entre maio e julho, as vendas acumuladas até julho deste ano registravam recuo de pouco mais de 3,0% em relação ao mesmo período de 2021, quando haviam atingido praticamente 23,818 milhões de toneladas.
  • Nos dados mais recentes do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), a produção global de milho na safra 2023/24 deve se aproximar de 1,214 bilhão de toneladas, crescendo em torno de 5,0% em relação ao ano agrícola anterior, que havia registrado a colheita de 1,156 bilhão de toneladas (mas em torno de 0,4% menor do que a produção de 1,219 bilhão de toneladas no ciclo 2021/22).
  • Os estoques finais de milho em todo o mundo, de qualquer forma, devem registrar avanço próximo de 5%, saindo de 299,0 milhões para 314,0 milhões de toneladas, algo como 26,4% do consumo total, repetindo praticamente os mesmos níveis registrados nas duas safras anteriores.
  • A produção mundial de soja tende a confirmar o recorde já esperado, a despeito da quebra de quase 10,0 milhões nas projeções para a safra dos EUA (caindo de 123,0 milhões para 112,8 milhões de toneladas, numa baixa de pouco mais de 8,0%). O USDA prevê a colheita de 401,0 milhões de toneladas do grão, em torno de 8,0% acima das 370,0 milhões de toneladas produzidas em 2022/23 (quase 31,0 milhões de toneladas a mais).
  • Em torno de 74,0% desse crescimento deverá ser assegurado pela Argentina, que deve a safra de 2022/23 reduzida em 43%, de 44,0 milhões para 25,0 milhões de toneladas, por conta da forte estiagem causada pelo fenômeno La Niña. A previsão para a safra atual aproxima-se de 48,0 milhões de toneladas (perto de 23,0 milhões de toneladas a mais, em alta de 92,0%). A safra brasileira de soja, na avaliação do USDA, deve avançar, embora num ritmo mais lento, saindo de 156,0 milhões para 163,0 milhões de toneladas, num avanço de pouco mais de 4,0%. Os EUA deverão colher 113,0 milhões de toneladas, num recuo de 3,0% em relação ao ciclo 2022/23.
  • O estoque final de soja está estimado em 119,0 milhões de toneladas, correspondendo a 31,0% do consumo anual, em torno de 5,0% maior do que em 2022/23, quando havia alcançado 103,0 milhões de toneladas e representado 28,0% do consumo. Os dados mais recentes, observa o Itaú BBA, “sinaliza maior conforto” sob o ponto de vista do abastecimento.
  • Com previsão de exportações entre 99,0 milhões e até alguma coisa acima de 100,0 milhões de toneladas – de toda forma, volumes recordes –, a soja brasileira colocada na China continuará sendo mais competitiva do que o grão americano e argentino até o final do ano, conforme o banco.