Deficiências logísticas levam a perdas de R$ 30,5 bilhões para exportações

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 24 de fevereiro de 2024

A escassez de silos e sua má distribuição geográfica obrigam os produtores a acelerar a venda da produção, concentrando a desova das safras num espaço curto de tempo, pressionando toda a logística envolvida no escoamento e comercialização da produção, atingindo ainda o comércio exterior. “Todo esse volume de produtos, ao chegar aos portos, também enfrenta desafios para ser escoado. Os reflexos dessa logística sobrecarregada reverberam no mercado, resultando na redução dos prêmios de exportação”, constata Sergio Mendes, diretor geral da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec). No ano passado, lembra Paulo Bertolini, presidente da Câmara Setorial de Equipamentos para Armazenagem de Grãos da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), os prêmios negativos para a soja e o milho exportados resultaram em perdas próximas de R$ 30,5 bilhões, numa estimativa da consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, numa avaliação realizada, por sua vez, sob encomenda da Kepler Weber.

A estrutura portuária igualmente termina sendo mais pressionada, afirma Mendes, gerando “um tempo de espera para embarque significativamente alongado, chegando a até 90 dias em alguns casos, muito acima da média mundial”. Segundo ele, a demora “impacta diretamente os prêmios de exportação, onerando os custos de frete e demandando o pagamento de diárias adicionais para os navios”. O índice elevado de propriedades rurais sem estruturas de armazenagem, complementa Elisângela Pereira Lopes, assessora técnica da Comissão de Logística e Infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), reduz a janela de oportunidade dos produtores para a venda da produção, contribuindo para a concentração no escoamento.

Longe do ideal

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“O ideal é que os armazéns estivessem próximos das regiões produtoras, assim como ocorre nos Estados Unidos, que tem capacidade estática para estocar mais de uma safra por ciclo”, anota Bertolini. As estatísticas mais recentes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostram que o Centro-Oeste detém praticamente 38,7% de toda a capacidade de armazenagem estática instalada no País, algo como 78,036 milhões de toneladas, diante de uma produção esperada em 140,335 milhões de toneladas na safra 2023/24, correspondendo a 46,8% da colheita total de grãos esperada para todo o País, que deverá produzir em torno de 299,751 milhões de toneladas caso não sobrevenham novas perdas até o final da safra. Como se observa, a produção na região, mesmo em baixa por conta do clima, deverá ser praticamente 80% maior do que a capacidade dos armazéns na região.

Balanço

  • No auge da colheita, a produção tende a ser deslocada para regiões mais distantes na busca de disponibilidade de armazenagem, agravando os custos por conta do passeio das safras. Em Mato Grosso, responsável neste ano por 31,6% da produção brasileira, a relação entre capacidade dos silos e volumes colhidos aproxima-se de 47,0%, numa estimativa do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos).
  • Mesmo no Paraná, onde a estrutura de armazéns está mais consolidada e tem capacidade para abrigar 67,0% da safra, nos dados do Ilos ainda, o cenário chegou a ficar mais complicado neste ano. “Tivemos casos de cooperativas obrigadas a informar a seus associados, no auge da colheita, entre fevereiro e março, que não tinham condições de recepcionar a produção por falta de espaço nos armazéns”, relata Bertolini.
  • Em outro exemplo, embora o Sudeste tenda a responder por 9,08% da produção de grãos no ciclo 2023/24, estimando-se algo próximo de 27,204 milhões de toneladas, a capacidade total dos armazéns na região havia alcançado, no dado mais recente da Conab, perto de 30,448 milhões de toneladas, superando em pouco mais de 12,0% toda a safra regional.
  • A carência de infraestrutura de armazenagem, acrescenta Thiago dos Santos, diretor de operações e abastecimento da Conab, agrava os desafios no caminho da otimização do escoamento de grãos. Na sua visão, a insuficiência de instalações apropriadas para estocar a produção “propicia a permanência prolongada dos grãos em locais inadequados”. O quadro observado atualmente, na sua avaliação, “resulta frequentemente na acomodação dos grãos sobre caminhões, provocando incremento nas perdas”. Dessa forma, prossegue ele, os investimentos na instalação de novos armazéns contribuiriam para “aprimorar a gestão do fluxo de grãos” e poderia “viabilizar a espera estratégica, programando-se a liberação dos grãos na medida em que a capacidade portuária esteja disponível, retendo-os em momentos de saturação” (dos terminais portuários).
  • A adoção de sistemas de agendamento de caminhões, anota Elisângela, com uso de tecnologia, ajudou a reduzir e mesmo eliminar as filas de caminhões nos terminais portuários, uma visão rotineira até há alguns anos. Isso não significa que os portos e toda a infraestrutura logística não precisam de investimentos mais robustos. “Não se trata apenas da infraestrutura de armazenamento, mas as vias de escoamento, ainda muito concentradas no modal rodoviário, e a capacidade portuária precisarão ser reforçadas. Esse conjunto de fatores atrapalha o momento adequado de comercialização da safra”, avalia a assessora técnica da CNA.