Consultas ao BNDES despencam quase 38% no primeiro semestre deste ano

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 20 de agosto de 2021
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. Rio de Janeiro, 18/01/19- Foto: Miguel Ângelo

A melhora nos indicadores de confiança do empresariado no desempenho futuro da economia não tem se refletido na intenção de disparar novos investimentos para setores relevantes da economia, destacadamente, como se poderia esperar, nos segmentos de comércio e serviços. Mas não apenas. A procura por crédito no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), refletido nas consultas encaminhadas pelas empresas que desejam contratar financiamentos para projetos de investimento, continuou desabando no segundo trimestre, num ritmo muito semelhante ao observado nos três primeiros meses do ano. O dado parece sugerir baixa disposição dos empresários para assumir riscos diante das incertezas ainda prevalentes em função da pandemia, das turbulências na área política, da ausência de rumo na política econômica e, principalmente, da demanda retraída.

Para comparar, as consultas ao BNDES haviam experimentado baixa de 39,6% em termos reais, quer dizer, descontada a inflação, entre o primeiro trimestre deste ano e o mesmo período de 2020. No fechamento da primeira metade do ano, a queda se aproximou de 38,0%. Em valores atualizados com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as consultas despencaram de R$ 70,249 bilhões nos seis meses iniciais de 2020 para pouco mais de R$ 43,614 bilhões em idêntico período deste ano, numa retração de R$ 26,635 bilhões – recursos que deixarão de irrigar a economia mais à frente, quando (e se) as consultas forem aprovadas e consolidadas em desembolsos nos meses seguintes, finalmente ajudando a criar nova capacidade de produção na economia.

A despeito do regime forçado de emagrecimento imposto pelos dois últimos governos ao BNDES, a instituição continua sendo a única fornecedora de créditos de longo prazo no País e as consultas ainda relevam, agora de forma mais parcial, a disposição de investir no setor empresarial. Além disso, a retirada forçada do banco não tem correspondido a avanços do setor financeiro privado no crédito destinado a projetos de investimento, que demandam prazos mais longos.

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“Efeito pandemia”

Não por coincidência, os setores mais atingidos pela crise sanitária foram também aqueles que operaram as maiores reduções no valor das consultas. As empresas das áreas de comércio e de serviços, analisadas em conjunto pelo BNDES, reduziram suas consultas em quase dois terços, num tombo de 61,9% em termos reais, saindo de R$ 26,005 bilhões para menos de R$ 9,910 bilhões. Na indústria, os setores têxtil e vestuário e material de transporte experimentaram as quedas mais severas, com o valor das consultas desabando, pela ordem, 65,3% e 82,9%. A indústria de produtos têxteis e de fabricação de artigos do vestuário, que havia apresentado ao banco de fomento consultas no valor de R$ 669,004 milhões nos seis primeiros meses de 2020, reduziu sua disposição para contratar novos financiamentos para R$ 232,463 milhões. No setor de material de transporte, as consultas baixaram de R$ 8,996 bilhões para R$ 1,538 bilhões. Além da queda brusca da demanda, as indústrias nesta área foram mais afetadas pela interrupção nas cadeias globais de suprimento de insumos e matérias-primas, no que parece ser um processo conjuntural e de curto prazo, mas que acaba produzindo incertezas e desestimulando decisões para o futuro imediato e de médio prazo.

Balanço

  • Na indústria como um todo, as consultas sofreram baixa de 28,8% entre o primeiro semestre de 2020 e o mesmo período deste ano, caindo de R$ 13,986 bilhões para R$ 9,958 bilhões. Como já apontado, a redução foi mais pronunciada nas áreas de produção de têxteis e materiais de transporte. Os setores da indústria que registraram forte incremento em geral participam mais intensamente do mercado internacional, por meio de exportações, ou sofreram perdas profundas nos últimos anos e ensaiam, agora, alguma reação.
  • O maior salto foi registrado pela indústria de celulose e papel, que apresentou ao BNDES consultas no valor de R$ 2,333 bilhões na primeira metade deste ano, num salto de 1.155% frente ao mesmo período do ano passado, quando as consultas haviam alcançado R$ 185,849 milhões. Em 2019, também no primeiro semestre, as consultas haviam alcançado R$ 3,360 bilhões e desabaram 94,5% em igual período de 2020.
  • As consultas no setor de metalurgia e seus produtos aumentaram 930,7% no primeiro semestre deste ano, saindo de R$ 184,758 milhões para R$ 1,904 bilhão. Olhando para trás, o setor chegou a encaminhar aos guichês do BNDES consultas no valor de R$ 4,405 bilhões na primeira metade de 2014.
  • As empresas do setor de infraestrutura reduziram suas consultas ao banco em 25,1% (de R$ 23,797 bilhões para R$ 17,816 bilhões, num corte de R$ 5,981 bilhões). A área de energia, duramente afetada pela crise hídrica neste ano, foi o mais afetado quando se analisam as consultas, que despencaram de R$ 18,755 bilhões para R$ 7,236 bilhões, num tombo de 61,4% (o equivalente a quase R$ 11,520 bilhões a menos). Os projetos de infraestrutura de transporte rodoviário significaram consultas de R$ 3,467 bilhões nos seis primeiros meses deste ano, diante de R$ 2,539 bilhões no mesmo intervalo de 2020, em alta de 36,6%. No setor ferroviário, que enfrentou longos meses com consultas praticamente zeradas, registrou-se a entrada de pedidos de crédito de R$ 1,308 bilhão.
  • Registraram fortes altas as consultas nos setores de atividades auxiliares de transporte e serviços de utilidade pública, que também vinham de longo período de retração. Nas atividades auxiliares de transporte, as consultas aumentaram 111,2%, saindo de R$ 1,617 bilhão para R$ 3,416 bilhões. Apenas para colocar em perspectiva, as consultas no setor haviam alcançado R$ 22,791 bilhões na primeira metade de 2014.
  • Os serviços de utilidade pública registraram consultas de R$ 413,992 milhões nos seis meses iniciais de 2020 e R$ 1,063 bilhão neste ano, considerando o mesmo intervalo, o que representou alta de 156,9%. No primeiro semestre de 2013, as consultas no setor foram quase quatro vezes mais altas, chegando a R$ 4,196 bilhões.
  • Os desembolsos experimentaram queda de 13,9% no semestre, caindo para R$ 24,253 bilhões em relação a R$ 28,176 bilhões em 2020, com reduções em todos os grandes setores (agropecuária, em baixa de 16,4%; indústria, com queda de 9,7%; infraestrutura, numa redução de 15,3%; e comércio e serviços, menos 11,6%).